Políticas públicas

Laboratório de Inovação usa tecnologia para aumentar eficiência do MP-RJ

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5 de outubro de 2019, 14h04

Como parte do plano de usar a tecnologia da informação e o processamento de dados para reinventar sua atuação, o Ministério Público do Rio de Janeiro criou o Laboratório de Inovação (Inova). O órgão tem o objetivo de desenvolver medidas para aumentar a efetividade da atuação da Promotoria.

Divulgação/MP-RJ
Laboratório de Inovação do MP-RJ foi criado em fevereiro deste ano
Reprodução

Instituído em fevereiro de 2019, mas com atribuições definidas em julho, o Inova é focado no impacto social da instituição. Atualmente, tem nove funcionários, entre promotores, geógrafo, designer gráfico e outros. Com o órgão, o MP-RJ busca deixar de lado a ideia de punir e pensar mais nas prestações de serviços públicos. Trata-se de uma abordagem derivada da Carta de Brasília.

No documento, elaborado em 2016, a Corregedoria Nacional e as corregedorias-gerais dos MPs dos estados e da União concordaram em desenvolver “uma nova teoria do Ministério Público, embasada nos direitos e nas garantias constitucionais fundamentais, que possa produzir práticas institucionais que contribuam para a transformação da realidade social”.

O laboratório tem como objetivos desenvolver experimentos de inovação, voltados a aumentar a relação custo-efetividade dos serviços públicos; prospectar, no Brasil e no exterior, práticas, ferramentas e projetos inovadores; difundir uma cultura de aprendizado e inovação; e criar, integrar e fomentar redes de inovação.

A inspiração para o Inova veio de laboratórios de inovação governamentais, que vêm se popularizando em diversos países, conta o coordenador do Inova, Daniel Lima Ribeiro. No Brasil, um modelo é o GNova, laboratório de inovação do governo federal. Direcionado para o desenvolvimento de soluções menos burocráticas e mais eficientes para os serviços públicos, o órgão nasceu de uma parceria entre a Escola Nacional de Administração Pública, o Ministério do Planejamento e o governo da Dinamarca.

A maioria dos laboratórios de inovação se dedica ou à ciência de dados ou ao design de serviços. O que diferencia o Inova, segundo Ribeiro, é a combinação dessas ferramentas. “Ou seja, o intuito é usar ciência de dados, mas partindo do design de serviços. E com a finalidade de fazer avaliações e controle, em parceria com o Executivo, de políticas públicas”.

O Projeto Bússola une as duas técnicas. Usando ciência de dados, o programa aponta questões críticas em cada área de uma política pública. O design de serviços é empregado para se definir que pontos analisar, em que ordem e com que prioridade. Posteriormente, o Inova conecta essas informações ao conhecimento institucional de avaliação de medidas estatais para sugerir ou cobrar mudanças junto ao Executivo e ao Judiciário.

Melhorias sociais
Um exemplo de melhoria em políticas sociais baseada em dados citado pelo coordenador do laboratório ocorreu em uma cidade no México. A alta taxa de doenças infantil gerava pobreza contínua. Em certo momento, alguém percebeu que o piso das casas era a última parte a ser cimentada. Dessa maneira, muitos imóveis tinham piso de terra. E isso poderia ser um vetor de doenças. Com um investimento baixo, a administração pública passou a fornecer cimento para a população. O aumento dos pisos de cimento reduziu drasticamente a incidência de doenças em crianças.

Na busca por soluções digitais, smartphones são poderosas ferramentas de integração de políticas públicas, afirma Daniel Lima Ribeiro. Um caso que demonstra a importância desses aparelhos foi a investigação da Controladoria-Geral da União sobre a qualidade das merendas em escolas públicas no Pará. O órgão pediu que os alunos lhe mandassem fotos dos alimentos. Pelas imagens, a CGU constatou as más condições dos alimentos e iniciou uma revisão dos contratos com fornecedores.

O Inova busca tornar a atuação do Ministério Público do Rio mais direta. Ao levantar dados por conta própria, o laboratório quer evitar que o MP-RJ tenha que solicitar informações a outros órgãos antes de agir. A entidade agiu dessa maneira quando, em 2018, não esperou o Executivo a examinou diretamente dados sobre a aplicação de recursos na saúde do estado. Nesse trabalho, o MP-RJ descobriu que o governo fluminense estava investindo na área menos do que o mínimo legal – 12% da receita corrente líquida. Com base nessa informação, o órgão moveu ação de improbidade administrativa contra o então governador Luiz Fernando Pezão.

O laboratório também está conduzindo um projeto piloto de digitalização de documentos. A ideia é acabar totalmente com o acervo físico, tornando-o 100% digital.

Petições enxutas
Um plano do Inova é propor um modelo de 10 páginas para petições iniciais de ações civis públicas. A medida começou como um experimento na 3ª Promotoria de Saúde do Rio. Se der certo, será expandida para todo o MP-RJ.

“Sempre me pareceu contraintuitivo o fato de o pessoal escrever documentos muito longos, com 100, 140 páginas. Essa é a média das petições iniciais de ações civis públicas do MP-RJ. Já vi muitas pessoas associarem a qualidade do trabalho ao tamanho da peça ou da sentença. Lembro de um amigo juiz que uma vez se orgulhou de ter feito uma sentença de 400 páginas. Isso nunca me pareceu um bom referencial”, comenta Daniel Lima Ribeiro.

Em um período nos EUA, o coordenador do Inova verificou que, em alguns estados, o juiz pode limitar o número de páginas de petições e determinar como elas devem ser estruturadas. “Isso faz com que o processo seja mais eficiente para todas as partes. Mas isso torna a vida do advogado e do promotor muito mais difícil. Afinal, ser objetivo é muito mais difícil do que ser prolixo”.

O protótipo do Inova teve o objetivo de desenhar um modelo de uma petição inicial funcional que não passe de 10 páginas. A peça começa com uma seção chamada de “em um parágrafo”, que descrevia toda a tese. E o documento acaba com uma parte denominada “em resumo”, com uma decomposição dos argumentos, de fato e de direito, em tópicos, facilitando a leitura e a compreensão.

As seções da peça são separadas por títulos. Cada parte esclarece qual é a questão fática que precisa ser respondida, qual é o dilema jurídico envolvido e qual é a proposta de resposta que o MP-RJ está dando.

Alem disso, o modelo não cita doutrina —prática comum no Brasil, mas impensável nos EUA, conforme Ribeiro. Ao mencionar jurisprudência, não transcreve ementas inteiras, somente resumos das decisões ou trechos pertinentes para os pontos em discussão.

No futuro, o Inova pretende usar inteligência artificial para otimizar as seções e argumentos das petições. O sistema também seria empregado para criar um banco de entendimentos e respostas jurídicas.

O protótipo do Laboratório de Inovação foi bem recebido pelos promotores. Na visão deles, o modelo tem maior força argumentativa do que as longas petições de praxe. “Quando você escreve menos e de forma mais concisa, faz com que a outra parte tenha mais trabalho para responder os seus argumentos, porque eles estão muito compactados e muito mais fortes. Fica mais difícil de a parte contrária encontrar um ponto em que possa divagar e confundir o juiz”, avalia o coordenador da instituição.

Para medir a eficácia do protótipo, o Inova visa avaliar a leitura dos juízes, de forma a medir qual é a absorção do conteúdo em um documento de 10 páginas e em um de 100. Dependendo dos resultados, o laboratório pode pesquisar as normas de padronização de peças nos EUA e sugerir um projeto de lei à Câmara dos Deputados.

No fim das contas, se o protótipo do Inova for bem-sucedido, pode elevar a qualidade dos trabalhos de advogados, promotores e juízes. “Se isso ganhar escala, pode melhorar a prática jurídica no Brasil e fortalecer a cultura de precedentes. Pois os profissionais do Direito passariam a promover o debate jurídico de forma mais concisa e objetiva”, diz Daniel Ribeiro.

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