Garantias do consumo

A defesa do consumidor ganha importância em âmbito internacional

Autor

  • Ana Cândida Muniz Cipriano

    é advogada especialista em Política e Relações Internacionais pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo associada ao Instituto Brasilcon (Brasília) e à International Law Association (Londres) e consultora da Divisão de Concorrência e Proteção ao Consumidor da Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD).

31 de julho de 2019, 8h00

Nos dias 8 e 9 de julho, ocorreu em Genebra, Suíça, a Quarta Reunião do Grupo de Experts em Direito do Consumidor e Política (IGE) das Nações Unidas que está sob o mandato e coordenação da UNCTAD[1] (Conferência das Nações Unidas em Comércio e Desenvolvimento) desde a reforma das Diretrizes das Nações Unidas de Proteção ao Consumidor[2] em 2015. Participaram da Reunião 83 representantes dos 194 membros da Conferência, além de representantes da iniciativa privada, organizações da sociedade civil e acadêmicos perfazendo mais de 350 participantes.

Fazendo referência aos temas-chave da reunião desse ano, a Professora Claudia Lima Marques (UFRGS) proferiu inspirador discurso de abertura abordando as preocupações do consumidor internacional e os desafios para a defesa do consumidor na era do comércio digital, como as “novas vulnerabilidades” no âmbito da saúde e segurança do consumidor, correlacionadas com a proteção de dados.

O tema da sustentabilidade e a importância da participação do consumidor para o cumprimento do Objetivo 12 de Desenvolvimento Sustentável, ODS 12[3], “Consumo e produção responsáveis” foi objeto do painel “Contribution of Consumer Protection to Sustainable Consumption[4], que contou com a participação de diversos experts e acadêmicos, entre eles a Professora brasileira Luciane Klein Vieira (UNISINOS). Panelistas e estados-membros foram unânimes no reconhecimento da relevância da educação para o consumo e na cooperação internacional para alcançar o ODS 12.

Outras duas áreas, também conectadas ao consumo sustentável são objeto de dois grupos de trabalho, os quais tiveram seus mandatos renovados por mais um ano: comércio eletrônico e saúde e segurança. A renovação dos dois grupos de trabalho confirma, não apenas, os interesses dos países membros, mas a preocupação internacional no comércio de produtos online, bem como a segurança de produtos e serviços. Houve consenso entre os membros sobre a relevância de se discutir o futuro da defesa do consumidor na era digital, considerando o impacto de novos produtos e serviços, bem como a cooperação internacional de modo a evitar e a combater a distribuição de produtos que ofereçam risco à saúde e segurança dos consumidores.

A quarta reunião oficial do Grupo Intergovernamental de Expertos em Proteção ao Consumidor e política (IGE Consumidor) também foi palco da apresentação dos resultados da segunda “análise por pares” (peer review) da defesa do consumidor da Indonésia. De acordo com a diretriz 97 (c), o Grupo Intergovernamental de Expertos deve conduzir revisões voluntárias por pares das leis e políticas nacionais de defesa do consumidor dos países membros. Seguindo a agenda provisória adotada pela terceira sessão do Grupo, a quarta sessão considerará a revisão por pares da lei e políticas de proteção ao consumidor da Indonésia[5], da qual o Brasil atuou como um dos revisores. Os próximos candidatos ao peer review serão Peru (2020) e Chile (2021).

A quarta sessão do IGE Consumidor também encorajou os Estados membros a registrar suas melhores práticas ao catálogo virtual da UNCTAD[6] de boas práticas, bem como a participar da pesquisa “Word Consumer Protection Map[7] por meio da qual a UNCTAD faz um mapeamento do status da defesa do consumidor no Mundo, pesquisa a partir da qual serão desenvolvidas políticas, ações e programas em prol da proteção e defesa do consumidor.

Durante a semana do IGE Consumidor, também aconteceu a décima edição da Research Partnership Platform[8] (RPP), Plataforma de pesquisa em concorrência e defesa do consumidor que reúne pesquisadores de instituições de pesquisa, universidades, autoridades de concorrência e sociedade civil. É um espaço onde pesquisadores podem discutir questões atuais na competição e na política de proteção ao consumidor; realizar pesquisas conjuntas com a UNCTAD e compartilhar suas descobertas com seus pares e com as autoridades de defesa da concorrência e do consumidor. Participando pela quarta vez do IGE Consumidor, o Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (BRASILCON) aproveitou a oportunidade para anunciar, durante a RPP, publicação em conjunto com a UNCTAD sobre a implementação das Diretrizes da ONU em defesa do consumidor.

Também foram apresentadas publicações durante o IGE Consumidor como a Revisão voluntária por pares sobre a Lei de Proteção ao Consumidor e a Política da Indonésia, já mencionada, e a versão das Diretrizes da ONU para proteção ao consumidor em sua última versão, disponibilizadas em todas as línguas oficiais da ONU.

Último e importante item da agenda de 2019 foi a discussão dos novos itens para a Agenda Provisória da Oitava Conferência das Nações Unidas para Revisão de Todos os Aspectos do Conjunto de Princípios e Regras Equitativamente Acordados Multilateralmente para o Controle de Práticas Comerciais Restritivas em 2020. Conforme a Sétima Conferência das Nações Unidas para a Revisão de Todos os Aspectos do Conjunto de Princípios e Regras Equitativas Multilateralmente Acordadas para o Controle de Práticas Comerciais Restritivas[9] a Assembleia Geral das Nações Unidas, decidiu criar um grupo intergovernamental de expertos em direito do consumidor e política[10]. Em 2020, quando acontecerá a Oitava Conferência das Nações Unidas para Revisão de Todos os Aspectos do Conjunto de Princípios e Regras Equitativas Multilateralmente Acordadas para o Controle de Práticas Comerciais Restritivas as agendas tanto da Concorrência quanto da Defesa Consumidor serão revistas. As Conferências de Revisão acontecem a cada 5 anos com o objetivo de confirmar a pertinência do mandato da UNCTAD sobre a Concorrência. Considerando o advento do novo mandato em matéria de Defesa do Consumidor e Política, a partir da Revisão das Diretrizes das Nações Unidas para a Proteção do Consumidor em 2015, este mandato também deve ser revisto. Considerando a realização da Conferência de Revisão, em 2020 não acontecerão as reuniões anuais do IGE Concorrência e do IGE Consumidor.

Considerando o significativo número de participantes do IGE Consumidor, o engajamento de membros e a 8ª Conferência de Revisão em 2020, a reunião de 2019 confirmou um mandato forte em matéria do consumidor não apenas pela renovação das agendas dos grupos de trabalho mas ao apoio à proposta de se adicionar um indicador de proteção ao consumidor para os ODS, indicadores 10.4 e 17.4 o qual seria “número de países que adotaram políticas de proteção ao consumidor”, fazendo da defesa do consumidor uma referência no alcance dos Objetivos do Desenvolvimento Sustentável. Por fim, os Novos itens para a agenda da 8ª Conferência de Revisão da ONU em 2020 são indicadores significativos da agenda internacional da defesa do consumidor para os próximos 5 anos: i. Implementação das Diretrizes da ONU para Proteção ao Consumidor; ii. Fortalecimento da proteção do consumidor na economia digital; iii. Cooperação internacional no domínio da aplicação da lei entre as autoridades de defesa do consumidor no comércio electrónico; iv. Melhorar a segurança dos produtos de consumo em todo o mundo: dados para uma boa política; v. Capacitação e assistência técnica e a vi. Revisão voluntária por pares sobre a Lei de Proteção do Consumidor e a Política do Peru.

A quarta reunião do Grupo Intergovernamental de Expertos em Proteção ao Consumidor e Política confirma não apenas a relevância da defesa do consumidor em âmbito internacional, mas a importante tarefa da UNCTAD como detentora do mandato da agenda do consumidor em escala mundial, principalmente como foro que reúne tanto países desenvolvidos como em desenvolvimento, reconhecendo as especificidades e vulnerabilidades dos consumidores de países e regiões menos favorecidas.

[1] UNCTAD, Competition and Consumer Protection Law and Policy Branch

[2] UNGCP 2015

[3] https://nacoesunidas.org/pos2015/ods12/

[4] https://unctad.org/meetings/en/SessionalDocuments/cicplpd17_en.pdf

[5] TD / B / C.I / CPLP / 18/ UNCTAD / DITC / CPLP / 2019/1

[6] https://ccpcatalog.unctad.org

[7] https://unctadwcpm.org

[8] https://unctad.org/en/Pages/MeetingDetails.aspx?meetingid=2207

[9] TD / RBP / CONF.8 / 11, parágrafo 13

[10] A / RES / 70/186, item 7

Autores

  • é advogada, especialista em Política e Relações Internacionais pela Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo. Professora no Curso de Direito da Faculdade Iesplan (Brasília), associada ao Instituto Brasilcon (Brasília) e à International Law Association (Londres).

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