Litigância de má-fé

TJ-RS condena advogados que cobraram duas vezes pelo mesmo serviço

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8 de junho de 2019, 9h05

A cobrança de honorários advocatícios em duplicidade, com a repetição dos mesmos fundamentos nas petições, configura litigância de má-fé e justifica multa. Além disso, o juiz pode e deve oficiar a seccional da Ordem dos Advogados do Brasil para apurar eventual infração praticada pelo advogado.

Com esse entendimento, a 16ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul confirmou sentença que condenou três advogados por litigância de má-fé. Nas duas instâncias, eles foram condenados a pagar multa e indenização por terem cobrado pelo mesmo serviço de uma instituição de ensino. O cliente derrubou a ação de arbitramento de honorários ao mostrar, em juízo, o desfecho de outras ações com os mesmos autores e causa de pedir.

‘‘Não é crível que o escritório seja desorganizado a ponto de não saber quais os processos já haviam sido ajuizados em desfavor da ré, bem como as respectivas verbas honorárias que já haviam sido colocadas em discussão — as quais, diga-se de passagem, se tratam de valores vultosos. Portanto, não merece reforma a decisão recorrida, já que a parte apelante movimentou a máquina do Poder Judiciário de forma temerária’’, afirmou o relator da apelação, desembargador Érgio Roque Menine.

Após essa decisão, os autores apresentaram recurso especial ao TJ-RS, tentando derrubar a condenação e a notificação à OAB-RS. O desembargador Túlio de Oliveira Martins, 3º vice-presidente da corte, não viu motivos para remeter o caso ao Superior Tribunal de Justiça, inadmitindo o recurso. Conforme o magistrado, a 16ª Câmara Cível decidiu de forma clara e conforme sua convicção, com base nos elementos de prova que entendeu pertinentes.

‘‘No entanto, se a decisão não correspondeu à expectativa da parte, não deve por isso ser imputado vício ao julgado. De igual forma, não se verifica ausência de fundamentação a ensejar a nulidade do julgado e, consequentemente, nenhuma contrariedade ao art. 489 do Código de Processo Civil (Lei n. 13.105/2015)’’, escreveu.

Os autores entraram com agravo em recurso especial, ainda não julgados.

Cobranças duplicadas
Os três advogados ajuizaram, na 4ª Vara Cível da Comarca de Canoas, ação de arbitramento de honorários após defenderem a instituição de ensino em uma ação declaratória de imunidade tributária de contribuições sociais sobre importação, que tramitou na 1ª Vara Federal de Canoas.

Em resposta ao pedido dos advogados, a entidade arguiu, em sede de preliminar, conexão com o processo 008/1.13.0011129-7, que tramitou também junto à 4ª Vara Cível de Canoas e que acabou extinto sem resolução de mérito pelo juiz Sandro Antonio da Silva. O julgador percebeu que os autores já haviam ajuizado outra ação de arbitramento de honorários, com o mesmo pedido, que tramitou no juízo e foi julgada procedente.

Na sentença, Silva disse que os autores se valeram do processo para enriquecimento ilícito, já que, deliberadamente, ajuizaram duas ações em face da mesma ré com idêntica causa de pedir. E só reconheceram o bis in idem após o encerramento da instrução, da apresentação de memoriais e da comprovação dos fatos pela ré.

‘‘Por via de consequência, condeno-os ao pagamento de multa no montante de 10% e indenização equivalente a 20%, ambos sobre o valor da causa, devidamente atualizado, bem como a ressarcir a parte ré pelas despesas e honorários advocatícios que efetuou para exercer sua defesa nestes autos, com fundamento no artigo 80, incisos III e V, c/com o artigo 81, caput e § 3º, e, ainda, com o artigo 96, primeira parte, todos do Código de Processo Civil. Por fim, expeça-se ofício à OAB/RS para ciência e eventual instauração de procedimento administrativo em desfavor dos advogados constituídos pelos autores’’, determinou naqueles autos.

Como tais fatos vieram à tona na fase de instrução da atual demanda, os autores reconheceram que o objeto de arbitramento de honorários já havia sido satisfeito, manifestando-se pela desistência da ação. A parte ré, entretanto, não concordou com o pedido de desistência.

O juiz Marcelo Lesche Tonet indeferiu o pedido de desistência, acolheu a alegação de litispendência apresentada pela parte ré e declarou extinta a presente ação de arbitramento de honorários advocatícios.

‘‘Assim, como a Ação de Arbitramento de Honorários Advocatícios, Processo nº 008/1.12.0023792-2, já foi julgada, conforme cópia da sentença ora juntada por este Magistrado, bem como que foi postulado o cumprimento provisório da sentença, conforme informação processual ora juntada por este Magistrado, conclui-se pela existência de litispendência entre os Processos.’’

Ele condenou os autores ao pagamento de multa no montante de 10% e indenização equivalente a 20%, ambos sobre o valor da causa, bem como a ressarcir a parte ré pelas despesas e honorários advocatícios que efetuou para exercer sua defesa nestes autos.

‘‘Mero equívoco’’
Tonet destacou que o ajuizamento de ações idênticas não pode ser visto como ‘‘mero equívoco’’, como referido na petição, pois os advogados somente reconheceram a identidade de ações em 5 de julho de 2016, sendo que a presente demanda foi ajuizada em 6 de maio de 2013, ou seja, após mais de três anos.

‘‘Por fim, expeça-se ofício à OAB/RS para ciência e eventual instauração de procedimento administrativo em desfavor dos advogados constituídos pelos autores por meio da procuração da fl. 141, por falta de lealdade e boa-fé, nos termos do artigo 77 do Código de Processo Civil (ou art. 14, II, CPC/1973), se assim entender’’, decidiu.

Os autores entraram com apelação na 16ª Câmara Cível do TJ-RS. Preliminarmente, pediram a desconstituição da sentença, ‘‘eis que eivada de nulidade — ausência de fundamentação’’.

No mérito, sustentaram que não houve má-fé na cobrança duplicada de honorários advocatícios, mas ‘‘mero descuido’’. Com base em tais premissas, pediram o afastamento da condenação a título de litigância de má-fé, bem como o cancelamento de ofício à OAB gaúcha.

Clique aqui para ler a sentença.
Clique aqui para ler o acórdão de apelação.
Clique aqui para ler a decisão que barrou o recurso especial.
Processo 008/1.13.0011187-4 (Comarca de Canoas)

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