Opinião

Quando a sujeição às regras do jogo democrático é deixada de lado

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11 de junho de 2019, 17h39

Então vereis outra vez a diferença entre o justo e o ímpio; entre o que serve a Deus, e o que o não serve
(Malaquias 3:18)

Inicio tendo como pano de fundo uma operação de combate à corrupção que produziu excepcionais efeitos na vida nacional, revelando à sociedade brasileira a face mais obscura e imoral de significativa parcela da classe política e empresarial brasileira.

O trabalho desenvolvido pelos agentes do estado, que corajosamente partiram do postulado de que todos devem ser iguais perante a lei, jamais será apagado como instrumento que elevou nosso patamar de civilidade e cidadania.

Infelizmente, como a perfeição não faz parte da natureza humana, fatos foram lançados à opinião pública demonstrando uma promíscua relação paraprocessual entre alguns membros do MP e entre estes e um juiz, que teve sua parcialidade questionada.

Esses acontecimentos têm revelado que o envolvimento dos cidadãos com o trabalho realizado pelos agentes públicos fez aflorar uma face nebulosa e perigosa da nossa sociedade, dividindo pessoas e instituições, de forma maniqueísta, entre bons e maus.

De um lado, aqueles que acham que a operação "lava jato" é composta de lobos em pele de cordeiros, que tudo fazem para “perseguir” aqueles que “elegem” como seus alvos.

De outro, os seus “defensores”, que entendem que tudo vale no combate à corrupção, num verdadeiro clima maquiavélico de “the ends justify the means” (os fins justificam os meios), de um estranho lawfare do bem.

A história nos ensinou (ou deveria ter ensinado) que o extremismo nunca foi resposta para nada. De Stalin a Hitler, de Mussolini a Fidel, o radicalismo político só nos trouxe retrocesso, divisão social e violência. Não é uma análise, mas uma constatação irrefutável.

Tragicamente, mesmo com todos esses exemplos à nossa soleira, a sociedade brasileira insiste em perquirir radicalismos, elegendo heróis e vilões, numa sanha persecutória que legou àqueles que defendem postulados democráticos fundamentais, não se situando nos extremos, a incômoda posição de “defensores da corrupção”, “golpistas”, “cúmplices do colarinho branco”, “assassinos da democracia” e inúmeros outros epítetos produzidos a ritmo “instagraniano”.

De parte a parte há os que tudo podem e nada devem. Uns que, ironicamente, são os legítimos defensores da lei e, por sê-lo, estão imunes a ela, pois o papel que cumprem lhes autorizaria uma certa impermeabilização legal, inalcançável a outros atores menos importantes.

Nessa toada, vamos deixando de lado elementos fundamentais a uma civilização.

Tolerância, respeito, direito de crítica, sujeição às regras do jogo democrático são deixados de lado ao mesmo passo em que se acirram os ânimos e se aprofunda a divisão da sociedade.

Nessa guerra digital fratricida, sequer cérebro é necessário, pois que suficiente replicar o “pensamento” dos falsos heróis. Basta um dedo e um smartphone para, inconsequentemente, a seita digital (de direita ou de esquerda) disparar xingamentos, expor vidas e destruir reputações.

Já passou da hora de entendermos que uma sociedade é composta de pessoas, intrinsecamente, por natureza, imperfeitas. Que amam, mas também odeiam. Que erram, mas também acertam. Que praticam o bem, mas também o mal. Que podem ser heróis, mas também vilões. Por vezes justos, por outras ímpios.

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