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Advogados rebatem Barroso: "Criminalistas não congestionam Judiciário"

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17 de outubro de 2019, 15h39

Advogados criminais só impetram recursos previstos na legislação. E não são os recursos penais que congestionam o Judiciário, mas os cíveis e administrativos. Com esses argumentos, a Sociedade dos Advogados Criminais do Estado do Rio de Janeiro (Sacerj) repudiou nesta quinta-feira (17/10) a declaração do ministro Luís Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal, de que criminalistas são responsáveis pela impunidade no Brasil.

Rosinei Coutinho / SCO STF
Barroso disse que criminalistas movem recursos descabidos
Rosinei Coutinho/SCO STF

Ao defender nesta quarta (16/10) a possibilidade de execução da pena após condenação em segunda instância, Barroso afirmou que, quando o STF proibiu a medida em 2009, gerou efeitos “devastadores” para o país e para a advocacia.

Para o ministro, isso aconteceu porque, no Brasil, "se consagrou um ambiente de impunidade para a criminalidade do colarinho branco".

"Para a advocacia criminal porque passou a impor aos advogados criminais o dever de ofício, o papel indigno de ficar interpondo recurso descabido atrás de recurso descabido, que é para não deixar o processo acabar."

Em nota, a Sacerj afirmou que advogados especializados em Direito Penal só interpõem recursos previstos em leis ou regimentos internos de tribunais. E a atividade procrastinatória é passível de multa, conforme o Código de Processo Civil. Ainda assim, não se tem notícia de criminalistas punidos por essa prática, disse a entidade.

Ela também apontou que, conforme pesquisas, são os processos cíveis e administrativos que congestionam o Judiciário, não os penais. E não são os advogados que acusados de crimes de "colarinho branco" que mais atuam nas cortes superiores, e sim as Defensorias Públicas, que lutam para fazer valer direitos fundamentais dos mais pobres que são constantemente negados pela segunda instância — em desrespeito a precedentes do STF e do Superior Tribunal de Justiça.

“O ministro Barroso, vê-se bem de seu pronunciamento, fala para agradar parte da opinião pública; fala para fazer política e não para distribuir justiça. Ele rasga a Constituição Federal e o Código de Processo Penal, normas que asseguram a todos os brasileiros que sejam considerados inocentes até o trânsito em julgado da condenação”, declarou a Sacerj.

Prerrogativas
O grupo Prerrogativas, formado por advogados que militam pela defesa do direito de defesa, também emitiu nota criticando a fala do ministro. "Exercer o direito de defesa em nenhuma circunstância é uma atividade indigna. Pelo contrário, é uma atividade nobre e sagrada precípua da advocacia e das valiosas Defensorias Públicas do Brasil. Exaurir todas as possibilidades de contestação judicial, por meio dos meios de impugnação e recursos cabíveis, não é um papel indigno, mas sim a obrigação do advogado cuja causa a ele é confiada", diz o texto.

Leia a íntegra da nota do Prerrogativas:

Às vésperas do julgamento das ações diretas de constitucionalidade nas quais se aprecia a constitucionalidade da prisão antecipada antes do trânsito em julgado, na saída do Supremo Tribunal Federal, o Min. Luís Roberto Barroso deu declarações à imprensa que estarreceram a comunidade jurídica e toda a advocacia nacional, da qual há pouco tempo atrás, foi grande expoente.
Segundo o Ministro, a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal teria sido alterada em 2009 quando a “criminalidade atingiu o andar de cima", ensejando efeitos nefastos para o país e para a advocacia, principalmente a criminal, que teria sido relegada a um “papel indigno" de se ver obrigada a apresentar inúmeros recursos descabidos para a evitar o trânsito em julgado dos processos.
É altamente preocupante que, às vésperas do início desse importante julgamento, o Ministro apresente ainda noções superficiais e equivocadas sobre a evolução do sistema processual penal brasileiro. Também alarmam as afirmações sobre efeitos deletérios ao Brasil sem base em qualquer evidência concreta.
No entanto, nada é mais chocante do que o desconhecimento do Ministro sobre a atividade da advocacia e sobre a garantia ao exercício do direito de defesa. Jamais um Ministro da mais alta corte do país proferiu afirmações tão infamantes à advocacia e ao próprio texto da Constituição Federal, cujo conteúdo normativo, ironicamente, tem o dever e jurou proteger.
Exercer o direito de defesa em nenhuma circunstância é uma atividade indigna. Pelo contrário, é uma atividade nobre e sagrada precípua da advocacia e das valiosas Defensorias Públicas do Brasil. Exaurir todas as possibilidades de contestação judicial, por meio dos meios de impugnação e recursos cabíveis, não é um papel indigno, mas sim a obrigação do advogado cuja causa a ele é confiada. Uma obrigação não apenas ética, mas legal inclusive.
Para além de uma mais aprofundada reflexão sobre o ordenamento jurídico processual penal, o Ministro Luís Roberto Barroso deve explicações e desculpas pelos insultos à classe da advocacia irrogados no solo sagrado do Supremo Tribunal Federal. 
As desculpas públicas são necessárias não apenas para o desagravo das agressões infundadas, mas para que o Ministro possa se restituir à altura do elevado cargo que ocupa.

Clique aqui para ler a nota da Sacerj.

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