Julgamento no Supremo

Descriminalização de posse de drogas pelo Supremo vai aumentar o consumo

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31 de outubro de 2019, 7h08

A expectativa com a descriminalização da posse de drogas pelo Supremo Tribunal Federal é um aumento no consumo e no número de dependentes químicos. A análise é do criminalista Cid Vieira de Souza Filho

"A saúde pública é capenga e não consegue cuidar dos seus dependentes. Se o Supremo descriminalizar as drogas ele vai acabar com o futuro de algumas gerações no país e com a esperança de milhares de mães e familiares de dependentes", afirma em entrevista à ConJur

O criminalista é favorável a uma revisão na Lei de Drogas (11.343/2006) na tipificação do tráfico em pequenas quantidades. De acordo com Cid Vieira, aquele que faz o tráfico para sustentar o próprio vício deve ser isento de pena, mas “deve haver pena alta a quem vai fazer tráfico em porta de escola ou na cadeia”.

Inspirado pelo pai, o advogado Cid Vieira de Souza — que presidiu a OAB-SP durante a ditadura militar — o advogado seguiu atuação na área criminal e comemora os 65 anos do escritório VS Advogados.

"Meu pai criou a comissão de prerrogativas, que eu tive a honra de presidir na gestão de 2016-2018. É um trabalho difícil da OAB. Considero como a maior comissão do país porque reafirma a necessidade da criminalização das prerrogativas", contou. 

Leia a entrevista abaixo:

ConJur — Qual balanço que faz da sua gestão à frente da Comissão de Prerrogativas?
Cid Vieira —
Fizemos um trabalho incansável para defender as prerrogativas dos advogados. Dentre as principais prerrogativas violadas tivemos o grampo no escritório do Roberto Teixeira, que fazia defesa de Lula. Três advogadas presas em solitária por falta de sala de Estado Maior. E outro caso emblemático foi de um advogado preso por entrar em elevador errado no TRT-2. 

ConJur —  O senhor também esteve à frente das discussões na Comissão de Drogas… 
Cid Vieira —
O trabalho mais gratificante para mim foi nessa comissão. Nos posicionamos a favor da internação compulsória de dependentes de drogas e fomos convidados pelo Governo do Estado de São Paulo para fazer um parceria e ajudar na internação dos dependentes que à época estavam na Cracolândia. Nenhuma internação foi feita sem acompanhamento ou laudo médico. Tinham internações voluntárias e as involuntárias aconteciam quando um familiar ou alguém próximo pedia.

ConJur — Mas como o Estado faz a distinção do usuário e traficante?
Cid Vieira —
Temos que pensar no dependente de drogas. Há muita informação incorreta. Como é que pode divulgar, para justificar a descriminalização, que só pobre vai pra cadeia? Aqui em São Paulo tem audiência de custódia em que o juiz pode avaliar as condições do preso. Muitos falam "se o pobre se ele tiver com 1 quilo é tráfico, se o rico tiver com 1 quilo é pra uso próprio". Aonde isso? Será que todos os promotores, os juízes não têm essa visão? A pessoa vai para um delegacia, tem que passar por um delegado, que tem que autuá-lo e depois vai para o Ministério Público e para o juiz. Será que toda essa cadeia é falha? Essa linha de seguimento é falha? Não é não.  

ConJur — A atual estrutura caminha para permitir que o usuário de droga seja reinserido na sociedade?
Cid Vieira —
Não caminha para isso. Primeiro é preciso ter uma saúde pública com condições de cuidar dos dependentes químicos. A saúde pública do Brasil não consegue cuidar dos doentes e estão pensando em liberar drogas? Vai ser um caos!

ConJur — O julgamento no Supremo Tribunal Federal sobre posse de drogas estava pautado para novembro [o julgamento foi adiado antes da publicação da entrevista]. Por que o senhor é contra a descriminalização das drogas?
Cid Vieira —
Espero que o Supremo Tribunal Federal não descriminalize a posse de drogas porque vai aumentar o consumo e o número de dependentes químicos. A saúde pública é capenga e não consegue cuidar dos seus dependentes. Se o Supremo descriminalizar as drogas ele vai acabar com o futuro de algumas gerações no país e com a esperança de milhares de mães e familiares de dependentes. 

Eu já fui muito criticado por defender isso, mas quando mostrava nos debates o sofrimento de mãe, mudava um pouquinho a conotação. Aqueles que eram contrários, em geral, tinham uma visão muito ideológica e para você tratar de droga não pode ter ideologia, mas sim viver o presente e ter experiência do passado.

ConJur — Como foi a conversa no Supremo quando o senhor foi entregar memoriais?
Cid Vieira —
Tive como grande parceiro o ministro Osmar Terra. Fomos juntos ao Supremo levar os memoriais, ele assistiu a minha sustentação lá e tenho certeza que nesses três anos e meio de governo Bolsonaro a questão das drogas vai ter um enfoque diferente dos últimos governos. Não vai ser uma política de redução de danos, traficante tem que ser tratado como traficante mesmo.

ConJur — É uma opinião que divide a comunidade jurídica?
Cid Vieira —
Divide, mas a maioria da população é contrária à descriminalização das drogas. Não precisa muito, eu tenho vários filmes que foram preparados para usar no STF, memoriais de mães de dependentes químicos… é só perguntar para qualquer mãe de dependente químico se ela é favor de liberar as drogas.

*Texto alterado às 16h22 do dia 31/10/2019 para correção de informações. 

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