Mosca azul

Procuradores queriam que Deltan usasse fama da "lava jato" para se candidatar

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3 de setembro de 2019, 20h29

Durante mais de um ano, o procurador Deltan Dallagnol pesou os prós e os contras da possibilidade de deixar o Ministério Público Federal e se lançar em uma carreira política. Conforme mostram mensagens entre Deltan e colegas do MPF divulgadas pelo site The Intercept Brasil, ele cogitou se candidatar ao Senado e foi bastante pressionado por outros procuradores, mas desistiu.

André Telles
Deltan refletiu profundamente sobre possibilidade de se lançar na política
André Telles

"A verdade é que quero em minha vida, em primeiro lugar, servir a Deus", disse, em março de 2017, à procuradora Luciana Asper Valdir, conforme reportagem publicada nesta terça-feira (3/9) pelo Intercept.

De acordo com o site, no dia 29 de janeiro de 2018, Deltan mandou uma mensagem para ele mesmo no Telegram: "Tenho apenas 37 anos. A terceira tentação de Jesus no deserto foi um atalho para o reinado. Apesar de em 2022 ter renovação de só 1 vaga e de ser Álvaro Dias, se for para ser, será. Posso traçar plano focado em fazer mudanças e que pode acabar tendo como efeito manter essa porta aberta".

Deltan chegou a ser convidado para disputar o cargo pelo Podemos. O partido foi a legenda usada pelo senador Álvaro Dias (PR) para se candidatar a presidente em 2018. O parlamentar foi poupado das investigações da "lava jato", segundo reportagem do UOL — o senador teve como tesoureiro de uma de suas campanhas o doleiro Alberto Youssef, o principal delator da "lava jato", segundo Youssef contou à CPI da Petrobras.

O procurador discutiu bastante sobre sua candidatura com o procurador Vladimir Aras, coordenador de cooperação internacional da PGR na época de Rodrigo Janot. Aras era candidato a PGR e incentivava a candidatura ao Senado. Aras queria que Deltan se candidatasse em 2018 e tirasse Gleisi Hoffman, hoje deputada pelo PT, e Roberto Requião (MDB-PR), do páreo.

"Vc ficou maior que o cargo de procurador", disse Aras ao amigo. Deltan reconheceu, em fevereiro de 2018, que, se as eleições fossem naquele dia, ele "estaria eleito". Mas pesou a segurança da estabilidade, do salário e dos benefícios do MPF.

Nas mensagens, Deltan repete frase que ouviu de Joaquim Falcão, diretor da faculdade de Direito da GV do Rio de Janeiro, sobre a política ser "algo que está no meu destino", mas recua na hora de desincompatibilizar. As conversas dão força ao argumento de que a "lava jato" se tornou um projeto de poder de um grupo de procuradores e já era vista como fenômeno político, e não jurídico*.

Deltan, consciente disso, disse aos colegas que sua preocupação era confirmar a imagem de que a "lava jato" teria motivações políticas. "Eu não gostaria [de ser candidato], sendo sincero, por uma série de razões. Não é meu perfil, é uma turbulência na vida familiar, ganha menos, tem menos férias, fica tomando pedrada na vitrine num jogo de menitras (Sic), correria um risco grande ao me desligar do MPF", respondeu a um colega de MP ao ser indagado sobre suas pretensões futuras.

*Notícia editada às 14h46 do dia 4 de setembro para correção de informação. A reportagem do Intercept Brasil dizia, erroneamente, que foi Deltan quem disse ver a política em seu destino. Na verdade, segundo ele informou a assessoria de imprensa do MPF no Paraná, ele apenas repetiu frase que ouviu do professor Joaquim Falcão. A mensagem, explicou a assessoria, foi reproduzida erroneamente pelo Intercept. A ConJur reproduziu o erro na primeira versão deste texto, pelo que pede desculpas aos seus leitores e aos envolvidos.

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