Notícia distorcida

Por associar desembargadora à mulher de Cabral, jornal pagará R$ 120 mil

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9 de julho de 2019, 15h44

Veículo que não se limita a reproduzir notícia de outro veículo, mas a altera de forma a distorcer a informação abusa da liberdade de imprensa. Com esse entendimento, a 23ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro manteve sentença que condenou o Jornal da Cidade Online e seu editor, José Pinheiro Tolentino Filho, a indenizarem a desembargadora Inês da Trindade Chaves de Melo em R$ 120 mil reais.

Fernando Frazão/Agência Brasil
Adriana Ancelmo foi condenada por lavagem de dinheiro na "lava jato".
Fernando Frazão/Agência Brasil

A reportagem que motivou a ação por danos morais incluía a desembargadora numa cota de influência da ex-primeira dama do Rio Adriana Ancelmo, que é advogada e já foi condenada por lavagem de dinheiro. Inês seria indicada por Adriana para o cargo em troca de favorecer seus interesses no tribunal. Adriana é mulher do ex-governador Sérgio Cabral (MDB), que já foi condenado a quase 200 anos de prisão na operação “lava jato”.

Na ação, a desembargadora, representada pelos advogados Eduardo Biondi e Fernando Orotavo Neto, disse que nunca teve contato com Adriana Ancelmo e foi nomeada ao TJ-RJ por antiguidade. É juíza de carreira desde 1980 e chegou à corte em 2010. Segundo Inês, a promoção por antiguidade "ultrapassa as competências do Poder Executivo".

Em sua defesa, o veículo argumentou que apenas reproduziu informação divulgada pelo jornal Folha de S.Paulo de que o raio de influência de Adriana Ancelmo no TJ-RJ era de 90 desembargadores. E, assim que tomou conhecimento sobre o equívoco das informações, publicou nota corrigindo o erro, sem intenção de ofender a honra da desembargadora ou dos demais magistrados citados pela Folha.

O relator do caso, desembargador Antonio Carlos Arrabida Paes, disse que a notícia do Jornal da Cidade Online não é mera releitura da matéria da Folha. “A publicação teve seu título modificado – induzindo o leitor a entender que a matéria se refere a magistrados que fazem parte da ‘cota’ de uma mulher que responde, juntamente com seu marido, a incontáveis crimes ligados à corrupção que varreu a administração estadual”.

Para Arrabida Paes, além de a notícia ser falsa, é gravíssima a associação do nome da desembargadora ao de Adriana Ancelmo e Sergio Cabral, pois passa a impressão de que ela estava envolvida no esquema de corrupção comandado pelo ex-governador.

“Para os leitores, todos os magistrados que integram a lista que faz parte da matéria são, de alguma forma, parte daquele esquema de corrupção comandado por Sérgio Cabral, sua mulher, alguns secretários e empresários, que levou o estado do Rio de Janeiro à ruína, fazendo com que milhares de pessoas perdessem seus empregos, milhares de empresas fechassem suas portas, milhares de servidores públicos ficassem sem seus salários e proventos e, certamente, centenas ou milhares de cidadãos morressem nas filas dos hospitais sem atendimento”, apontou o desembargador.

O relator ainda afirmou que a notícia falsa é mais grave por atingir a credibilidade de uma magistrada. “As dúvidas sobre a licitude de um julgador alcançam toda a sua atividade profissional, já que dúvidas acerca de sua integridade moral e honestidade irão repercutir negativamente tanto em julgamentos futuros, como naqueles em que tenha participado.”

Os advogados Eduardo Biondi e Fernando Orotavo Neto disseram à ConJur que a liberdade de imprensa não permite a publicação de notícias falsas. “Há de ser livre a imprensa, mas com respeito à reputação das pessoas. Uma coisa é informar; outra, bem diferente, é divulgar notícias mentirosas, do Oiapoque ao Chuí, visando enxovalhar a honra alheia, para vender jornal e ganhar um tutuzinho. Ninguém está acima da lei, tampouco a imprensa.”

Processo 0180782-04.2017.8.19.0001

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