Opinião

Uma análise sobre a questão das bagagens aéreas após o veto presidencial

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18 de junho de 2019, 14h12

Nesta segunda-feira (17/6) foi sancionada, parcialmente, a Medida Provisória 863/2018, ou “MP do setor aéreo”, como ficou conhecida.

A MP 863 trouxe dois grandes pontos de alteração legislativa: o primeiro dizia respeito à imposição que existia na Lei 7.565/86 quanto à presença de brasileiros no comando das empresas do setor aéreo de transporte de passageiros e a necessidade de parte do capital da pessoa jurídica ser de brasileiros; já o segundo ponto era relacionado à franquia de bagagens transportadas nas aeronaves em voos comerciais.

Com relação ao primeiro aspecto, a alteração legislativa retirou praticamente todas as barreiras contra estrangeiros (tanto na direção de empresas do setor aéreo quanto de seu capital), deixando apenas a obrigatoriedade de que a pessoa jurídica seja constituída sob as leis brasileiras, com sede e administração aqui no Brasil, ou seja, pode ser de brasileiro ou estrangeiro, e não importa de quem é o capital dessa pessoa jurídica.

No que pertine ao segundo ponto, a obrigação para essas empresas de garantir uma franquia mínima de bagagem por passageiro nos voos domésticos (23 kg para aeronaves acima de 31 assentos; 18 kg para aeronaves de 21 a 30 assentos; e 10 kg para aeronaves de até 20 assentos) foi vetada pelo presidente da República. Esse veto foi alinhado com a manifestação enviada pelo Cade e pela nota técnica da Anac, que apresentaram vários argumentos técnicos para essa decisão.

É certo que diversas entidades de defesa do consumidor do país também se manifestaram diretamente ao presidente da República, com argumentos favoráveis à sanção integral do projeto de lei, reforçando a ideia exarada pelo Poder Legislativo quando da aprovação no Congresso Nacional, especialmente no Senado Federal.

A sanção integral do texto enviado seria uma vitória para a defesa do consumidor e uma demonstração de que, apesar das questões econômicas, há um respeito aos princípios definidos na Constituição, tanto no artigo 5º, inciso XXXII (o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor) quanto no artigo 170, inciso V (a ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre-iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observada a defesa do consumidor, como princípio desta ordem econômica).

Contudo, o apelo de algumas empresas estrangeiras que demonstraram interesse em atuar em espaço brasileiro, algumas destas intituladas como low cost (baixo custo em inglês) — empresas aéreas conhecidas por oferecer um serviço barato, mas retirando o máximo possível do contrato de transporte aéreo —, foi mais enfático. Essas empresas são muito comuns na Europa, onde os territórios permitem o deslocamento rápido, em razão da extensão territorial de seus países.

No Brasil, temos outro cenário, um país de dimensão continental, com lugares de difícil acesso terrestre e por vezes com acesso apenas aéreo e/ou pluvial. Pessoas que precisam se deslocar muitas vezes para trabalhar durante toda a semana e no final da semana retornar ao seu lar. Pessoas que precisam se deslocar de um lugar a outro com diferença climática bem nítida, como o exemplo de alguém que sai do ensolarado Nordeste para o gélido Sul do país, certamente terá que levar roupas que não caberiam em uma pequena mala de mão.

É certo que, concorrencialmente, há um discurso de que, quanto menos cobranças, mais empresas poderiam atuar. Mas a que preço? Qual o valor para esse serviço prestado no Brasil? O Brasil tem a mesma extensão territorial da Europa (onde atuam a maioria das empresas low cost)? Qual o tipo de passageiro que será beneficiado? Haverá democratização ou secessão de pessoas que precisam se locomover neste grande e extenso Brasil?

Toda decisão passa uma mensagem. Teremos impactos positivos e negativos no mercado de transporte aéreo no Brasil. E quais serão maiores? Só o tempo e atuação efetiva e concreta dos órgãos fiscalizadores, notadamente, a agência reguladora (Anac) e os integrantes do Sistema Nacional de Defesa do Consumidor (SNDC) é que nos mostrarão.

Não devemos nos olvidar de que o Congresso Nacional poderá rejeitar esse veto presidencial. Após a publicação do veto no Diário Oficial da União, a Presidência da República encaminha mensagem ao Congresso, em até 48 horas, especificando suas razões e argumentos, conforme o artigo 66 da Constituição da República. O Congresso apreciará o pleito e decidirá pela manutenção ou rejeição do veto. Portanto, vamos aguardar os próximos passos desta medida que afetará grande parte dos brasileiros que dependem do setor aéreo para se deslocar neste imenso Brasil.

O mundo das relações de consumo no Brasil vem se aperfeiçoando, os consumidores estão mais atentos e quem se dispuser a oferecer serviço ou produto no Brasil deverá estar atento a todas as legislações deste país, para que não tenha problemas com os órgãos fiscalizadores, que deverão, a partir de agora, estar mais cautelosos com este novo cenário: novos players no mercado requerem mais medidas educativas e fiscalizatórias.

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