Silêncio eloquente

Dallagnol suspeitava que Moro não investigaria Flávio Bolsonaro, diz Intercept

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21 de julho de 2019, 12h59

Em uma nova etapa das conversas divulgadas neste domingo (21/7) entre o ex-juiz Sergio Moro e os procuradores da "lava jato", é possível perceber que o Ministério Público Federal não tinha dúvidas que o senador Flávio Bolsonaro mantinha um esquema de corrupção em seu gabinete quando foi deputado estadual no Rio de Janeiro. 

Wilson Dias/Agência Brasil
Dallagnol suspeitava que Moro não investigaria Flávio Bolsonaro.
Wilson Dias/Agência Brasil

Nas conversas, o site The Intercept afirma que o procurador Deltan Dallagnol demonstrou uma preocupação: ele temia que Moro não desse continuidade à investigação por pressões políticas do então recém eleito presidente Jair Bolsonaro e pelo desejo do juiz de ser indicado para o Supremo Tribunal Federal. 

Em um trecho das conversas vazadas, segundo o site, Dallagnol se mostrou preocupado com a forma que o ministro da Justiça conduziria o caso, sugerindo que Moro poderia ser leniente com Flávio, seja por limites impostos pelo presidente ou pela intenção de Moro de não pôr em risco sua indicação ao Supremo.

“É óbvio o q aconteceu… E agora, José? Seja como for, o presidente não vai afastar o filho. E se isso tudo acontecer antes de aparecer vaga no Supremo? Agora, o quanto ele vai bancar a pauta Moro Anticorrupcao se o filho dele vai sentir a pauta na pele?”, indaga a outros procuradores em conversas. 

Em outro momento, Deltan conversa em um chat privado com o também procurador Roberson Pozzobon e afirma que  estava relutante em fazer uma condenação mais severa de Flávio por temer as consequências políticas de desagradar o presidente – exatamente como sugeriu que Moro pudesse agir.

Segundo o jornal, no dia 21 de janeiro de 2019, em um grupo, Dallagnol disse ter sido convidado pelo Fantástico, da rede Globo, para uma entrevista sobre foro privilegiado. O procurador afirmou aos colegas que estava ansioso para falar do caso que a produção do programa indicou ser o foco da matéria – denúncias envolvendo o deputado federal Paulo Pimenta, do PT –, mas relutou em aceitar o convite por receio de que tivesse que falar também das tentativas de Flávio Bolsonaro de usar o foro privilegiado para barrar as investigações. 

“Eu não vejo que tenhamos nada a ganhar porque a questão do foro já tá definida.” Na ocasião, outros procuradores concordaram que a melhor opção era rejeitar o convite do Fantástico para evitar o que chamaram de um “bola dividida Flávio Bolsonaro”. 

"Mensalinho"
A reportagem mostra ainda que em outras conversas privadas, procuradores do MPF também comentaram o escândalo envolvendo Flávio Bolsonaro e Queiroz. “Não tenho dúvida de que isso é mensalinho”, escreveu o procurador regional da República Danilo Dias, acrescentando em seguida “No mesmo esquema de Mato Grosso com Silval Barbosa”.

Uma outra procuradora do MPF, Hayssa Kyrie Medeiros Jardim, explicou que o esquema praticado por Flávio era “equivalente ao descoberto na Dama de espadas”.

Em seguida, a procuradora compartilhou um artigo da Tribuna do Norte, publicado no dia 12 de novembro de 2018, que revelava o funcionamento de um esquema similar na Assembleia Legislativa do Rio Grande do Norte. No caso, uma organização criminosa formada por servidores e ex-presidentes da casa realizou desvios milionários por meio de um esquema com funcionários-fantasma.

Investigação
Em janeiro deste ano, o Ministério Público do Rio de Janeiro abriu um procedimento de investigação criminal (PIC) contra Queiroz por conta de movimentações suspeitas de R$ 1,2 milhão pelo ex-assessor em um ano. O salário dele na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj) era de R$ 8,5 mil.

Os dados foram enviados ao MP pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), que é responsável por monitorar todas as transações bancárias do país e que envia alertas a autoridades toda vez que detecta movimentações atípicas.

Segundo o MP, o relatório de inteligência financeira (RIF) remetido pelo Coaf noticia movimentações atípicas tanto de agentes políticos como de servidores públicos da Alerj. No entanto, por cautela, não se teria indicado de imediato na portaria que instaurou o PIC, os nomes dos parlamentares supostamente envolvidos em atividades ilícitas.

No último dia 15, atendendo a um pedido da defesa de Flávio Bolsonaro, o presidente do STF, Dias Toffoli, suspendeu todas as investigações baseadas no compartilhamento de dados por órgãos de controle sem autorização judicial, até que o Supremo se pronuncie definitivamente sobre a prática.

As conversas vazadas fazem de um pacote de mensagens que o Intercept começou a revelar no dia 9 de junho. Os documentos reúnem conversas, fotos, áudios e documentos de procuradores da "lava "jato" compartilhados em vários grupos e chats privados do aplicativo Telegram. 

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