Falta de controle

Mensagens entre Moro e procuradores são atos processuais, diz Okamotto

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19 de julho de 2019, 6h56

As mensagens entre o ex-juiz federal Sergio Moro, hoje ministro da Justiça, e os procuradores que trabalham na "lava jato" são atos processuais. Se não há registro íntegro da totalidade dessas conversas, uma vez que os envolvidos já disseram que elas foram apagadas, não há como controlar esses atos. E isso compromete o devido processo legal e as competências do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, do Superior Tribunal de Justiça e do Supremo Tribunal Federal na operação “lava jato”.

Pablo Valadares/Câmara dos Deputados
Sergio Moro não negou a existência das mensagens, diz Paulo Okamotto
Pablo Valadares/Câmara dos Deputados

Com esse fundamento, o ex-presidente do Instituto Lula Paulo Okamotto pediu, nesta quinta-feira (18/7), que o STJ intime Moro, o procurador Deltan Dallagnol e a 13ª Vara Federal de Curitiba para apresentar celulares e outros dispositivos que contenham as mensagens que vêm sendo reveladas pelo site The Intercept Brasil e outros veículos. Se os arquivos tiverem sido destruídos, o processo do triplex atribuído a Lula no Guarujá e do armazenamento do acervo presidencial do petista deve ser anulado, requereu Okamotto.

Lula foi condenado por Moro a 9 anos e 6 meses de prisão — pena posteriormente aumentada para 12 anos e 1 mês pelo TRF-4. Em abril, a 5ª Turma do STJ reduziu a condenação para 8 anos, 10 meses e 20 dias. Lula e Okamotto foram absolvidos da acusação de lavagem de dinheiro pelo armazenamento do acervo presidencial do petista.

Fatos conhecidos
Na petição, Okamotto, representado pelo criminalista Fernando Augusto Fernandes, afirma que é incontroverso que as mensagens foram trocadas, já que ninguém negou a existência delas.

Segundo Okamotto, Moro apresentou três versões diferentes para tentar se justificar. Primeiro disse não ver "nada de mais" nas menagens. Depois, confessou ter havido "descuido" nas conversas em que ele aparece orientando Deltan a fraudar uma notícia de crime, cobrando resultados das operações e, mais recentemente, orientando as negociações de acordos de delação premiada. Por último, Moro disse que deletou as conversas de seu celular e não tem mais os arquivos.

Já Deltan não disse se tem ou não os arquivos ainda, mas se recusou a entregar o celular para perícia na Polícia Federal. A estratégia dos procuradores da "lava jato" tem sido dizer que não reconhecem a legitimidade das mensagens, embora não neguem a existência nem a autoria delas.

Efeitos
Para Okamotto, as conversas são atos processuais que podem produzir efeitos na ação, ainda que ela já tenha sido julgada. Por isso, elas devem estar sujeitas a controle jurisdicional.

As alegações de Moro de que não guardou as mensagens, segundo o ex-presidente do Instituto Lula, são prova de que atos processuais passaram sem o necessário controle judicial.

Só com confiança sobre os diálogos é possível avaliar se eles afetaram os processos, sustenta. "Diante desse cenário, revela-se a inviabilidade de que o Estado-Juiz admita a persistência de uma situação de dúvida quanto à correção de atos processuais. Com efeito, o próprio não-agir estatal no tocante ao controle jurisdicional dos revelados diálogos constituiria uma escolha, pois implicaria permissão de prosseguimento de processos judiciais sem o saneamento de questão essencialmente central à lisura do exercício da jurisdição."

Crise de incerteza
O Judiciário, conforme Okamotto, deve sanar essa “crise de incerteza”. Caso isso seja impossível, devem ser anulados todos os atos processuais vinculados às mensagens, pela impossibilidade de controle jurisdicional, argumenta, citando decisão do STJ no Habeas Corpus HC 160.662.

"Está evidente o grave déficit de accountability", diz o ex-presidente do Instituto Lula. Afinal, juízes devem ser transparentes e documentar seus atos, exceto em casos de sigilo legal, como determina o artigo 10 do Código de Ética da Magistratura. E Sergio Moro não fez isso com as conversas com procuradores.

Independentemente do conteúdo dos diálogos, o fato de não poder acessar a totalidade deles caracteriza prejuízo à defesa e ao Judiciário (artigo 563 do Código de Processo Penal), sustenta Okamotto.

“Também não há dúvida de que nada do que se passa em relação às mensagens foi causado pela defesa (artigo 565 do CPP). Em especial, é preciso ter acesso ao conteúdo para que se possa decidir, com segurança e serenidade, se tais atos processuais influíram ou não ‘na apuração da verdade substancial ou na decisão da causa’ (artigo 566 do CPP)”.

Anulação do processo
Fernando Fernandes
, advogado de Okamotto, afirmou à ConJur que, se Moro e os procuradores destruíram as mensagens,

“Não estamos tratando ainda de imparcialidade do Sergio Moro, de sua evidente atuação como chefe da ‘lava jato’, envolvendo-se nas delações, atuando em parceria com o MP, em que pese haver material para isso. Tratamos de algo preliminar. Não negaram a existência de diálogos sobre o processo, simplesmente não reconhecem a precisão do divulgado e atacam a ilegalidade na obtenção. Como são verdadeiros atos processuais cabe ao juízo fazer registrar nos autos os diálogos escritos para os fins de contraditório, mas acima de tudo, para os fins revisão pelos tribunais superiores. Estamos pedindo a intimação do juízo, assim como do ex-juiz e dos procuradores para que juntem aos autos material preservado para perícia. Cumprindo o material deve ser periciado e aberta vista as partes. Se as autoridades destruíram os diálogos é caso de anulação e apuração de responsabilidades”, disse o criminalista.

Clique aqui para ler a petição.

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