Federal e estadual

Suprema Corte dos EUA mantém doutrina que permite duplo julgamento do réu

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18 de junho de 2019, 9h03

A Suprema Corte dos Estados Unidos decidiu, nesta segunda-feira (17/6), manter uma antiga doutrina segundo a qual um réu pode ser processado na Justiça Federal e na estadual pelo mesmo crime. Presume-se, nesse caso, que o réu violou simultaneamente leis federais e leis estaduais.

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Doutrina mantida pela Suprema Corte se baseia em precedente de 170 anos, que nunca deixou de ser controvertidoDivulgação

A doutrina se baseia em precedente de 170 anos, que nunca deixou de ser controvertido. Ela admite uma forma de dupla punição (double jeopardy) pelo mesmo crime, o que, de uma maneira geral, é proibido pela Constituição.

Mas sobrevive graças a uma exceção à cláusula da dupla punição, que deriva da doutrina da dupla soberania — isto é, cada um dos 50 estados dos EUA é uma jurisdição soberana, e a União Federal é outra jurisdição soberana que une todos os estados em uma nação.

“A doutrina da dupla soberania permite processar uma pessoa na Justiça Federal por um crime, mesmo que ela já tenha sido processada na Justiça estadual pelo mesmo crime — e vice-versa. Um ato pode ser denunciado como um crime pelas soberanias nacional e estadual porque é um crime contra a paz e a dignidade de ambas e pode ser punido por cada uma delas”, diz a Wikipédia.

Essa doutrina da dupla soberania é a que prevaleceu na decisão da Suprema Corte por 7 votos a 2. Os votos não seguiram linhas ideológicas dos ministros da corte, como de costume: quatro ministros conservadores e três liberais votaram a favor, enquanto um ministro conservador e uma ministra liberal votaram contra.

O ministro Samuel Alito, que escreveu o voto da maioria, observou que o governo federal e os estaduais frequentemente têm poderes parcialmente coincidentes, que possibilitam duas camadas de regulamentação. Exemplos incluem a tributação federal e estadual, bem como legislações relativas a jogos, consumo de bebidas alcoólicas e maconha.

“Os dispositivos respeitam as diferenças substantivas entre os interesses que duas soberanias podem ter em punir o mesmo ato”, diz a decisão da maioria, segundo os jornais USA Today e The Hill.

Em voto dissidente, a ministra liberal Ruth Ginsburg escreveu: “Considerar o estado e o governo federal como soberanias separadas é ignorar um princípio básico de nosso sistema federal. O conjunto separado de direitos de cada forma de governo tem a intenção de garantir os direitos das pessoas, não de processá-las pelo mesmo crime”.

Também em voto dissidente, o ministro Neil Gorsuch declarou: “Uma sociedade livre não permite a seu governo julgar o mesmo indivíduo pelo mesmo crime até que esteja satisfeito com o resultado. Em vez disso, a Constituição promete a todos os americanos que nunca irão sofrer dupla punição”.

O caso foi levado à Suprema Corte em benefício de Terance Gamble, que foi sentenciado a 1 ano de prisão por um juiz do estado de Alabama e a 4 anos de prisão por um juiz federal pelo mesmo crime relacionado a armas. As duas penas correm simultaneamente, e Gamble já teria sido libertado pela condenação estadual. Mas terá de passar mais um ano na prisão por causa da condenação federal.

A decisão da Suprema Corte ganhou atenção nacional porque o presidente Donald Trump vem considerando conceder perdão presidencial a alguns de seus assessores, que foram julgados e condenados durante as investigações de conluio da campanha de Trump com a Rússia — entre eles o chefe de seu comitê de campanha Paul Manaford.

Mas o presidente só pode conceder perdão para condenações na Justiça Federal. Nesse caso, os ex-assessores de Trump continuarão presos porque também foram ou poderão ser condenados na Justiça estadual, com base nas mesmas acusações de crimes — ou de acusações similares. Depende da ação que os promotores estaduais queiram tomar.

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