Expectativa de privacidade

Polícia não pode fazer busca em lixo sem mandado judicial, diz corte dos EUA

Autor

16 de maio de 2019, 9h35

O Tribunal Superior de Oregon, nos EUA, reformou jurisprudência do estado, de quase 50 anos, ao decidir que os cidadãos têm “interesse à privacidade” no lixo que colocam na calçada para coleta. Isso significa que a polícia não pode fazer busca no lixo de um suspeito, mesmo após ser coletado pelo caminhão.

photka
Tribunal dos EUA decidiu que os cidadãos têm “interesse à privacidade” no lixo que colocam na calçada para coleta
photka

Segundo a corte, os cidadãos têm uma expectativa razoável de que, depois de colocarem seu lixo em recipientes apropriados para coleta, ninguém, nem mesmo a polícia ou os coletores de lixo, podem remexê-lo com o propósito de encontrar provas de atividades ilícitas, sem mandado judicial.

“Em nosso entendimento, a maioria dos cidadãos considera seu lixo privado e que é totalmente inapropriado que outras pessoas — vizinhos curiosos, ex-cônjuges, empregadores, oponentes em ação judicial, jornalistas e autoridades governamentais, entre outras — o levem para inspecioná-lo”, diz a decisão da maioria, por 6 votos a 1.

Os ministros se referiram a uma notícia de 2002, em que repórteres do jornal Willamette Week vasculharam recipientes de lixo e de reciclagem do chefe de polícia de Portland, do prefeito de Portland e do procurador federal do Condado de Multnomah, e então publicaram o que encontraram.

“A maioria dos cidadãos se sentiria ultrajada se seu lixo fosse submetido a tal inspeção”, diz a decisão.

No caso perante o tribunal superior, em 2014 a polícia pediu aos coletores de lixo da cidade de Lebanon, de 16 mil habitantes, para coletar e colocar em um lugar separado no caminhão o lixo de Tracy Lynn Lien e Travis Allen Wilverding, que dividiam uma casa. A polícia suspeitava que os dois traficavam metanfetamina.

Ao fazer buscas em seu lixo, mais tarde, a polícia descobriu provas de atividades relacionadas a drogas e obteve um mandado judicial para fazer busca e apreensão na casa. A busca foi frutífera e resultou na condenação dos suspeitos.

O tribunal superior decidiu que a polícia violou a Constituição de Oregon, que garante proteção aos cidadãos contra buscas e apreensões não razoáveis, sem mandado judicial. Os suspeitos tinham “interesse à privacidade” em seu lixo. E os lixeiros agiram como “agentes” da polícia ao coletar o lixo e separá-lo para os investigadores.

Ao anular a condenação, o tribunal superior reformou decisões de um tribunal federal de primeira instância, em 2014, e de um tribunal de recursos de Oregon, em 2017.

O entendimento colidiu totalmente ou em parte com decisões do próprio tribunal superior de Oregon, em 1968 e 2007. Nesses casos, a corte aprovou buscas sem mandado judicial em lixos coletados pelas empregadas de um motel e por lixeiros na calçada. Nos dois casos, o que a polícia encontrou levou a condenações de suspeitos, por atividades relacionadas a drogas.

A decisão da maioria admitiu que a Suprema Corte dos EUA já decidiu que os cidadãos não podem ter uma expectativa razoável de privacidade “no lixo deixado na calçada para coleta, em área acessível ao público”. Mas a própria Suprema Corte também declarou que “os estados são livres, individualmente, para impor restrições mais rigorosas à polícia, com base em suas próprias constituições”.

A decisão só se refere, porém, a lixo colocado na calçada em frente a casas. Não se refere a lixo colocado em recipientes de lixo em áreas públicas, como a de blocos de apartamentos ou condomínios. Assim, não ficou clara a questão da privacidade do lixo em recipientes comunitários.

No único voto dissidente, o ministro Tem Kistler escreveu que não entende as justificativas da maioria, porque, “uma vez que o lixo é coletado, a companhia de coleta de lixo se torna a proprietária do lixo. E, como tal, ela pode decidir separar o lixo de um suspeito, dá-lo de presente à polícia e consentir com qualquer busca de apreensão do conteúdo”.

Autores

Tags:

Encontrou um erro? Avise nossa equipe!