Homem-bomba

"Lava jato" deixou denúncia de Cunha de lado e não fechou acordo de delação

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10 de setembro de 2019, 14h42

Os procuradores da força-tarefa da "lava jato" escolheram não apurar uma denúncia de manipulação de escolha de relator do processo de cassação do ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha (MDB-RJ). É o que revelam os diálogos dos procuradores da força-tarefa em posse do The Intercept Brasil e analisados em parceria com o portal UOL.

Luis Macedo / Câmara dos Deputados
Eduardo Cunha teve proposta de delação negada por integrantes da 'lava jato'
Luis Macedo/Câmara dos Deputados

A denúncia foi feita pelo próprio Cunha em proposta de delação premiada. Nas conversas do aplicativo Telegram, o procurador Orlando Martello mencionou a existência de “bolas mais pesadas no sorteio da relatoria” do Conselho de Ética. A suposta fraude não foi investigada.

O ex-presidente da Câmara acusou o então presidente do Conselho de Ética, José Carlos Araújo (PR-BA), de indicar um relator mais favorável no processo de cassação dele.

A informação teria sido passada por um interlocutor de Araujo. Na época, o escolhido para relatar o processo de Cunha foi Fausto Pinato (PP-SP). Ambos acusados por Cunha negam participação em qualquer tipo de fraude.

Eduardo Cunha foi responsável por abrir o processo de impeachment que resultou na deposição de Dilma Roussef da Presidência da República em 2016.  O parlamentar teve mandato cassado e foi preso no mesmo ano.

Omissão
A denúncia de Eduardo Cunha foi tema de conversa entre procuradores em agosto de 2017. Ao analisar os papeis de proposta de delação, os procuradores se impressionaram com o teor das revelações. “Realmente esse é um fato que talvez não devesse ser sonegado da sociedade. Isso mostra/expõe como ainda somos um País subdesenvolvido, em que os políticos estão tão distantes da realidade", disse o procurador Orlando Martello. 
Os procuradores envolvidos nas conversas não quiseram comentar.

Os diálogos sobre Cunha ocorreram em um grupo do Telegram chamado “Acordo Cunha”. Entre os participantes estavam procuradores da ‘lava jato’ em Curitiba, Rio de Janeiro, Natal e na Procuradoria Geral da República (PGR), em Brasília.

O grupo foi criado por um procurador da PGR após o advogado de Eduardo Cunha, Délio Lins e Silva Júnior, apresentar uma proposta de delação premiada em 2017. Cunha já estava preso em Pinhais (PR). A opinião da maioria dos procuradores era pela rejeição da proposta de delação do emedebista.

E a delação de Cunha acabou mesmo rejeitada, mas alguns procuradores insistiam em manter negociações com o ex-presidente da Câmara pelo teor explosivo de suas revelações. "Há vários fatos que o Cunha esclarece enquanto que [o doleiro Lúcio] Funaro [que fechou colaboração semanas depois] não consegue, por não dominar a história toda", escreveu Anselmo Lopes, em 30 de julho de 2017.

A proposta de colaboração poderia supostamente resultar no impeachment do ex-presidente Michel Temer (MDB). No dia 8 de julho, Deltan Dallagnol avaliou se Cunha teria provas fortes contra Rodrigo Maia, que ocupava a Presidência da Câmara e seria um possível sucessor de Temer.

“Se EC tiver provas fortes contra [Rodrigo] Maia, e este é candidato forte em eleições indiretas, a variável que pode preocupar EC [Eduardo Cunha] é mais a nova PGR [Raquel Dodge] do que a queda do Temer", comentou via Telegram.

Procurados, os se negaram a comentar o assunto. "O MPF não comenta sobre negociação de colaboração premiada, pois o instrumento tem natureza sigilosa exigida por lei, sob dever de confidencialidade dos procuradores", alegou a assessoria do MPF em Brasília.

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