Pontas soltas

Joesley Batista vai responder por improbidade por contratar Marcelo Miller

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18 de novembro de 2019, 17h22

O juiz Marcelo Gentil Monteiro, substituto na 1ª Vara Cível do Distrito Federal, recebeu denúncia por improbidade administrativa contra o empresário Joesley Batista e o advogado Francisco de Assis, do Grupo J&F, e contra o ex-procurador da República Marcelo Miller. Segundo a decisão, há indícios de que a contratação de Miller para trabalhar nas negociações dos acordos de leniência e delação premiada da empresa enquanto ele ainda estava no Ministério Público violou os princípios da administração pública. A empresa também responderá.

Miller fora contratado pelo escritório Trench, Rossi e Watanabe (TRW) — braço brasileiro do americano Baker McKenzie. Por não ter alertado o cliente do risco a que fora exposto, papel para o qual fora contratado, o escritório foi processado nos Estados Unidos pelo J&F, mas a ação foi encerrada depois de acordo (leia a nota do TRW abaixo).

Ao despedir-se dos colegas em grupo de discussão do MPF, Miller informou que se desligava da corporação para trabalhar no TRW. A notícia foi recebida com naturalidade pelos procuradores e pela Procuradoria-Geral da República. 

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Joesley Batista, um dos donos do Grupo J&F 
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O juiz rejeitou a denúncia por improbidade contra as advogadas Fernanda Tórtima e Esther Flesch, e contra Wesley Batista e Ricardo Saud. Tórtima representava os executivos da J&F na área penal e Flesch, ex-sócia do Trench, Rossi e Watanabe, tinha por encargo o acordo de leniência da empresa.

Para o juiz Marcelo Monteiro, não há indícios do cometimento de atos de improbidade por eles.

Essa parte da acusação foi rejeitada porque se referia ao pagamento de R$ 700 mil pelo Grupo J&F ao Trench, Rossi e Watanabe, enquanto Marcelo Miller, formalmente, ainda era procurador da República, o que seria improbidade por enriquecimento ilícito.

Miller saiu do MPF em abril de 2017 e as reuniões em que o pagamento foi acertado aconteceram fevereiro. Só que o pagamento foi cancelado. O TRW fora contratado para negociar o acordo de leniência da empresa — já que o acordo de delação já estava concluído.

Como o pagamento não aconteceu, Miller não pode ser acusado de enriquecimento ilícito e as advogadas, acusadas de tê-lo cooptado, não podem ser acusadas de intermediárias.

Tórtima, aliás, nem estava no Brasil na época do acerto do pagamento. “Apesar de ser, em tese, passível de censura e consequências jurídicas a conduta de advogada que, vislumbrando vantagem para cliente seu, planeja a contratação de pessoa próxima, mesmo ciente de que ainda integrava os quadros do MPF, tal conduta não se confunde com a acusação do MPF (de que teria sido instrumento de cooptação pelos irmãos Batista)”, afirma o juiz, na decisão. Ela foi defendida pelos advogados Nabor Bulhões e José Carlos Porciúncula.

O juiz deixou de examinar prova relevante juntada aos autos pela defesa de Wesley. No telefone do empresário, apreendido pela PF, em diálogo gravado em áudio, por WhatsApp, o irmão, Joesley, lhe pergunta se havia convencido Marcelo Miller a trabalhar para a empresa. Wesley responde que Miller recusara pela segunda vez o convite — uma vez que as possibilidades de carreira em escritório do porte do TRW eram bem melhores. O diálogo tem data de 5 de abril de 2017. A portaria que formalizou o afastamento do procurador foi publicada dia 25 de fevereiro, com efeitos diferidos até 4 de abril.

Sobre a participação de Esther Flesch, o juiz afirma que os acertos entre Marcelo Miller e os irmãos Batista aconteceu antes de ela entrar no caso. A advogada é defendida pelos advogados Floriano de Azevedo Marques, José Roberto Manesco e Luís Justiniano Fernandes.

Probidade da administração
Embora a transação financeira não tenha acontecido, a contratação de Miller foi, sim, uma forma de cooptar o procurador a trabalhar para a empresa, afirma o juiz. Miller, aliás, não nega que tenha trabalhado no caso enquanto ainda era procurador e que só depois pelo menos dois meses é que passou a trabalhar na leniência como advogado.

A empresa, diz o magistrado, concorreu para o ato de improbidade porque uma das propostas discutidas foi a contratação de Miller pelo Grupo J&F. “A inicial veicula, ainda, fortes indícios de que tais requeridos tinham plena ciência de que Marcelo Miller, quando do início das tratativas e dos serviços prestados, ainda pertencia aos quadros do MPF”, diz a decisão.

O MPF, no entanto, ainda vai ter de trabalhar. Segundo o juiz, as acusações foram apresentadas na ação por improbidade, mas não devidamente instruídas. Diversas informações constam de inquérito da Polícia Federal que não foi juntado aos autos do processo por improbidade.

Marcelo Miller é defendido pelos advogados Andressa Moreira e José Andrés da Costa Cruz. Joesley é representado pelo advogado Sebastião Tojal e Wesley, por Eugênio Pacelli. Francisco de Assis, ex-diretor jurídico do J&F, é defendido pelo advogado Amilton Kufa, e Ricardo Saud, ex-lobista da empresa, é defendido por Gustavo Penna Marinho.

O juiz também autorizou a habilitação da União no caso, como parte interessada.

Clique aqui para ler a decisão
Ação Cível de Improbidade Administrativa 1016557-35.2018.4.01.3400

Texto alterado para correções e acréscimo de informações às 18h30 e às 20h30 de 18/11.

Leia a nota do Trench, Rossi e Watanabe: 

Trench Rossi Watanabe esclarece que a ação na justiça americana envolvendo o Escritório e a J&F foi encerrada [por acordo] em julho passado sem nenhum pagamento ou reconhecimento de responsabilidade.

Embora a ação de improbidade não envolva o Escritório, a decisão proferida ontem confirma que o Trench Rossi Watanabe não teve qualquer participação na suposta cooptação do ex Procurador da República e que, por iniciativa própria, não recebeu nenhum pagamento relativo ao caso.

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