Anuário da Justiça

Conheça as tendências do TJ-SP em casos de família e planos de saúde

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9 de setembro de 2019, 8h00

*Reportagem publicada no Anuário da Justiça São Paulo 2019, que será lançado na próxima quarta-feira, 11 de setembro, no Tribunal de Justiça São Paulo.

A competência da Subseção de Direito Privado 1 é a mais abrangente do Tribunal de Justiça de São Paulo, e, por isso, após pedidos de desembargadores, foi revista em abril de 2019. Hoje, casos de compra e venda de imóvel são distribuídos também para as outras duas subseções.

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A DP1 é composta pelas dez primeiras câmaras da Seção de Direito Privado, que têm em sua competência casos de Direito de Família e das sucessões; Direitos Reais; seguro habitacional; seguro-saúde e planos de saúde; responsabilidade civil; compra e venda de imóvel; ações paulianas; Direito Autoral; falências, concordatas; insolvência civil; registros públicos.

As questões com maior número de processos se referem basicamente a planos de saúde, em relação a cobertura de procedimentos e reajuste de mensalidades; contratos de compra e venda de bem imóvel; questões de Direito de Família, sobre alimentos e reconhecimento e dissolução de união estável; cobranças de taxa de conservação e manutenção feita por associação de moradores; indenizações morais e materiais por responsabilidade civil; e, por fim, direitos de posse e propriedade.

Em questões relacionadas a planos de saúde, revisões de contrato envolvendo cláusulas de reajuste por mudança de faixa etária ainda são constantes. Embora a seção tenha decidido por meio de IRDR, em novembro de 2018, pela validade da cláusula de contrato coletivo de plano de saúde (empresarial ou por adesão) que prevê reajuste aos 59 anos, as câmaras têm dado soluções distintas.

De acordo com a decisão, três critérios precisam ser preenchidos para se aceitar o reajuste. Decisões de diferentes câmaras, contudo, deixaram de observar os requisitos de forma conjunta.

Também é alta a distribuição de casos com pedido de medicamento ou custeio de tratamento ou cirurgia pelos planos de saúde. O Placar de Votação indica que é unânime nas dez câmaras da DP1 que a operadora não pode se recusar a custear o tratamento de saúde em home care havendo indicação do médico.

“Se o paciente não tem escolha e o trato de sua moléstia não está excluído pelo contrato, negar o serviço domiciliar importará, inevitavelmente, negar a proteção contratual, porque a internação hospitalar, para o mesmo fim, certamente o médico não recomenda e a seguradora, mais, ainda negaria”, afirma João Carlos Saletti (AI 325.974.4/9).

O tribunal encerrou a questão com a Súmula 90: “Havendo expressa indicação médica para utilização dos serviços de home care, revela-se abusiva a cláusula de exclusão inserida na avença, que não pode prevalecer.”

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Há jurisprudência dominante sobre o percentual de retenção das construtoras de imóveis quando o comprador desiste da compra, que deve ser de no máximo 25%, conforme orientou o Superior Tribunal de Justiça no julgamento do AREsp 725.986/RJ, pela 4ª Turma em junho de 2017.

“No caso, tem-se como adequada a retenção de 20% do total dos valores pagos em favor da alienante, considerando-se especialmente as despesas administrativas por ela suportadas, reputada abusiva cláusula contratual que tenha previsão de retenção de valores que resulte em percentual superior”, diz Christine Santini (Ap 1005457-84.2017.8.26.0071).

Se a resolução do contrato do descumprimento contratual se der por parte da vendedora, deve vir acompanhada da devolução de todos os valores pagos, bem como indenização por demais danos materiais. A nova Lei do Distrato (Lei 13.786/2018), contudo, prevê percentual de retenção ainda maior, mas só será aplicada nos contratos firmados após a data de sua vigência.

Para sete das dez câmaras do DP1, o cálculo da pensão alimentícia dos filhos deve incluir a participação nos lucros e resultados da empresa recebidos pelo genitor, porque tem caráter salarial.

Nesse sentido, citam precedente da 4ª Turma do STJ, no REsp 1.332.808/SC, de relatoria do ministro Luis Felipe Salomão. “Somente os proventos do alimentante que tiverem natureza indenizatória não devem ser compreendidos na base de cálculo da pensão alimentícia. Assim, as verbas rescisórias e o FGTS, bem como multa a ele relacionada, por terem essa característica, devem ser excluídas da base de cálculo da pensão alimentícia”, adverte o juiz Marcus Vinicius Rios Gonçalves (Ap 0001445-93.2015.8.26.0142).

A questão, todavia, ainda não está pacificada no STJ. Em decisão de fevereiro de 2019, a 3ª Turma entendeu que a participação nos lucros é verba de natureza indenizatória e por isso não deve entrar na base de cálculo da pensão alimentícia, reformando justamente acórdão do TJ-SP.

“As verbas de natureza indenizatória, como é exemplo a PLR, não importam em acréscimo financeiro do alimentante, já que têm por finalidade apenas recompor eventual prejuízo de caráter temporário, devendo ser excluídas da base de cálculo da dívida alimentar”, disse o ministro Ricardo Villas Bôas Cueva.

Obedecendo a orientação do STJ, a maioria das câmaras segue o entendimento de que donos de hotéis e motéis devem pagar direitos autorais ao Ecad por reproduções de obras audiovisuais nos quartos, bem como clínicas e hospitais. De acordo com esses colegiados e a jurisprudência consolidada na corte superior, “motéis se caracterizam como áreas de frequência coletiva e com finalidade de lucro, justificando-se a exigibilidade das contribuições”.

Mas tem avançado nos demais colegiados, conforme indica o Placar de Votação, a tese da ilegalidade da cobrança baseada na simples presença de rádios e televisores nos quartos de hotéis e motéis. Os defensores alegam que os direitos autorais das obras executadas já foram recolhidos pelas emissoras de rádio ou televisão, configurando o bis in idem.

Outro ponto de divergência é quanto à natureza dos quartos de hotéis e motéis. Para alguns desembargadores, são ambientes de caráter individual, de uso exclusivo pelo hóspede, e não de frequência coletiva, como trata a Lei 9.610/1998.

“A presente ação deve ser julgada improcedente pela simples razão de se tratarem de locais de acesso reservado, constituindo-se o uso dos referidos equipamentos em mera opção dos próprios hóspedes. Os aposentos dos motéis não podem ser considerados como locais de frequência coletiva, como sugere a genérica e, portanto, imprecisa, redação do parágrafo 3º do artigo 68, da Lei 9.610/98, na medida em que é inequívoco que a proteção buscada pelo aludido diploma legal, refere-se à sonorização ambiental promovida em locais públicos ou de frequência coletiva, não podendo o intérprete da lei se circunscrever à leitura literal do dispositivo sem considerar o seu propósito”, diz o juiz José Aparício Coelho, vencido na 9ª Câmara (Apelação 4001608-91.2012.8.26.0309).

Também obedecendo a repetitivo do STJ, a maioria das câmaras julga improcedente ação de cobrança de associações de loteamento contra moradores não associados. O fundamento principal é o princípio da livre associação, previsto na Constituição Federal. A única que julga contrariamente a essa posição é a 7ª Câmara; em outras o tema divide os desembargadores.

Walter Piva assim fundamenta sua posição para divergir do STJ e dos colegas de câmara: “A cobrança da contribuição pela entidade associativa de loteamento afigura-se legítima, o morador, associado ou não, efetivamente se beneficiou do serviço que está embasando a cobrança, sendo irrelevante a inexistência de filiação. O fundamento para se autorizar a cobrança decorre de fonte igualmente constitucional, derivando da aplicação do princípio da solidariedade e da função social da propriedade, que mostra ser prevalecente à liberdade de associação.” (Ap 1000645-03.2016.8.26.0372).

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