Falsa declaração

MPF quer anular nomeação de branco que entrou na Marinha por cota racial

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13 de março de 2019, 17h47

O Ministério Público Federal ajuizou ação civil pública, com pedido de liminar, para anular a nomeação e posse de um homem no cargo de segundo-tenente da Marinha. O militar, que é branco, foi aprovado em vaga destinada a pessoas negras ou pardas, segundo o sistema de cotas previsto no concurso público para ingresso no quadro complementar de oficiais intendentes da Marinha concluído em 2018.

Divulgação Marinha do Brasil
Marinha reconheceu que não verificou as declarações de raça dos candidatos.
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A ação foi movida com base em fatos apurados em inquérito civil instaurado a partir de representação que questionava a aprovação no concurso de "pessoa notadamente caucasiana, não sendo dotada de traços nem ao menos próximos de uma pessoa considerada parda, muito menos de pessoa negra". Segundo a representação, a Diretoria de Ensino da Marinha negligentemente teria acatado a falsa declaração do candidato.

Segundo o MPF, o candidato, no ato de inscrição, declarou-se "branco". Posteriormente, contudo, requereu a mudança da declaração para constar que era "preto" ou "pardo". Foram anexados ao inquérito e à ação civil fotografias e documentos que não deixam dúvidas de que o fenótipo do militar é o de uma pessoa branca.

"Em todo o país, vêm sendo noticiados diversos casos de falsidade na autodeclaração, o que vem dando causa à propositura de ações visando a nulidade do respectivo ingresso eivado de vício", explicam os procuradores da República Renato Machado, Ana Padilha e Sergio Suiama, autores da ação.

A Diretoria de Ensino da Marinha reconheceu ao MPF que, no concurso de 2017, não verificou se as declarações feitas pelos candidatos cotistas correspondiam à realidade. Afirmou, contudo, que nos concursos futuros será adotado procedimento de heteroidentificação, complementar à autodeclaração feita pelo candidato no momento da inscrição.

O artigo 2º da Lei de Cotas (Lei 12.990/2014) estabelece que "poderão concorrer às vagas reservadas a candidatos negros aqueles que se autodeclararem pretos ou pardos no ato da inscrição no concurso público, conforme o quesito cor ou raça utilizado pela Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE)".

O parágrafo único do mesmo artigo, todavia, determina que "na hipótese de constatação de declaração falsa, o candidato será eliminado do concurso e, se houver sido nomeado, ficará sujeito à anulação da sua admissão ao serviço ou emprego público, após procedimento administrativo em que lhe sejam assegurados o contraditório e a ampla defesa, sem prejuízo de outras sanções cabíveis".

Para o MPF, a interpretação da Lei das Cotas deve ser no sentido de promover a redução das desigualdades raciais e a implementação da igualdade material. "Independentemente da ideia que se tenha acerca do valor da mestiçagem no quadro da “democracia racial” brasileira, a miscigenação da população brasileira não deve servir para sabotar as políticas públicas voltadas à redução das evidentes e sociologicamente comprovadas desigualdades entre brancos e negros no Brasil", afirmam os procuradores.

"Ainda que possa haver falhas nos métodos de identificação racial e na avaliação do critério da cor da pele, esses desacertos não podem ser utilizados como argumento definitivo para impedir que as minorias sejam incluídas e que as ações afirmativas sejam implementadas no Brasil", completam. Com informações da Assessoria de Imprensa do MPF-RJ.

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