Sem excepcionalidade

Toffoli deixa de julgar HC de torturado por militares durante intervenção no Rio

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18 de julho de 2019, 16h49

Por entender que não é caso de atuação excepcional do presidente do Supremo Tribunal Federal durante o recesso, o ministro Dias Toffoli deixou nesta quarta-feira (17/7) de julgar pedido de liminar em Habeas Corpus de um homem torturado por militares do Exército durante a intervenção federal no Rio de Janeiro, em 2018. O presidente do STF encaminhou o processo ao relator, ministro Alexandre de Moraes.

Tânia Rêgo/Agência Brasil
Após ser preso por militares, homem sofreu diversas lesões corporais.
Tânia Rêgo/Agência Brasil

Em agosto do ano passado, o mototaxista Marcos Vinicius do Nascimento foi preso em flagrante no complexo de favelas da Penha, na zona norte do Rio. Isso por supostamente estar com uma mochila com drogas e munições. Os militares que o detiveram disseram que, durante perseguição e tiroteio, viram três sujeitos se desfazendo de mochilas e, em outro ponto da comunidade, encontraram três pessoas – incluindo Nascimento – escondidas, sem nada. Ao voltar pelo caminho de onde vieram, integrantes do Exército encontraram mochilas, embora não tenham apontado o que havia em cada uma, nem qual delas o acusado supostamente portava.

Em audiência de custódia, Nascimento afirmou que foi torturado enquanto esteve sob poder dos militares. Ele disse ter levado uma facada na mão, três tiros de borracha, socos no rosto e nas costas. Por isso, confessou que era o dono de uma mochila. O juiz ressaltou que ele estava lesionado, informação que foi confirmada por laudo médico.

A Defensoria Pública do Rio pediu o relaxamento da prisão em flagrante de Nascimento. Mas o requerimento foi negado, com o argumento de que, em liberdade, ele ameaçaria a paz social, já que é acusado de crime grave. O juiz também destacou que o suspeito não apresentou comprovante de residência nem de ocupação lícita. Portanto, solto, poderia colocar em risco a instrução criminal e a regular aplicação da lei penal em caso de condenação, avaliou o julgador.

O Tribunal de Justiça fluminense negou pedido de Habeas Corpus da Defensoria. A 7ª Câmara Criminal afirmou que os ferimentos de Nascimento são evidentes e fortes indícios de tortura, mas não comprometem a prisão em flagrante. O Superior Tribunal de Justiça também negou o pedido. Os ministros alegaram que, para avaliar se a prisão cautelar e a ação penal são ilegais, seria preciso reexaminar provas, o que não pode ser feito em HC.

Provas pré-constituídas
A Defensoria então impetrou HC ao Supremo. Conforme a entidade, não se trata de reexame de provas, pois estas já estão pré-constituídas. Afinal, o fato de Marcos Vinícius do Nascimento ter sido apresentado em audiência de custódia com lesões corporais é “absolutamente incontroverso”, disse a entidade, citando os laudos que comprovam os machucados.

“Não se pleiteia, aqui, que o tribunal revolva provas, mas sim que se limite a olhar fotografias juntadas à presente impetração – das fotografias, pode-se ver que Marcos Vinicius apresentava ferimentos.”

Para a Defensoria, os tribunais estão aplicando a presunção de inocência em favor dos militares – que não são parte do processo – para justificar a prisão cautelar do réu. No entanto, não estão assegurando tal garantia a Nascimento, ao presumirem que a acusação contra ele é verdadeira – se foi preso em flagrante, é perigoso e deve ser mantido encarcerado.

"Tendo ato inconstitucional, anticonvencional e ilegal sido praticado por ocasião da captura ou da detenção do paciente, tem-se que a forma pela qual estas foram praticadas foi inconstitucional, anticonvencional e ilegal, e, então, a prisão em flagrante (ato complexo) torna-se, ela própria, também inconstitucional, anticonvencional e ilegal. Independentemente do momento exato em que ocorreu a tortura, certo é que se deu durante a prisão em flagrante, isto é, antes da audiência de custódia, ocasião em que foi ela convertida em preventiva. Assim, havendo vício na forma pela qual se deu a prisão em flagrante, por antijuridicidade ocorrida em um de seus momentos, é a prisão em flagrante antijurídica", sustenta a Defensoria.

A entidade pediu a libertação de Nascimento e que sua confissão informal não tenha valor de prova no processo.

Confiança no STF
À ConJur, o defensor público Pedro Paulo Lourival Carriello, que atua no caso, disse ter confiança que o Supremo irá conceder HC a Nascimento e mostrar a seu repúdio à tortura.

"A Defensoria tem ainda certeza que o STF vai conceder essa liberdade de um paciente vítima de tortura. Afinal, será a corte constitucional afirmando: tortura, nem antes nem durante o regime democrático."

Clique aqui para ler a íntegra do pedido de HC.
HC 173.456

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