Voluntariedade necessária

Prisão como incentivo à delação é tortura, afirma Nefi Cordeiro

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11 de outubro de 2019, 16h39

"A prisão preventiva fora das hipóteses legais, especialmente quando utilizada como incentivo à colaboração, é tortura. O Estado não pode fazer tortura para obter colaboração", afirmou o ministro Nefi Cordeiro, do Superior Tribunal de Justiça, ao destacar que a voluntariedade é umas das características da colaboração premiada, não podendo o Estado jamais coagir alguém a colaborar.

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Em palestra, Nefi Cordeiro destacou a necessidade da voluntariedade na colaboração premiada e alertou que o instituto está sendo transformado em plea bargain sem apoio da lei STJ

O ministro também alertou que colaboração premiada está sendo transformada em plea bargain sem apoio em lei. "Nosso sistema não é o da plea bargain, nosso sistema é muito diferente da plea bargain. Podemos evoluir, sim, para algo mais parecido; até acho que isso seria bom em alguma medida, porém é preciso tomar cuidado", afirmou.

Nefi Cordeiro participou nesta sexta-feira (11/10) do 1º Curso Nacional Corrupção e os Desafios do Juiz Criminal, promovido pela Escola Nacional de Formação e Aperfeiçoamento de Magistrados (Enfam) em parceria com o STJ, a Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB) e a Associação dos Juízes Federais do Brasil (Ajufe).

O plea bargain é um instituto jurídico presente no sistema norte-americano, que consiste em um acordo pelo qual o réu confessa a culpa em troca de uma pena reduzida. Foi proposto ao Congresso no pacote anticrime do governo, mas ainda não existe legalmente no Brasil. Já a colaboração premiada, prevista em diversas leis brasileiras, envolve um acordo em que o réu ajuda na investigação, confessando seus próprios crimes e entregando os corréus, em troca de algum benefício no processo.

Nefi Cordeiro destacou que a negociação é indispensável no processo penal e que institutos como o da colaboração premiada são meios válidos e úteis na investigação, porém é necessário que se obedeça a princípios já consolidados no ordenamento jurídico.

"É imprescindível a observância dos princípios constitucionais da administração pública, dos princípios jurídicos, das regras dos negócios jurídicos, das regras dos contratos administrativos e da inafastabilidade de jurisdição."

O ministro ressaltou que tais acordos não podem servir como excludentes do dever investigatório e probatório do Estado e que, como qualquer ação estatal, exigem limites conhecidos e controláveis. "Na colaboração premiada, não pode ter incidência ou interpretação divorciada das garantias e limitações às demais ações penais", afirmou.

Nefi Cordeiro defendeu, ainda, que haja revisões nos acordos de colaboração premiada dentro do próprio Ministério Público, a fim de garantir sempre os direitos dos colaboradores. Além disso, asseverou que o Judiciário e o Ministério Público devem trabalhar juntos na aplicação do instituto, porém cada um com o papel que lhe foi destinado pela Constituição Federal e pelas leis do país.

O ministro do STJ Herman Benjamin, diretor-geral da Enfam, alertou que é delicado imputar à delação premiada natureza jurídica contratual, em virtude das peculiaridades do instituto. No entanto, para ele, uma solução seria atribuir à delação natureza de contrato sui generis, já que assim seria possível proceder aos devidos ajustes na negociação, caso necessário.

"Quando se considera que a colaboração premiada tem natureza jurídica contratual, deve-se lembrar que esse acordo bilateral possui condições resolutivas, obrigações paralelas, entre elas a do acusado não reincidir em novas modalidades criminosas", destacou. Com informações da Assessoria de Imprensa do STJ.

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