Opinião

Acordo pode pôr fim à insegurança jurídica causada por tabela do frete

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26 de julho de 2019, 15h04

Alguns dias após a Resolução 5.849/2019 da Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT) entrar em vigor, no último sábado (20/7), estabelecendo nova tabela de frete rodoviário, a agência, respondendo a solicitação formal do ministro de Infraestrutura, Tarcísio de Fretas, suspendeu-a. Com a suspensão, voltou a valer a tabela publicada em maio de 2018, através da Resolução 5.820/2018.

Insatisfeitos com os novos preços mínimos, caminhoneiros autônomos começavam a falar em paralisações. Segundo jornais, o descontentamento dos caminhoneiros residiria no fato de o novo cálculo do piso mínimo excluir lucro e pedágio. As lideranças dos caminhoneiros autônomos alegam que, para remunerá-los adequadamente, os valores da Resolução 5.849 precisariam ser ajustados em 30% a 35%.

A metodologia dos novos preços foi desenvolvida pelo Esalq-Log, grupo de pesquisa em logística agroindustrial da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, da USP. E, segundo técnicos da ANTT, é melhor e mais detalhada do que a tabela de 2018.

A tabela de 2018 foi publicada às pressas, para pôr fim à chamada “greve dos caminhoneiros”. A tabela foi autorizada pela Medida Provisória 832, de 27/5/2018, depois convertida na Lei 13.703/2018.

De extensão nacional, e refletindo a dependência do Brasil no modal rodoviário, a greve parou o país por dez dias, com graves consequências para a economia. A Secretaria de Política Econômica do Ministério da Fazenda avalia que a paralisação teve um impacto negativo de cerca de R$ 15,9 bilhões, aproximadamente 0,2% do Produto Interno Bruto (PIB).

Ocorre que a solução para suspender a greve tem tido, ela também, graves consequências para a economia. Em especial, a tabela de preços onera várias cadeias produtivas — e custos mais altos são repassados ao consumidor final.

E não é só. Grandes empresas, especialmente no setor de alimentos, aumentaram suas frotas para baratear o valor do frete. Com isso, a demanda por serviços de transportadoras e caminhoneiros caiu.

A MP 832 nasceu rodeada de insegurança jurídica. Para começar, parece claro que fere os princípios constitucionais da livre-iniciativa e da concorrência. E, ao eliminar a concorrência mediante ajuste ou acordo entre ofertantes, cria uma dinâmica semelhante à de cartel. Isso constitui crime contra a ordem econômica, nos termos da Lei 8.137/1990, artigo 4º, incisos I e II.

A MP 832 resultou em dezenas de ações judiciais interpostas em todo o país. Talvez a mais emblemática delas seja a Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.956/2018 (cuja inicial encontra-se aqui).

Assim que a ADI lhe foi distribuída, o ministro Luiz Fux pediu manifestações de quatro autoridades. A Presidência da República, a ANTT, a Secretaria de Promoção da Produtividade e Advocacia da Concorrência manifestaram-se favoravelmente à MP 832.

A Superintendência-Geral do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) manifestou-se contra, concluindo que “o tabelamento, com o estabelecimento de preços mínimos, não apresenta benefícios ao adequado funcionamento do mercado e ao consumidor final, que arcará com os aumentos de preço decorrentes de tal medida”.

Liminarmente, o ministro Fux decidiu que, até que o mérito da ADI seja julgado, (i) todos os processos judiciais estão suspensos, (ii) a tabela de frete está valendo, e (iii) a ANTT pode aplicar multas contra o descumprimento da tabela.

O ministro Tarcísio, em vídeo filmado em reunião com os caminhoneiros autônomos nesta quarta-feira (24/7) e publicado pela coluna Painel S.A. da Folha de S.Paulo, defende um acordo coletivo entre autônomos, embarcadores e transportadores: "Acordo gera engajamento, gera segurança jurídica. Segurança jurídica para o transporte é o que todo mundo está querendo. Uma coisa é impor a tabela goela abaixo, outra coisa é todo um setor dizer que assinou o acordo", diz ele.

Por ora, o ministro tem se reunido individualmente com representantes de cada grupo. O acordo substituiria a Lei 13.703/2018.

A ADI foi incluída no calendário de julgamento do STF, para 4 de setembro — um ano e três meses depois de ajuizada! Julgada procedente, restariam, ainda, questões sobre o cálculo do frete mínimo, como as levantadas hoje. Julgada improcedente, causaria uma nova onda de protestos dos caminhoneiros, dos quais o transporte no Brasil depende. Diante disso, a possibilidade de acordo é uma luz no fim do túnel.

O ministro Tarcísio é conhecido como negociador habilidoso e problem solver — haja vista o sucesso na retomada de obras importantes que estavam paralisadas, como a Transnordestina. E ele está amparado por um governo legitimamente eleito, o que não era o caso quando da assinatura da MP 832. Com o ministro Tarcísio à frente das negociações, a probabilidade de acordo é, acreditamos, alta — e pode ser concretizada nas próximas semanas.

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