Comando do MPF

"Atuação do Ministério Público sempre será dupla, como autor e fiscal do processo"

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13 de junho de 2019, 9h00

Luiza Frischeisen é uma das entrevistadas desta quinta-feira (13/6) na série que a ConJur publica, ouvindo todos os candidatos à lista tríplice para concorrer à Procuradoria-Geral da República.

Divulgação / ANPR
É integrante do Conselho Superior do Ministério Público Federal e coordenadora da 2ª Câmara de Coordenação e Revisão. Integra desde 1992 a instituição, a qual representou no Conselho Nacional de Justiça de 2013 a 2015.

Há 18 anos a Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR) leva ao presidente da República uma lista com três nomes escolhidos pela classe para comandar a instituição. A votação está marcada para o dia 18 de junho, das 10h às 18h30, por meio eletrônico.

Apenas a primeira lista tríplice, enviada em 2001 ao presidente Fernando Henrique Cardoso, foi descartada. De lá para cá, todos os PGRs estavam entre os três indicados. Apesar da tradição, nada impede que o presidente da República indique para sabatina no Senado um quarto nome.

O mandato da atual procuradora-geral da República, Raquel Dodge, termina em 18 de setembro, mas, de acordo com a Constituição Federal, ela pode ser reconduzida ao cargo, se for indicada pela Presidência da República. Também decidiu concorrer ao cargo sem participar da lista da ANPR o subprocurador-geral da República Augusto Aras.

Neste ano, dez integrantes da instituição concorrem a uma vaga na lista da ANPR. Seis deles são subprocuradores-gerais da República, o último degrau da carreira. Os demais são procuradores regionais, com atuação nos Tribunais Regionais Federais.

Leia a entrevista com Luiza Frischeisen:

ConJur — O MP pode fazer campanha de combate à corrupção? Esse tipo de campanha é compatível com as funções do órgão? Por quê?
Luiza Frischeisen — O Ministério Público pode fazer campanhas relacionadas aos temas de sua atuação, que estão estabelecidos na Constituição Federal e marcos normativos do país com as leis e os tratados internacionais, para prevenir delitos, incentivar canais de apresentação de representações para fins penais, atuar de forma preventiva, para que determinados delitos diminuam ou que a população possa ter mais compreensão da atuação de cada um dos atores do sistema de justiça, seja na atuação criminal como na atuação da tutela coletiva.

Existem campanhas, inclusive, incentivadas pelo CNMP (o mesmo para o poder judiciário, pelo CNJ) e o mesmo divulga em seu site projetos de todos os MPs e as suas próprias.

Quando às campanhas de combate à corrupção, as mesmas podem, inclusive, auxiliar empresas em seus programas de compliance (aqui campanhas do CNMP sobre o tema).

E uma das ações da ENCCLA (Estratégia Nacional de Combate à Corrupção e à Lavagem de Ativos), em 2018, foi, justamente, um plano nacional, que contém campanhas para a sociedade civil.

Quando são necessárias mudanças legislativas, os debates acontecerão no Congresso Nacional, quase sempre com audiências públicas, nas quais várias instituições se fazem presentes.

ConJur — Os acordos de delação premiada pararam de ser assinados. O modelo sofreu algum impacto com a suspensão do acordo com a JBS?
Luiza Frischeisen — Acordos de colaboração premiada, leniências e acordos de não persecução penal têm sido feitos por colegas de todo o Brasil, pois a atribuição é de cada um(a) dos integrantes do MPF em seus processos e procedimentos.

Sobre o tema é sempre bom citar que existem:
– orientação conjunta da 2ª (Criminal) e 5ª (De repressão à corrupção e improbidade) Câmaras de Coordenação e Revisão (CCRs) do MPF para acordos de colaboração
orientação sobre acordos de não persecução penal das CCRs com atribuição criminal
orientação sobre leniência da 5ª CCR

Portanto, o protagonismo do MPF nos acordos de colaboração e leniência vem sendo exercido por colegas em nossas diversas unidades.

ConJur — Faz sentido o MP ser fiscal da lei em casos criminais?
Luiza Frischeisen — Com certeza, o Ministério Publico é ator essencial do sistema acusatório, portanto, sua atuação sempre se fará de forma dupla, como autor e fiscal. O MP não tem o dever de acusar, e sim de atuar na proteção dos bens jurídicos, que são protegidos pela legislação criminal. Mas, além disso, precisa atuar também na fiscalização do cumprimento do devido processo legal, que inclui, evidentemente, garantias do acusado. Por isso, a atuação do Ministério Público acontece não somente durante as investigações, cautelares e ações penais, como órgão do sistema de justiça criminal a quem a prova é dirigida para elaboração de ação penal ou não, mas, também em Habeas Corpus, queixas crime, mandados de segurança criminais, revisões criminais e reclamações, nos diversos graus de jurisdição.

ConJur — Como deve ser o relacionamento do MP com a Polícia e com o Judiciário? Como avalia essa relação atual?
Luiza Frischeisen — O relacionamento entre quaisquer instituições deve ser de respeito e urbanidade, especialmente, quando de julgamentos em tribunais, quando há grande exercício da oralidade por membros da Magistratura, Ministério Público e Defesa ( Pública e Privada).

Como coordenadora da Câmara Criminal do MPF (2ª CCR) tenho como diretriz manter franco dialogo com as instituições de investigação, fiscalização e controle como a Polícia Federal, Receita Federal, Polícia Rodoviária Federal, CVM, INSS, Subsecretaria dos Regimes Próprios da Previdência Social, para melhoria da qualidade das investigações, das representações com comunicação de delitos, para não repetição de atos em fluxos de trabalho, para racionalização das investigações e maior eficiência na atuação do sistema de justiça criminal. O mesmo ocorre junto ao Poder Judiciário.

ConJur — O modelo de força-tarefa prejudica o direito de defesa? Por quê?
Luiza Frischeisen — O modelo de força-tarefa é uma forma de o Procurador Natural, diante de um caso mais complexo, solicitar auxílio interno de colegas e servidores e organizar o trabalho com instituições de investigação, fiscalização e controle, como Polícia Federal e Receita Federal, que também já estão atuando na investigação dos mesmos fatos ilícitos.

As forças tarefas se especializam nos temas que investigam e contam as ferramentas da Lei de Combate ao crime organização (inclusive, colaboração premiada), apoio de setores de análise e pesquisa do MPF (o que precisa, inclusive, ser incrementado), muita cooperação internacional e uso intensivo de ferramentas digitais de análise.

Nada disso prejudica o direito de defesa, pois todas as medidas cautelares, quando necessárias, são pedidas em juízo, os acordos de colaboração e leniência só podem acontecer na presença dos advogados, e toda prova utilizada para as ações penais ou de improbidade será apresentada em juízo e submetida ao contraditório.

ConJur — O MP pode interferir na execução de políticas públicas em nome do combate à corrupção?
Luiza Frischeisen — As diretrizes de políticas públicas para afirmação de direitos sociais, infraestrutura, segurança pública e defesa de grupos minoritários ou vulneráveis estão estabelecidas na Constituição Federal e nos marcos normativos que vieram a seguir.

Nesse ano completaremos 31 anos da nossa Constituição Federal, há vasta jurisprudência (inclusive na parte orçamentária como tivemos na decisão do STF sobre impossibilidade de contengenciamento de verbas do Fundo Penitenciário) e doutrina sobre o tema e hoje falamos em inadimplência, insuficiência ou inadequação das políticas públicas, a atuação do Ministério Publico, por seus diversos ramos, se dará nesse universo, sempre em razão do estabelecido na Constituição, leis e tratados. O campo da formulação da políticas públicas, escolha de estratégias e ações (algumas com discricionariedade vinculada, como são as da educação e saúde) cabem ao Legislativo e o Executivo.

Ao Ministério Público cabe atuar na defesa do patrimônio público e dos preceitos constitucionais e legais que regem o exercício da administração pública, fazendo investigações e propondo ações penais ou de improbidade quando administradores e particulares agirem de forma ilícita.

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