Vitalício, mas não eterno

Suprema Corte dos EUA anula decisão que incluiu voto de juiz morto

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1 de maio de 2019, 8h28

Exatos 11 dias antes de morrer, o juiz Stephen Reinhardt, do Tribunal de Recursos da Nona Região, entregou à corte seu voto sobre igualdade de salários, que iria encantar as mulheres. Dias depois, seu voto foi aprovado pelo pleno por 6 votos a 5. Mas, antes de o tribunal publicar a decisão, Reinhardt morreu. A corte emitiu a decisão assim mesmo, e o caso terminou na Suprema Corte, que anulou a decisão — basicamente porque mortos não votam.

Sean Pavone
Suprema Corte anulou decisão que contabilizou voto de juiz que morreu antes da publicação do acórdão 
Sean Pavone

“Como o juiz Reinhardt não era mais juiz no momento em que a decisão do pleno desse caso foi publicada, o Tribunal de Recursos da Nona Região errou ao contá-lo como um membro da maioria. Essa prática permitiu, efetivamente, a um juiz morto exercer o poder judicial dos Estados Unidos após sua morte. Mas juízes federais são nomeados para toda a vida, não para a eternidade”, decidiu a Suprema Corte.

O caso (Yovino v. Rizo) é importante para dirimir dúvidas sobre equiparação salarial para mulheres. A Lei da Igualdade de Pagamentos (Equal Pay Act) permite disparidades se elas são baseadas em outros fatores que não o sexo. No entanto, os tribunais federais não chegam a um consenso sobre se o salário anterior se encaixa nessa definição. A Suprema Corte poderia ter respondido a essa questão. Entretanto, preferiu apenas anular a decisão do tribunal de recursos, com base em uma tecnicidade.

A funcionária do Departamento de Educação do Condado de Fresno, na Califórnia, Aileen Rizo, moveu a ação contra o superintendente das escolas alegando que o condado estava violando a Lei da Igualdade de Pagamentos de 1963, porque seu salário inicial foi injustamente baseado no que ela ganhava antes de conseguir seu atual emprego.

Após passar pela primeira instância, o caso chegou ao tribunal de recursos, que aprovou o voto do juiz Reinhardt a favor da peticionária. A decisão dizia: “Salário anterior apenas ou em combinação com outros fatores não pode justificar a diferença de salários”. O juiz escreveu ainda: “Seria inconcebível que a Lei da Igualdade Salarial iria permitir disparidades que o Congresso declarou que não são apenas relacionadas a sexo, mas causadas pelo sexo”.

Em uma nota de rodapé na página inicial da decisão, o tribunal de recursos explicou: “Antes de sua morte, o juiz Reinhardt participou inteiramente do caso e foi o autor desta decisão. A decisão da maioria e todos os votos concordantes foram finais e a votação foi concluída pelo tribunal pleno antes de sua morte”.

Por contar o voto de Reinhardt, o tribunal considerou que a decisão foi tomada pela maioria. Consequentemente, a decisão constituiu um precedente vinculante, a ser seguido pelas turmas da corte no futuro. Mas, sem o voto de Reinhardt, a decisão atribuída a ele terminaria empatada em 5 a 5.

A decisão da Suprema Corte foi largamente celebrada como uma vitória significativa para os trabalhadores e para o movimento a favor da equiparação salarial, segundo o jornal Observer. Mas esbarrou no entendimento da Suprema Corte de que o juiz tem de viver até que a decisão seja publicada para ela valer.

“Pela prática judicial, não temos conhecimento de que qualquer decisão do tribunal de recursos determinando que os votos dos juízes sejam imutáveis em qualquer ponto antes de sua publicação. É geralmente entendido que um juiz pode mudar sua opinião até o momento em que a decisão é publicada”, explicou a Suprema Corte.

A Suprema Corte remeteu o processo ao tribunal de recursos para novo julgamento. Depois de novamente julgado pelo tribunal de recursos, o caso deverá voltar outra vez à Suprema Corte — isto é, se nenhum dos juízes morrer antes da publicação da decisão.

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