Opinião

Justiça mantém incorporadoras no RET até a venda de todos os imóveis

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8 de julho de 2019, 6h49

A Justiça Federal do Paraná julgou favoravelmente aos contribuintes um dos primeiros processos do país em que se discute a aplicação do Regime Especial de Tributação (RET) para as receitas decorrentes das vendas de unidades imobiliárias feitas após a conclusão da respectiva edificação.

Desde 2004, as incorporadoras podem se beneficiar do RET instituído pela Lei 10.931, que consiste no pagamento unificado de tributos federais (IRPJ, CSL, PIS e Cofins), por meio da aplicação de uma alíquota única incidente sobre a receita mensal recebida pelas incorporadoras com a venda das unidades imobiliárias que compõem as incorporações. A referida alíquota única do RET atualmente é de 1% para projetos do programa Minha Casa, Minha vida e de 4% para os demais empreendimentos.

O referido regime foi instituído em um momento de grave crise de credibilidade do setor, despertada pelo emblemático “caso Encol”, oportunidade em que o governo federal se viu obrigado a buscar alternativas para proteger os consumidores e evitar que outros adquirentes de imóveis sofressem os mesmos prejuízos que sofreram os clientes com a falência da gigante do setor de construção.

Neste contexto, decidiu-se estimular a utilização de um instituto que já estava há muito previsto na legislação brasileira, mas que não era usualmente utilizado pelas empresas de incorporação, e que seria capaz de trazer de volta a confiabilidade pretendida pelo governo federal: o chamado patrimônio de afetação.

Assim, para poder fruir dos benefícios do RET, as incorporadoras são obrigadas a constituir um patrimônio de afetação do terreno e das acessões objeto da incorporação imobiliária. Esse instituto está previsto na Lei 4.591/64, em seu artigo 31-A e seguintes, e consiste, basicamente, em manter o objeto da incorporação imobiliária apartado, sem que se comunique com o restante do patrimônio do incorporador.

A concessão do regime especial de tributação, inclusive com a redução da alíquota geral de 6% para 4% ocorrida em 2013, objetivava aumentar o volume de empreendimentos, gerando uma série de empregos e auxiliando no crescimento do setor que ainda sente fortemente os efeitos da grave crise financeira que assola o Brasil.

Por muitos anos, as incorporadoras permaneceram utilizando o benefício do RET até que finalizadas as vendas de todas as unidades imobiliárias decorrentes da incorporação objeto do regime de afetação. Tal conduta baseou-se em manifestações que foram apresentadas pela própria Receita Federal, em especial a Solução de Consulta DISIT/SRRF07 7.045/15.

Contudo, as empresas foram surpreendidas com o teor da Solução de Consulta Cosit 99.001/18, de caráter vinculante para todos os contribuintes, que revogou a Solução de Consulta 7.045/2015, fixando o entendimento de que: “Não se submetem ao RET as receitas decorrentes das vendas de unidades imobiliárias realizadas após a conclusão da respectiva edificação”.

O reflexo do posicionamento da Receita Federal é o imediato e inesperado aumento da carga tributária das incorporações, na medida em que a receitas das vendas realizadas após a construção passaram a se sujeitar ao regime de tributação normal, muito superior ao previsto no RET.

Após a alteração do entendimento da Receita, duas empresas incorporadoras localizadas no Paraná, inconformadas com a mudança repentina de entendimento, propuseram ação judicial demonstrando que a essência do RET é beneficiar todos os lados da relação obrigacional: (i) os consumidores, com a efetiva redução do preço dos imóveis e o acesso à tão desejada moradia, além da segurança da entrega do imóvel ao final da construção; (ii) as incorporadoras, com a simplificação da tributação e a redução da carga tributária válida para todas as unidades construídas, independente do momento de alienação; e (iii) o próprio país, com a movimentação da economia decorrente da venda dos imóveis e da geração de milhares de empregos.

Além disso, demonstraram que é equivocada a premissa da Receita Federal de que, com o término da construção, o patrimônio de afetação estaria extinto e não estariam mais preenchidos os requisitos para fruição do RET, pelo fato de que, na maioria esmagadora dos casos, o patrimônio de afetação permanece ativo após a obtenção do Certificado de Vistoria de Conclusão de Obras (CVCO).

Analisando o caso, a Justiça Federal do Paraná acaba de proferir sentença favorável garantindo o direito das empresas de permanecer no RET até a venda das unidades do empreendimento imobiliário — e não somente até a conclusão da obra, afastando o entendimento ilegal adotado na Solução de Consulta Cosit 99.001/18.

Segundo entendimento do juiz de primeiro grau, “não se extingue, portanto, a afetação com a extinção da incorporação, isto é, com a criação das unidades autônomas do empreendimento imobiliário, mas com a efetiva venda das unidades autônomas aos adquirentes”.

Trata-se de importante precedente, sendo que a expectativa é que tal entendimento se mantenha nas instâncias superiores, uma vez que a interpretação mais adequada da legislação sobre o tema é aplicar o RET desde o início da construção até a conclusão das vendas de todas as unidades imobiliárias.

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