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Uso da telemedicina pode ajudar no combate à automedicação

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29 de outubro de 2019, 10h31

Não é preciso listar muitos dados para concluir que a automedicação é um problema de saúde pública de escala global. São diversos artigos científicos alertando para riscos exponencialmente danosos da prática reiterada de automedicação[1]. Segundo o Conselho Federal de Farmácia, quase metade dos brasileiros se automedica pelo menos uma vez por mês e 25% o faz todo dia ou pelo menos uma vez por semana. De acordo com o estudo, a automedicação é um hábito comum a 77% dos brasileiros.

Avaliar os riscos e danos da automedicação tem sido preocupação de diversos agentes. Em estudo realizado pela Fundação Fiocruz, foi possível constatar que, a cada hora, duas pessoas se intoxicam com medicamentos no Brasil devido à automedicação. Os dados, extraídos das estatísticas do Sinitox – Sistema Nacional de Informações Tóxico-Farmacológicas, permitem afirmar que a automedicação pode ser considerada um hábito entre os brasileiros.

São diversas frentes de batalha sustentadas pelos órgãos públicos no Brasil. Busca-se alinhar a ação governamental com os diversos diagnósticos: baixa de informação sobre efeitos de medicamentos, baixo acesso à atividade clínica em regiões geograficamente distantes, dentre outras circunstâncias fazem com que o desafio de conter a prática da automedicação seja crescente.

Em verdade, diante dos múltiplos contextos socioculturais e econômicos, cada região tem um determinado perfil e diagnósticos possivelmente distintos, que faz com que a atuação governamental precise ser mais bem direcionada e especificada localmente, de modo a atacar com efetividade os problemas ali desenvolvidos.

Curiosamente, a telemedicina, já regulamentada pelo Conselho Federal de Medicina e pouquíssimo explorada ainda no Brasil, pode ser um caminho para auxiliar na diminuição da prática reiterada da automedicação. Em tese, dois efeitos comportamentais podem surgir em conjunto: (i) o custo de oportunidade que o indivíduo terá em acionar o serviço de telemedicina tende a ser mais baixo que utilizar websites de busca; e (ii) o risco moral – moral hazard – também se torna presente e faz com que o indivíduo se sinta mais confortável em utilizar o serviço.

Ao tomar uma decisão, um indivíduo inevitavelmente renuncia a outras possibilidades. O benefício perdido em detrimento de uma escolha seria o que se denomina de custo de oportunidade. Qual seria o custo de oportunidade por decidir utilizar

se do serviço de telemedicina em detrimento da automedicação? O ganho informacional é altíssimo: por não haver deslocamento físico em um primeiro momento; por haver imediata orientação clínica e direcionamento específico para uma determinada especialidade clínica quando necessário, bem como atendimento imediato.

Já o risco moral – em inglês moral hazard –, refere-se à possibilidade de o indivíduo mudar o seu comportamento desde que esteja inserido em um contexto distinto do anterior. A oportunidade de acesso ao serviço de telemedicina pode provocar a reflexão de custos e benefícios em se prosseguir em uma prática de automedicação quando há, de forma acessível, um profissional de saúde apto a dar o encaminhamento correto.

O cenário de possibilidade com o acesso à telemedicina cria um incentivo para que o indivíduo possa repensar sobre os riscos que corre e se não seria melhor dividi-los com um profissional capacitado e de fácil acesso.

São inúmeras as possibilidades e cenários que teoricamente podem ser pensados. Para todos, deve-se considerar especificamente que a telemedicina não substitui o atendimento presencial de um médico. Pelo contrário: ela é a porta de entrada, um facilitador, para que cada vez mais indivíduos se afastem da automedicação e possam ser direcionados de forma mais assertiva para a orientação de um profissional capacitado.

Introduzir uma nova tecnologia em práticas já postas e corroboradas é sempre um desafio – não só para o regulador público, mas para toda a sociedade. Pensar na telemedicina é empreitada desafiadora, principalmente em um país com tantas realidades geograficamente distintas. Mas esse é o debate sadio e necessário das novas tecnologias: não as sufocar antes mesmo de entender como elas possibilitam o aperfeiçoamento das práticas já existentes e, ainda, abrem as portas para novas perspectivas.

 


[1] Por todos, v. o alerta de BENNADI, Darshana. Self medication: a current challenge. Disponível em https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC4012703/ Acesso em 15 de outubro de 2019.

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