Princípio do contraditório

Juiz paranaense consegue brecar desagravo público porque não foi ouvido pela OAB

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30 de junho de 2019, 18h33

O desagravo público é o instrumento de garantia da dignidade profissional, previsto no artigo 7º, inciso XVII, do Estatuto da Advocacia (Lei 8.906/94). Embora a sua natureza não tenha caráter de processo administrativo, o procedimento deve proporcionar ao suposto ofensor o direito ao contraditório e à ampla defesa, como asseguram os incisos LIV e LV do artigo 5º da Constituição.

Por isso, a 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região negou recurso da seccional paranaense da Ordem dos Advogados do Brasil, inconformada com a suspensão da sessão solene de desagravo em desfavor do juiz de direito Jonathan Cheong, que seria realizada em frente ao fórum da Comarca de Teixeira Soares (PR). Tal como o juízo de origem, os desembargadores entenderam que se não fosse concedida a tutela de urgência, pedida pelo magistrado, o perigo de dano seria evidente e as consequências irremediáveis.

"Com efeito, tendo em vista a essencialidade de que sejam prestadas informações pelo suposto ofensor, tenho que se faz imprescindível a dilação probatória, mormente para a verificação se houve ou não a efetiva notificação, e se a informação de desídia pela parte agravada é verossímil", registrou o voto da desembargadora-relatora Vânia Hack de Almeida, que já havia indeferido o pedido de efeito suspensivo de forma monocrática.

Desagravo público
Conforme os autos, o processo destinado a apurar a violação às prerrogativas profissionais do advogado Nelson Anciutti Bronislawski foi instaurado, inicialmente, por conta de "determinados e específicos fatos" ocorridos no processo 1097-22.2014.8.16.0164, em trâmite na Vara Cível da Comarca de Teixeira Soares. O caso concreto envolvia a arrematação de um trator num leilão judicial.

Ocorre que a OAB-PR, além de julgar procedente a denúncia apresentada por Nelson, levou em consideração outros fatos, dos quais o juiz sequer fora informado. Conforme o conselheiro Rodrigo Kanayama, o juiz Jonathan Cheong, que jurisdiciona na Vara Cível da Comarca, também teria proferido outras ofensas, referidas em dois protocolos.

Pedido de antecipação de tutela
Sentindo-se prejudicado, Cheong ingressou com pedido de antecipação parcial de tutela de urgência para suspender a sessão solene de desagravo público, marcada para o dia 8 de outubro de 2018, às 10h30min, até o desfecho da ação.

Em síntese, alegou: primeiro, que não desrespeitou as prerrogativas profissionais da advocacia; segundo, que as reclamações apresentadas pelo advogado, que milita na cidade de Irati (PR), à Corregedoria do Tribunal de Justiça do Paraná foram arquivadas; terceiro, que a decisão que autorizou o ato de desagravo não foi devidamente fundamentada; e, por fim, que foram acrescidos à denúncia quatro novos fatos, dos quais não foi dada a oportunidade de se manifestar.

Em manifestação dirigida à 6ª Vara Federal de Curitiba, a OAB-PR argumentou que não feriu o princípio do contraditório, porque o desagravo público não é processo contencioso que admita a formação de um polo passivo. Ou seja, o relator do procedimento pode dispensar o pedido de informações. Ainda assim, ele determinou a notificação do magistrado, para que prestasse esclarecimentos sobre os fatos apresentados.

Apesar de notificado em três oportunidades, segundo a OAB-PR, o autor "quedou-se inerte", deixando de prestar as informações e de comparecer às audiências de instruções designadas para os dias 10 de agosto e 29 de novembro de 2016. No final das contas, denunciou, o juiz deixou transcorrer o prazo para o protocolo destas audiências a fim de requerer, via Poder Judiciário, a suspensão do ato de desagravo. Logo, não se pode falar em violação do princípio do contraditório.

Decisão procedente
Em despacho proferido no dia 20 de novembro de 2018, o juiz federal substituto Augusto César Pansini Gonçalves concedeu a tutela de urgência, por entender que o contraditório e a ampla defesa não foram observados no processo. Assim, não seria possível aplicar a pena de censura pública antes de ouvir o magistrado.

O titular da 6ª Vara Federal de Curitiba lembrou a OAB não é uma mera autarquia profissional destinada a fiscalizar a advocacia, corporativa, porque também desempenha função institucional e ostenta personalidade jurídica de direito público, como decidiu o Supremo Tribunal Federal ao julgar a ADI 3.026-4 (DF). Assim, na condição de entidade autárquica, a OAB deve respeitar o princípio do contraditório e da ampla defesa ao instaurar um processo destinado a censurar juízes e desagravar advogados.

Para derrubar o despacho, a OAB paranaense manejou recurso de Agravo de Instrumento no TRF-4 que, no entanto, não teve provimento.

Clique aqui para ler o despacho da 6ª Vara Federal de Curitiba.
Clique aqui para ler o acórdão do TRF-4.
Clique aqui para ler o acórdão do STF.
Procedimento Comum 5045884-37.2018.4.04.7000/PR

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