Regime militar

MPF-SP denuncia ex-agentes da ditadura por morte de advogado em 1975

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14 de novembro de 2019, 14h46

O Ministério Público Federal denunciou dois ex-agentes da repressão da ditadura militar (1964-1985) pela morte do advogado Jayme Amorim de Miranda, em 1975. O ex-comandante do Doi-Codi em São Paulo Audir Santos Maciel e o ex-integrante da equipe de buscas da unidade Carlos Setembrino da Silveira são acusados de homicídio duplamente qualificado e ocultação de cadáver.

Kaoru/CPDoc
Protesto durante a ditadura militar (1964-1985)
Kaoru/CPDoc

A vítima era militante do Partido Comunista Brasileiro (PCB) e morreu após sessões de tortura na chamada Casa de Itapevi (SP), um dos centros clandestinos de prisão e execução de opositores da ditadura civil-militar instaurada em 1964.

Amorim integrava a cúpula do PCB. Sua militância era monitorada pelos agentes do regime havia anos devido às suas atividades na coordenação de publicações vinculadas ao partido.

O advogado foi uma das 19 vítimas registradas da Operação Radar, iniciativa que os órgãos de repressão implementaram entre 1973 e 1976 para aniquilar os principais nomes da legenda de esquerda em todo o país.

O jornalista Vladmir Herzog, o operário Manoel Fiel Filho e o técnico em edificações José Montenegro de Lima também foram alvos dessa operação.

Preso em fevereiro de 1975 no Rio de Janeiro, Jayme foi imediatamente transferido para a Casa de Itapevi, também conhecida como Boate Querosene. Desde junho do ano anterior, com o fechamento da Casa da Morte, em Petrópolis (RJ), o imóvel situado na região metropolitana da capital paulista havia se tornado o principal destino ilegal dos dissidentes capturados.

O advogado nunca mais foi visto. Relatos de testemunhas indicam que, para dificultar a localização e a identificação do cadáver, os agentes cortaram os dedos da vítima e esquartejaram o corpo antes de embrulhá-lo em um saco e lançá-lo no rio Avaré.

Audir Santos Maciel e Carlos Setembrino da Silveira tiveram participação no episódio, ao lado de outros agentes já falecidos. Maciel comandava o Destacamento de Operações de Informação — Centro de Operações de Defesa Interna (Doi-Codi) do 2º Exército, em São Paulo, uma das unidades que coordenavam a Operação Radar.

Setembrino, cujo irmão era proprietário do imóvel onde funcionava o centro de torturas, foi quem viabilizou a instalação da Casa de Itapevi e um dos oficiais mais atuantes durante todo o período de atividades clandestinas no local.

O MPF destaca que não cabe prescrição ou anistia neste caso, pois a execução de Jayme Amorim ocorreu em um contexto de ataque generalizado do Estado brasileiro contra a população civil e, por isso, constitui crime contra a humanidade. A coordenação centralizada do sistema de repressão da época é comprovada por diversos testemunhos e papéis, entre eles um relatório de abril de 1974, assinado pelo então diretor da CIA William Colby.

O documento, dirigido à Secretaria de Estado dos EUA, descreve uma reunião na qual o então presidente Ernesto Geisel autorizava que o Serviço Nacional de Informações (SNI) prosseguisse com as mortes de militantes políticos, desde que o Palácio do Planalto fosse antes consultado.

“Portanto, as execuções e os desaparecimentos não eram atos isolados, mas sim uma verdadeira política de Estado, autorizada e chancelada diretamente pelo general presidente, que não apenas estava ciente, mas a coordenava”, escreveu o procurador da República Andrey Borges de Mendonça, autor da denúncia.

Além de penas de prisão, o MPF quer o cancelamento de aposentadorias ou outros proventos que Audir Santos Maciel e Carlos Setembrino da Silveira recebam em decorrência das funções que exerciam durante a ditadura. A Procuradoria pede também que a Justiça Federal determine a perda de medalhas e condecorações entregues aos denunciados pelos serviços que prestaram à repressão política. Com informações da Assessoria do Ministério Público Federal em São Paulo.

Clique aqui para ler a denúncia do MPF
5003962-41.2019.4.03.6181

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