Opinião

A autonomia operacional das unidades de inteligência financeira

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27 de março de 2019, 6h27

À luz da mudança institucional do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf) do Brasil, que saiu da alçada do Ministério da Economia para a do Ministério da Justiça e Segurança Pública, cabe ao Grupo de Ação Financeira da América Latina (Gafilat) tecer considerações. De acordo com a normativa do Grupo de Ação Financeira Internacional (Gafi), utilizada em processos de avaliação que englobam mais 195 jurisdições em todo mundo, o que se verifica fundamental não é a localização institucional das unidades de inteligência financeira (UIFs, nome genérico utilizado nos padrões internacionais para instituições com as características do Coaf), mas que esta opere de forma independente e autônoma.

A Recomendação 29 do Gafi detalha requisitos para o adequado funcionamento de uma UIF. Assim diz a nota interpretativa desta recomendação:

“Os países devem estabelecer uma UIF que sirva como um centro nacional de recebimento e análise de: (a) comunicações de operações suspeitas; e (b) outras informações relevantes sobre lavagem de dinheiro, crimes antecedentes e financiamento do terrorismo, e de disseminação dos resultados de tal análise. A UIF deve ser capaz de obter informações adicionais das entidades comunicantes e ter acesso rápido a informações financeiras, administrativas e de investigação que necessite para desempenhar suas funções adequadamente”.

Sobre o marco institucional das UIFs, a nota interpretativa da Recomendação 29 também esclarece responsabilidades, obrigações e funções fundamentais. Seu parágrafo 1º indica:

“Levando-se em conta que existem diferentes modelos de UIFs, a Recomendação 29 não julga a escolha dos países por modelos específicos, e se aplica da mesma forma a todos eles”.

O parágrafo 8º da nota interpretativa é explicito nesse sentido:

“A UIF deverá ser operacionalmente independente e autônoma, o que significa que a UIF deverá ter autoridade e capacidade de desenvolver suas funções livremente, inclusive tomar por conta própria a decisão de analisar, solicitar e/ou disseminar informações específicas. Em todos os casos, isso significa que a UIF tem o direito independente de encaminhar ou disseminar informações para autoridades competentes”.

Além disso, o parágrafo 9º agrega:

“As UIFs poderão ser estabelecidas como parte de uma autoridade competente já existente. Quando a UIF se localizar dentro da estrutura de outra autoridade, as funções centrais da UIF deveriam ser distintas daquelas da outra autoridade”.

Nesse contexto, esse regramento esclarece que a vinculação administrativa do Coaf tanto ao Ministério da Economia como ao Ministério da Justiça e Segurança Pública não se reflete diretamente no processo técnico decisório, já que o conselho tem como instância decisória máxima um órgão colegiado formado por diversas instituições.

No âmbito do Gafilat, do qual o Brasil também faz parte, se verifica a existência de UIFs vinculadas ao Banco Central, a órgãos supervisores, ao Ministério de Fazenda e ao Ministério da Justiça, entre outros. Em nível global, há UIFs vinculadas a autoridades de cumprimento da lei (polícia), ao Ministério Público, a órgãos supervisores e a diversos órgãos integrantes do Poder Executivo.

Um arcabouço de regras do Gafi mostra que a mera modificação do marco institucional das unidades de inteligência financeira não pode ser compreendida como uma violação das regras internacionais aplicáveis, desde que garantida a independência e autonomia das UIFs para o cumprimento das funções institucionais e legalmente atribuídas.

Em virtude do exposto, se pode afirmar que, de acordo aos modelos internacionais, o que se verifica exigível aos UIFs é a separação de suas funções e recursos do maior órgão a que está vinculado, a fim de garantir independência administrativa e do processo de tomada de decisão.

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