Opinião

Prestação de serviço associado na nova Lei de Licitações

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21 de outubro de 2019, 6h17

A ineficiência das contratações públicas é um dos alvos do projeto de nova Lei de Licitações. São vários os dispositivos que se ocupam de garantir os meios necessários para que os contratos não apenas sejam concluídos, mas que o sejam em níveis satisfatórios de qualidade.

A prestação de serviço associado é um dos instrumentos dos quais o projeto lança mão para atingir esse objetivo. Mais especificamente, procura-se assegurar a qualidade das obras e bens entregues à Administração e sua correta operação e manutenção.

Em linhas gerais, a prestação de serviço associado é uma nova espécie contratual que prevê a comunhão da execução de uma obra ou fornecimento de um bem, com a sua operação e manutenção por um período adicional após a entrega do objeto à Administração. Mal comparando, é uma espécie de “mini-concessão” de obra ou de bem público.

O grande mérito da proposta é conjugar dois ganhos relevantes à Administração.

De um lado, a ciência prévia do particular quanto à responsabilidade pela operação e pela manutenção do objeto após a sua entrega fará com que se tenha maior preocupação com a qualidade da execução da obra ou do bem fornecido. Afinal, vícios nessa etapa tornarão mais onerosa a etapa seguinte, diminuindo o retorno total esperado com a contratação. A preocupação com a qualidade, dessa maneira, passa a ser também do particular contratado pela Administração.

Noutro ponto, à Administração pode obter ganhos relevantes com a comunhão da execução do objeto e da sua posterior operação e manutenção.

A uma, por ser possível, em alguns casos, subsídios cruzados, de modo que os ganhos com uma das parcelas contratuais resultem em custos menores para a outra. É o que acontece, por exemplo, no setor de TI, onde cada vez mais se afasta do mero fornecimento de soluções para o conceito de Software as a Service (SaaS) e os fornecedores estão muito mais voltados à prestação de serviços assessórios à ferramenta do que apenas ao seu mero fornecimento e os ganhos da primeira resultam em custos menores para o segundo.

A duas, pela menor percepção de risco dos serviços de manutenção e operação, afinal não haverá assimetria de informações entre o executor da obra ou fornecedor do bem com o responsável pela operação ou manutenção do objeto. A perspectiva, portanto, é que o menor risco resulte em preços inferiores para os serviços de manutenção e operação.

A três, porque será mais fácil promover a transferência de conhecimento necessária aos serviços associados (manutenção e operação) entre o responsável pela obra ou bem e a Administração. Afinal, quem melhor sabe das características da obra ou do bem é o responsável pela a sua execução ou fornecimento. Na segregação entre a entrega do objeto e os serviços a ele relacionados, nem sempre é possível apreender tudo que é necessário à correta prestação desses serviços. O conhecimento não se perde apenas nas parcas condições de transferência entre o executor e a Administração, mas, tanto pior, ainda precisa percorrer o caminho entre a Administração e o terceiro que irá se responsabilizar pela prestação dos serviços adicionais, o que usualmente se faz em termos de referência mal construídos para os futuros contratos de prestação. Com a prestação dos serviços associados, a transferência do conhecimento sobre a obra ou bem ocorre em tempo e forma mais adequados, podendo a Administração absorver do próprio executor as informações necessárias durante o período em que este ficará encarregado da operação ou manutenção.

Ao lado das vantagens para a Administração, os particulares também poderão se beneficiar da prestação dos serviços associados. Em primeiro lugar, por ser mais uma oportunidade de negócios, que contempla alguns objetos cujas limitações atuais impediam sua melhor conformação nos contratos administrativos. Softwares, equipamentos hospitalares ou de alta complexidade são apenas alguns exemplos da infinidade de bens cuja prática comercial já incorpora a manutenção ou operação ao seu fornecimento.

Além disso, para aqueles que se voltam mais diretamente à operação ou manutenção, é fundamental ter maior certeza quanto à qualidade do objeto para o qual irá se prestar esses serviços. Não por acaso, em muitos casos, o prestador opta por executar ou fornecer o bem, ele próprio, diminuindo o risco de custos adicionais na prestação dos serviços adicionais. Além do que, ainda há o ganho marginal advindo da execução ou fornecimento do bem.

São bem visíveis os benefícios trazidos com a prestação de serviço associado prevista no projeto da nova Lei de Licitações. Daí porque, no restante do trâmite legislativo, é importante não apenas assegurar a manutenção do instituto no texto final, mas, também, pensar em aprimorar um pouco a sua regulamentação, ainda bastante resumida. É interessante, por exemplo, pensar na especificidade desse contrato, de modo a evitar que elementos próprios dos contratos tradicionais impeçam a melhor conformação dessa nova espécie de contratação. Prazos, forma de remuneração, gestão e fiscalização mais racionais são alguns dos temas que poderiam ser aprimorados para aproveitar ainda mais o potencial desse novo instituto.

A expectativa quanto ao impacto da prestação de serviço associado, portanto, é bastante positiva. A torcida é para que o Senado aproveite a chance de não apenas manter, mas, também, prover algumas melhorias à regulamentação do instituto.

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