Encruzilhada democrata

Novos fatos esquentam proposta de impeachment de Trump

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31 de maio de 2019, 10h05

As lideranças do Partido Democrata ainda não estão convencidas de que está na hora de abrir o processo de impeachment do presidente Donald Trump. É uma proposta que ainda está cozinhando em fogo lento. Mas novos fatos vêm engrossando o caldo a cada dia.

Gage Skidmore
Lideranças do partido democrata insistem que é preciso prosseguir nas investigações contra Donald Trump
Donald Trump

Nesta quinta-feira (30/5), por exemplo, a organização Protect Democracy anunciou que mais de mil ex-procuradores dos EUA, que serviram governos democratas e republicanos, assinaram um documento em favor do impeachment. Os ex-procuradores declaram que, com base em seu julgamento profissional, Trump seria processado criminalmente, acusado de obstrução de Justiça, se não fosse presidente.

O anúncio veio um dia depois de o ex-procurador especial Robert Mueller, que investigou o presidente por quase dois anos e produziu um relatório que foi bastante censurado, fazer um pronunciamento de oito minutos para anunciar o fim de sua tarefa. Nesse pronunciamento, Mueller declarou: “Se tivéssemos confiança de que o presidente não cometeu claramente um crime, teríamos dito isso [no relatório]”.

Essa declaração reforçou uma anterior, que fez parte do relatório: a de que não denunciava Trump por obstrução de Justiça, mas também não o exonerava. Em seu pronunciamento nesta quinta, Mueller voltou a explicar que regras antigas do Departamento de Justiça (DOJ), do qual o escritório do procurador especial faz parte, proíbem os procuradores de processar um presidente no exercício do cargo.

A declaração mais importante veio a seguir: “Desde o começo sabíamos que poderíamos investigar, mas denunciar o presidente por um crime não era uma opção”. E explicou que a Constituição “requer um processo outro do que o sistema de Justiça criminal” para processar um presidente por qualquer crime.

“Um processo outro”, previsto na Constituição, seria a abertura de um processo de impeachment, segundo interpretação dos ex-procuradores, de professores de Direito e de políticos. Em outras palavras, começa a se firmar a ideia de que o presidente pode ser acusado de obstrução de Justiça em um processo de impeachment, como aconteceu com os ex-presidentes Richard Nixon e Bill Clinton.

Outro fato novo foi a revelação, durante a semana, de dois deputados republicanos, de que eram favoráveis à abertura de processo de impeachment de Trump. Os dois declararam, separadamente, que estão convencidos de que o impeachment é inevitável. Um deles fez uma assembleia com seus constituintes, para explicar as razões de sua nova posição. E foi muito aplaudido por seus eleitores republicanos.

O aplauso dos eleitores republicanos foi o fato mais importante de todo o movimento pró-impeachment, desde que a proposta foi ventilada pela primeira vez, após as eleições de 2018, quando os democratas asseguraram maioria na Câmara dos Deputados.

A maioria democrata na Câmara, com o apoio de alguns republicanos, só serve para abrir o processo de impeachment, levantar e apresentar todas as denúncias contra Trump e, finalmente, aprovar o impeachment.

Não serve para condenar Trump no julgamento do impeachment no Senado. Para condenar Trump e consolidar o impeachment, é preciso de dois terços dos votos dos 100 senadores (ou 67 votos). Os democratas só podem garantir 47 votos no Senado, de forma que precisam dos votos de 20 senadores republicanos para a condenação.

No momento, nenhum senador republicano se manifestou a favor do impeachment. Aí entra o poder os eleitores republicanos. Somente eles podem convencer os 20 senadores republicanos a votar a favor do impeachment.

As lideranças do partido democrata insistem que é preciso prosseguir nas investigações contra Trump, revelar e tornar público mais fatos, para ver se conseguem mover montanhas — isto é, que eleitores republicanos, em número necessário, se convençam de que é necessário se livrar do presidente Trump, entregar o governo ao vice-presidente Mike Pence e disputar as eleições de 2020 com outro candidato.

Essa é uma tarefa hercúlea. Mesmo com republicanos ilustres se declarando a favor do impeachment. Mas não são eles que decidem. Quem decide são os eleitores que, nas assembleias (chamadas os EUA de Town Hall), dizem a seus representantes o que querem.

No caso de Nixon, os senadores republicanos, conhecedores da opinião de seus constituintes, foram à Casa Branca e disseram ao presidente: “Você tem de ir”. E Nixon renunciou.

No caso de Bill Clinton, os republicanos não observaram essa “regra”. Com maioria na Câmara, aprovaram o impeachment de Clinton. Mas, com maioria no Senado, os democratas votaram contra o impeachment. Clinton saiu fortalecido do episódio e sua popularidade aumentou, repentinamente, para 76%.

Por isso, as lideranças do Partido Democrata acreditam, sob os protestos do baixo clero, que pode ser mais fácil derrotar Trump nas eleições de 2020, depois de tornar públicos os supostos crimes do presidente, do que através de um processo de impeachment, que pode passar na Câmara e morrer no Senado.

Muita gente discorda desse raciocínio. Um grupo de deputados democratas, alguns candidatos às eleições de 2020 e democratas e republicanos ilustres acreditam que, se o Partido Democrata não mover um processo de impeachment contra Trump, vai transmitir a ideia de que o presidente estava limpo o tempo todo — e que, no final das contas, não havia razão para impeachment, apesar de tanta conversa. E isso poderá ajudá-lo nas eleições.

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