Golpe no juiz-robô

França proíbe divulgação de estatísticas sobre decisões judiciais

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5 de junho de 2019, 19h22

A França proibiu a publicação de estatísticas sobre decisões judiciais. A pena para quem divulgar esses dados pode chegar a cinco anos de prisão.

Aline Pinheiro
Objetivo de parlamentares franceses é impedir fraudes no Judiciário.
Aline Pinheiro 

A regra está no artigo 33 da Lei de Reforma do Judiciário, que adiciona dispositivos a outras leis, como o Código Penal. O dispositivo estabelece que "os dados de identidade de magistrados e servidores do Judiciário não podem ser reutilizados com o objetivo ou efeito de avaliar, analisar, comparar ou prever suas práticas profissionais, reais ou supostas".

Segundo o site Artificial Lawyer, magistrados franceses estavam incomodados com empresas que usam inteligência artificial para, com base em dados públicos, analisar como eles costumam decidir e se comportar em determinados assuntos para tentar prever o resultado de julgamentos e compará-los com colegas.

Na prática, a lei proíbe análises de dados relacionados ao Judiciário francês. A mudança foi avalizada pelo Conselho Constitucional da França. A corte considerou que os parlamentares franceses buscaram impedir que a coleta de dados em massa seja usada para pressionar juízes a decidir de determinada forma ou para desenhar estratégias que possam prejudicar o funcionamento do Judiciário.

De acordo com o Conselho Constitucional, essas regras não criam qualquer distinção injustificada entre as partes e não desequilibram a igualdade processual, além de estarem em conformidade com os artigos 6 e 16 da Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão. 

O artigo 6º da declaração estabelece que "a lei é a expressão da vontade geral. Todos os cidadãos têm o direito de concorrer, pessoalmente ou através de mandatários, para a sua formação. Ela deve ser a mesma para todos, seja para proteger, seja para punir. Todos os cidadãos são iguais a seus olhos e igualmente admissíveis a todas as dignidades, lugares e empregos públicos, segundo a sua capacidade e sem outra distinção que não seja a das suas virtudes e dos seus talentos".

Já o artigo 16 determina que "a sociedade em que não esteja assegurada a garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos poderes não tem Constituição".

Norma criticada
A constitucionalista Damares Medina é uma das pioneiras em análise de dados sobre o Judiciário. Ela é cofundadora do Instituto Constituição Aberta, que faz pesquisas empíricas sobre o Supremo Tribunal Federal, e mora na Europa para conclusão de estudos acadêmicos.

Segundo ela, a divulgações de decisões judiciais na Europa é bem mais restrita que no Brasil, onde vigora o princípio da ampla publicidade. Muitas vezes, os nomes de dados pessoais das partes são apagados dos documentos, conta.

Mas Damares critica a regra francesa. "O que surge na França parece ser uma resposta às métricas jurídicas como ferramentas auxiliares da decisão judicial. Proibir a divulgação de dados estatísticos sobre a atividade jurisdicional, que é uma atividade pública, parece medida de quem tem algo a esconder."

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