Acesso à Justiça

Médicos homens podem atender meninas vítimas de violência sexual, diz STF

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13 de março de 2019, 12h53

Meninas e adolescentes vítimas de violência sexual devem ser atendidas por legistas mulheres prioritariamente, mas a ausência de uma profissional não pode impedir a continuidade dos exames e procedimentos. Assim decidiu, por maioria, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, nesta quarta-feira (13/3), ao analisar lei do Rio de Janeiro que restringia o atendimento de vítimas do sexo feminino crianças e adolescentes às médicas.

Venceu a tese do relator, ministro Luiz Edson Fachin, que concedeu a cautelar para dar interpretação conforme a Constituição no sentido de reconhecer que as crianças e adolescentes do sexo feminino vítimas de violência deverão ser, obrigatoriamente, examinadas por legista mulher, desde que isso não provoque retardamento ou prejuízo da diligência. O ministro atribuiu, ainda, efeitos ex tunc, ou seja, retroativos, a fim de resguardar as perícias que tenham sido feitas por homens.

Os ministros comentaram que a intenção da edição da norma é boa, a contar que pretende proteger e criar um ambiente de acolhimento às meninas vitimizadas. No entanto, a realidade material se impôs por não haver número suficiente de profissionais mulheres no Rio de Janeiro para atender à demanda existente de vítimas de violência sexual. Dessa forma, meninas e adolescentes acabavam por não passar pelo exame e a diligência era suspensa.

"O risco evidenciado pela negativa de realização de atos periciais às vítimas menores de idade do sexo feminino por legistas homens compromete, concretamente e de modo mais urgente, o direito de crianças e adolescente de acesso à justiça e os princípios da proteção integral e da prioridade absoluta", apontou Fachin.

Para ele, a inconstitucionalidade é circunstancial, uma vez que não é a previsão abstrata da norma que é inconstitucional, mas a aplicação concreta dela.

A liminar foi pedida pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, em outubro passado, quando ela questionou o trecho da Lei 8.008/2018, segundo o qual a menor vítima de abuso sexual “deverá ser, obrigatoriamente, examinada por legista mulher”. Às mulheres adultas, o texto estipula que o atendimento será feito preferencialmente por médicas legistas.

Ao defender o pedido, Dodge explicou que impugnou a norma não por não reconhecê-la como importante e bem-intencionada, mas por ela estar alcançando efeitos opostos. "A lei tem excelente propósito, o de proteger as vítimas de estupro durante exame de laboratório em busca de vestígios do crime. Levei em conta esses aspectos ao analisar se entrava com a ação, visto que a norma vinha em socorro das vítimas. A questão é que a realidade da estrutura dos serviços periciais do Rio e a grande frequência de crimes, sobretudo em meninas, está produzindo efeito deletério, inesperado que esta medida visa atender", afirmou.

Assim, continuou, a norma tem levado à dificuldade de acesso à Justiça, ficando as vítimas sem as investigações, a persecução penal encaminhadas no estado do Rio.

Com diferentes argumentos, os ministros Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e o presidente Dias Toffoli acompanharam o entendimento pela concessão da liminar. O decano, Celso de Mello, não participou do julgamento. Os ministros Alexandre de Moraes, Luiz Fux e Marco Aurélio entenderam pela inconstitucionalidade do texto.

Clique aqui para ler o voto do relator.
ADI 6.039

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