Olhar Econômico

A frota ideal de veículos a serem locados para pessoas com deficiência

Autor

  • João Grandino Rodas

    é sócio do Grandino Rodas Advogados ex-reitor da Universidade de São Paulo (USP) professor titular da Faculdade de Direito da USP mestre em Direito pela Harvard Law School e presidente do Centro de Estudos de Direito Econômico e Social (Cedes).

25 de julho de 2019, 8h10

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O Estatuto da Pessoa com Deficiência (Lei 13.146/2015) vigora desde janeiro de 2016, ao passo que o decreto regulamentador (9.762, de 11 de abril de 2019) acaba de entrar em vigor a 11 de julho. Os artigos 51 e 52 da lei e os artigos 3º e 4º do decreto estabelecem os percentuais de veículos automotores que deverão ser modificados, para compor as frotas de táxi e de locadoras de veículos acessíveis a pessoas com deficiência. Mandou o decreto que, do total da cota exigida pela lei, 1 a cada 20 carros, ou seja, 5% precisariam ser adaptados nesta proporção: 40% para condutores com deficiência e 60% para o transporte de uma pessoa em cadeira de rodas[1]. Verificação perfunctória indica que, muito provavelmente, tais números e percentuais não se sustentam, por falta de fundamentação.

Para que se possa chegar aos contornos ideais da frota de veículos a ser utilizada por pessoas com deficiência, em primeiro lugar é necessário se levantar uma série de dados. Nessa linha, a seguir, verificar-se-ão os números da frota brasileira de automóveis, sua distribuição, os aspectos econômicos do setor automotivo, e a frota de automóveis destinada à locação.

O Brasil é heterogêneo na distribuição da frota de automóveis, havendo significativa concentração na Região Sudeste. Segundo o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran), havia 55.473.965 carros no país em maio deste ano. Comparando com a estimativa populacional do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) para 2018, há no Brasil 208.494.900 pessoas, representando, pois, 1 carro para cada 3,75 habitantes[2].

O estado com maior número de carros é São Paulo, com 17,8 milhões, correspondendo a 33,47% do total do país. Em segundo lugar, Minas Gerais possui 5,9 milhões, 11,15% do total. Em contraste, as menores frotas, proporcionalmente, estão em Roraima, Amapá, Acre, Amazonas, Rondônia, Tocantins, Alagoas, Maranhão, Piauí e Sergipe. Em cada uma dessas unidades da federação, a frota de veículos é inferior a 1% do total.

É mais relevante, entretanto, a relação entre o número de veículos e a população, o que é demonstrado pela tabela abaixo.

Tabela 1: Frota de automóveis nas grandes regiões e unidades da federação (maio de 2019)

A desigual distribuição de veículos nas diferentes regiões é também observada nos 5.570[3] municípios. Os dez municípios brasileiros com maior quantidade de automóveis concentram 1/4 da frota total, sendo nove deles capitais. O primeiro lugar cabe ao município de São Paulo (10,55% da quantidade total de carros), seguido do município do Rio de Janeiro (3,77%).

São os seguintes os municípios com o maior número de carros, em abril de 2018 (Denatran, 2019): São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Curitiba, Goiânia, Porto Alegre, Campinas, Salvador e Fortaleza.

Já os 10 municípios com menor proporção de veículos por habitante são[4]: Itamarati (AM) e Tocantins (AM); Japurá(AM), Uarini (AM) e Afuá (PA); Porto Walter (AC), Juruá (AM) e Chaves (PA); Amaturá (AM), Anamã (AM) e Boa Vista do Ramos (AM); Marechal Thaumaturgo (AC), Anajás (PA) e Santa Cruz do Arari (PA); Uiramutã (RR); Ipixuna (AM), Maraã (AM) e Nhamundá (AM); Jutaí (AM), São Sebastião do Uatumã (AM), Bagre (PA) e Limoeiro do Ajuru (PA); Jordão (AC), Barreirinha (AM), Santo Antônio do Içá (AM), Marajá do Sena (MA) e Meigaço (PA); e Canutama (AM) e Santa Isabel do Rio Negro (AM).

As maiores taxas de automóveis a cada 100 pessoas estão localizadas nas regiões Sudeste e Sul do país.

De acordo com o Ministério da Economia[5], o setor automotivo tem importante participação na estrutura industrial mundial. No Brasil, representa cerca de 22% do PIB industrial. Devido aos seus encadeamentos, é um setor cujo desempenho pode afetar significativamente a produção de vários outros setores industriais.

Fora da cadeia automotiva propriamente dita, destacam-se os setores de aços e derivados, máquinas e equipamentos, materiais eletrônicos, produtos de metal e artigos de borracha e plástico.

Ainda de acordo com o Ministério da Economia, a indústria automobilística brasileira pode ser resumida da seguinte maneira:

  • 31 fabricantes (veículos e máquinas agrícolas e rodoviárias);
  • 67 unidades industriais em 11 estados e 54 municípios;
  • 5.592 concessionárias (2017);
  • 31 fabricantes (veículos e máquinas agrícolas e rodoviárias);
  • 590 fabricantes de autopeças;
  • 5.592 concessionárias (2017);
  • 67 unidades industriais em 11 estados e 54 municípios;
  • capacidade produtiva instalada de 5,05 milhões de unidades de veículos e de 109 mil unidades de máquinas agrícolas e rodoviárias;
  • faturamento (incluindo autopeças), em 2015, de US$ 59,1 bilhões;
  • investimentos, no período 1994-2012, de US$ 68 bilhões;
  • empregos diretos e indiretos totalizando 1,3 milhão de pessoas;
  • participação de 22% no PIB industrial e de 4% no PIB total (2015);
  • geração de US$ 39,7 bilhões de tributos, em 2015, entre IPI, ICMS, PIS, Cofins e IPVA;
  • ranking mundial em 2016: 10º maior produtor e 8º mercado interno.

No ano de 2018, a produção de automóveis no Brasil foi de 2.745.739, representando 70% da indústria automotiva brasileira. Do total, 412.753 foram adquiridos por empresas locadoras de veículos, o que representa 15% de toda a produção nacional. Frise-se que o setor de locação de automóveis é o principal fornecedor para aplicativos de transporte.

A tabela abaixo retrata da distribuição de locadoras por região e em cada unidade da federação.

Tabela 2: Número de locadoras (2018)

É expressivo o número de veículos disponibilizados para locação, sem motorista. O número de locadoras no país atingiu um total de 12.719 (em 2018). Desse total, 1.773 são com motorista (13,9%), e 10.946 (86,1%), sem.

O número de locadoras oferecendo veículos com motorista, quando comparado com o total de locadoras que oferecem veículos sem motorista, é menor em todas as regiões do país. No Brasil, 13,9% das locadoras disponibilizam veículos com motorista. A significativa maioria de 86,1% é de locadoras de veículos sem motorista. No que se refere às locadoras de veículos com motorista, as diferenças regionais não são estatisticamente significativas, variando em, no máximo, três pontos percentuais. A maior proporção está na Região Nordeste, com 15,9% do total de locadoras de veículos com motoristas, e a menor, nas regiões Centro-Oeste e Sudeste, com iguais 12,9%.

No que diz respeito ao total de locadoras de veículos sem motorista, da mesma forma, as diferenças não são relevantes, variando das menores proporções nas regiões Norte e Nordeste, com 84,1%, às maiores, nas regiões Centro-Oeste e Sudeste, com 87,1%.

A formatação da frota ideal de veículos a ser utilizada por pessoas com deficiência depende do exame, além dos dados acima especificados, de outros que serão apresentados oportunamente. Dentre eles, figuram o perfil socioeconômico das pessoas com deficiência, o percentual de condutores com deficiência habilitados e a análise da frota total de veículos destinada à locação avulsa.

Autores

  • é sócio do Grandino Rodas Advogados, ex-reitor da Universidade de São Paulo (USP), professor titular da Faculdade de Direito da USP, mestre em Direito pela Harvard Law School e presidente do Centro de Estudos de Direito Econômico e Social (Cedes).

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