Perdimento na Exportação

Carf anula multa de R$ 10 bilhões da Cargill por não ver ocultação do adquirente

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20 de maio de 2019, 9h11

Quando não for constatada a ocultação do real adquirente nas operações de comércio exterior, a empresa indicada como interposta não é obrigada a pagar multa. A tese foi fixada pela 1ª Turma Ordinária da 2ª Câmara da 3ª Seção do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (Carf) que anulou uma autuação de R$ 10 bilhões da exportadora de grãos Cargill.

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Sem ocultação do real adquirente, a empresa não paga multa, diz Carf.
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Prevaleceu, por maioria, entendimento do conselheiro Marcelo Marcelo Giovani Vieira, que seguiu o relator nas conclusões. Para ele, os fins especulativos na venda de commodities são fins lícitos, e portanto, não podem ser apontados como infração.  

"O auferimento de benefícios fiscais na exportação também são lícitos, quando deveras exista a exportação, fato não desconstituído pelo Fisco. A existência da filial Cargill pode justificar-­se como necessidade de ser uma trading no exterior, para gestão cambial, para operações de performance de exportação, e  para facilitar negócios sob jurisdição britânica", explica. 

Segundo o conselheiro, outro possível motivo é o chamado "mercado FOB", ou seja, quando o exportador tem apenas responsabilidade de entregar a carga livre e desembaraçada no porto de saída.

"O fato de a filial no exterior não ter estrutura não a torna ilícita. As legislações societárias preveêm esse tipo de formatação e também pressupõe preços de transferência e não os  veda, com ou sem estrutura. A existência, há muitos anos, dos chamados "contratos de performance de exportação" têm como pressuposto que não há proibição de tal estrutura", aponta. 

Para a Receita, como houve ocultação, a pena seria equivalente a 100% na exportação do valor aduaneiro. Na sessão, a Cargill reconheceu que não tinha espaço físico, mas alegou que muitas vezes fechava as vendas com antecedência, e sempre declarou a sede e a contabilidade dos reais adquirentes.

Ao seguir o entendimento da maioria, o conselheiro Laercio Uliana Cruz Junior afirma que como debatido em julgamento, não se trata de ocultação do  real adquirente quando a matriz faz a venda para filial no exterior, a legislação tributária não veda esse tipo de sociedade.

"Levo em conta a modalidade do contrato e noto que nas Declarações de Exportação, a obrigação da exportadora brasileira era de entregar os produtos livre e desembaraçados no porto de saída do Brasil, para tanto, se utilizando do FOB, que em inglês significa free on board", diz. 

Assim, segundo o conselheiro, ao utilizar o FOB, o limite da empresa brasileira é de entregar os produtos no porto de saída, podendo a adquirente fazer qualquer negócio com esse produto. 

"Caso contrário, estaria a fiscalização brasileira indo além de seus limites jurisdicionais. Ainda que de modo contrário afasta­sse  tal raciocínio, verifica-­se que  a contribuinte não agiu com qualquer dolo, pois, ao se vender o produto da filial para um terceiro, não tinha qualquer campo para indicação do novo adquirente", defende.

Questões Mercadológicas
Na primeira sessão de julgamento, o relator, conselheiro Pedro Rinaldi tinha dito que o Fisco não levou em consideração questões mercadológicas, de bolsa e de mercado futuro, e que não havia base legal para desqualificar as operações feitas pela contribuinte. Com isso, votou por cancelar a multa

"Trata-se unicamente de adiantamento que o contribuinte faz na exportação, dentro de sua própria empresa, filial e matriz, como uma única personalidade jurídica", afirmou em seu voto.

Para o relator, também que nessas operações, a Cargill atuou formalmente como compradora. "Entretanto, não comprova a fraude. A fiscalização não está falando do comprador final e, sim, do comprador real", afirmou.

Atuação Lícita
Na avaliação do tributarista Eduardo Navarro, embora remeta a situações ilícitas, a utilização de paraíso fiscal é perfeitamente lícita, desde que respeitadas as consequências jurídicas decorrentes.

"A alocação de subsidiária em paraíso fiscal é muito comum na estrutura de organizações multinacionais e são utilizadas para diversas finalidades de forma lícita", diz. 

Para Navarro, por uma questão mercadológica, a Cargill optou por vender FOB à sua subsidiária em paraíso fiscal que, por sua vez, negociava a mesma carga com terceiros e determinava a remessa diretamente de portos brasileiros para este terceiro.

"Além de ser lícita, esta operação tem nome: Back to Back e é devidamente regulamentada pela Receita Federal. As consequências jurídicas de operar com uma subsidiária em paraíso fiscal não passam pela “interposição fraudulenta”, mas pela inutilização do valor da transação como método de valoração aduaneira e aplicação de regras inerentes à apuração do lucro real", aponta. 

Caso
No caso, a Cargill brasileira exportava para uma filial que ficava numa ilha tropical caribenha. Lá, os grãos eram revendidos para outra empresa. A filial da Cargill no país, no entanto, não tinha loja física. Segundo a Receita, sem um estabelecimento no país, não haveria local para armazenamento dos grãos e, portanto, a revenda estaria ocultando o real adquirente, prática vedada pela legislação. Os conselheiros entenderam que os fatos não subsumem à interposição fraudulenta.

 Clique aqui para ler o acórdão.
16561.720129/2017-79

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