Provas insuficientes

Nas investigações contra Trump, provar obstrução da Justiça ainda é um desafio

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25 de março de 2019, 16h57

No sumário do relatório final das investigações contra o presidente Donald Trump enviado ao Congresso neste domingo (24/3), o procurador-geral dos EUA, William Barr, matou as acusações de conspiração com a Rússia e feriu gravemente a acusação de obstrução de justiça. Mas essa pode sobreviver por mais tempo.

No caso do "conluio" com a Rússia, Barr escreveu que as investigações comprovaram que empresas e cidadãos russos interferiram nas eleições presidenciais de 2016, para ajudar a eleger Donald Trump, mas não produziram qualquer prova de que cidadãos americanos conspiraram com os russos para esse fim.

Sob esse aspecto, tal conclusão praticamente elimina as esperanças dos democratas de abrir um processo fundamentado de impeachment contra Trump.

Ainda resta a questão da obstrução da justiça. Sob esse outro aspecto, a sorte de Trump ficou indefinida. O procurador especial Robert Mueller, responsável pelas investigações, declarou, segundo o sumário, que "embora este relatório não conclua que o presidente cometeu um crime, ele também não o inocenta".

O que o procurador especial não conseguiu concluir em 22 meses de investigações, Barr e o vice-procurador-geral Rod Rosenstein concluíram em alguns minutos no sábado. Em resumo, Barr escreveu:

"Depois de aplicar os princípios que guiam nossas decisões de acusar, concluímos que a prova desenvolvida durante as investigações não é suficiente para estabelecer que o presidente cometeu o crime de obstrução da justiça."

Antes de assumir o cargo, recentemente, Barr já havia criticado a investigação de obstrução da justiça no caso Trump.

Há dois pontos a considerar aí. O primeiro é de que há duas outras investigações em curso – uma por procuradores federais do estado de Nova York e outra pela Câmara dos Deputados. Dificilmente essas investigações poderão enveredar pelo caminho do conluio com a Rússia, porque Trump foi "inocentado" pelo procurador especial. Mas Mueller deixou aberta para eles a questão da obstrução da justiça, porque não inocentou o presidente dessa suspeita.

O segundo ponto é mais complexo porque, até agora, não se produziu uma prova definitiva, clara, de que Trump tentou obstruir a Justiça. Isto é, pelo menos por enquanto não estão disponíveis as provas mais óbvias de obstrução, como coagir ou corromper testemunhas, retaliar contra testemunhas, vítimas ou informantes, destruir provas ou registros oficiais, impedir investigações criminais, etc.

Trump demitiu o ex-diretor do FBI James Comey porque ele estava empenhado em provar que houve conluio com a Rússia. Em uma entrevista, o presidente confessou que estava pensando nessas investigações quando demitiu Comey. Ele também forçou a demissão do ex-procurador-geral Jeff Sessions, porque Sessions se recusou a chefiar as investigações contra ele e, portanto, a acabar com elas. Mas, nos dois casos, tem prevalecido o entendimento de que o presidente pode demitir quem quiser, sem qualquer explicação.

Na falta de provas óbvias de obstrução da justiça, resta uma bastante complexa para se discutir – e tentar provar: a de que Trump teve a "intenção de corromper" (corrupt intent), ou de usar meios ilegais, intencionalmente, para produzir o efeito pretendido de impedir a justiça.

Se isso for provado, não há necessidade de provar que a justiça foi realmente obstruída. A tentativa é suficiente. Mas provar "intenção de corromper" é complicado. No caso de Trump, não há e-mails, gravações telefônicas, delações ou testemunhos aceitáveis, memorandos ou qualquer outro documento que sirvam de prova.

Nesse caso, para provar que houve intenção de corromper, "seria preciso entrar na mente do suspeito – e adivinhar intenção é uma arte, não uma ciência", disse ao Washington Post o ex-procurador-geral do estado de Virgínia e ex-integrante da equipe de Mueller Chuck Rosemberg.

De qualquer forma, a questão da obstrução da justiça continuará a ser discutida. No entanto, as esperanças dos parlamentares democratas de abrir um processo de impeachment contra o presidente residem agora nas investigações dos procuradores federais de Nova York e nas das comissões de inquérito da própria Câmara.

Os procuradores de Nova York investigam algumas suspeitas de crime. Entre elas, se houve crime eleitoral decorrente do suborno de duas mulheres, para elas não revelassem, durante a campanha, que tiveram casos sexuais com Trump quando ele já era casado; se houve crime de Trump por aceitar doações de governos estrangeiros para sua cerimônia de posse; se ele usou seu cargo de presidente para seu hotel em Washington obter lucros com a hospedagem de delegações estrangeiras; e se a Fundação Trump cometeu fraudes.

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