Prerrogativas da classe

"Direito de defesa está preservado, mas a aplicação tem sido comprometida"

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12 de janeiro de 2019, 8h00

O direito de defesa não está enfraquecido. O problema, de acordo com o recém-eleito presidente da Ordem dos Advogados do Brasil de Alagoas, Nivaldo Barbosa Jr., é a garantia de sua aplicação, que tem sido comprometida por questões estruturais da máquina judiciária, junto de uma cultura de condenação antecipada, motivada principalmente por clamor da sociedade pela celeridade.

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No estado, diz Nivaldo, as principais prerrogativas desrespeitadas estão relacionadas à visita do advogado ao cliente, à demora na tramitação de processos e também ao atendimento de juízes e desembargadores. 

Crítico da decisão que manda as OABs prestarem contas ao Tribunal de Contas da União, o advogado afirma que isso não seria uma problema no estado. A OAB-AL, diz, "já é uma instituição que tem sua contas aprovadas com louvor. Mas há um lado negativo nessa questão, que é a perda de autonomia da Ordem dos Advogados do Brasil".

Questionado acerca da opinião polêmica do presidente Jair Bolsonaro (PSL) sobre o fim do exame de Ordem, o advogado, disse que o presidente “deveria se comprometer em combater o uso político do MEC que tem patrocinado ao longo dos últimos anos um verdadeiro estelionato educacional ao autorizar o funcionamento de faculdades de direito sem qualificação”.

Nivaldo Barbosa Jr. atuava na presidência da Caixa de Assistência do Advogado de Alagoas quando foi eleito presidente da seccional com 3.240 votos. Sua chapa levou como conselheira federal a ex-presidente da OAB-AL Fernanda Marinela de Sousa Santos.

Leia a entrevista:

ConJur  — Quais os principais gargalos da advocacia no seu estado?
Nivaldo Barbosa —
Os grandes desafios da atualidade da advocacia voltam-se principalmente para o mercado de trabalho, para a preservação dos honorários, para a demora na prestação jurisdicional e para a defesa das prerrogativas. São demandas complexas e que exigem soluções sistemáticas, a médio e longo prazo. A união da advocacia e muito trabalho poderão superar esses problemas.

ConJur  — O Tribunal de Contas da União decidiu, em novembro, que a OAB deve prestar contas ao tribunal. Como o senhor avalia a medida?
Nivaldo Barbosa —
A OAB-AL já é uma instituição que tem sua contas aprovadas com louvor e, por isso, não teríamos problema algum em termos nossas contas avaliadas pelo TCU. Mas há um lado negativo nessa questão, que é a perda de autonomia da Ordem dos Advogados do Brasil. Somos uma instituição fortalecida e independente, de modo que prestar contas ao TCU pode comprometer nossa autonomia. De qualquer modo, para a OAB de Alagoas, isso não seria problema, porque atualmente somos referência no país em transparência.

ConJur  — Quais as principais prerrogativas desrespeitadas hoje?
Nivaldo Barbosa —  
Nossa Diretoria de Prerrogativas – pioneira no Brasil – atua diuturnamente para combater as violações em Alagoas. Aqui, nossos principais casos são relacionados à visita do advogado ao seu cliente (seja detido em presídios e delegacias), a esperar horas para ser atendido por juízes e desembargadores, além da demora na tramitação de processos. Nos últimos anos, a comissão já representou um desembargador e três juízes. A Comissão das Prerrogativas tem atuado 24 horas em todo o Estado. Vamos defender as prerrogativas em qualquer lugar que o advogado for desrespeitado.

ConJur  — O direito de defesa está enfraquecido?
Nivaldo Barbosa —
O direito de defesa não está enfraquecido. O problema hoje é a garantia de sua aplicação, seja por uma questão estrutural da máquina judiciária, seja por uma cultura de condenação antecipada, motivada principalmente por uma sociedade que clama por uma justiça célere. Ou seja, o direito de defesa está preservado, mas a aplicação tem sido comprometida.

ConJur  — A OAB deve se colocar politicamente a favor do direito de defesa?
Nivaldo Barbosa —
Não se trata de política, mas sim de preservar as garantias previstas na Constituição Federal e essa é uma missão da OAB, já que este é um dos direitos lá resguardados. A OAB deve sim prezar pela legalidade, pelo estado democrático de direito, pelo processo legal, pela cidadania e, consequentemente, pelo direito de defesa.

ConJur  — A OAB é democrática internamente?
Nivaldo Barbosa — Nos últimos anos, a OAB-AL confirmou seu compromisso com a democracia. Na gestão de 2013/2015, por exemplo, durante a gestão de Thiago Bomfim, convidamos pessoas que fizeram oposição para ministrarem cursos na Escola Superior de Advocacia (ESA). Na gestão seguinte, de Fernanda Marinela, período de 2016/2018, essa democratização foi ampliada. São mais de 500 advogadas e advogados integrando comissões. O advogado jovem, assim que faz o juramento, é convidado para participar das comissões. Outrossim, o presidente está disponível quase que 24 horas para os advogados.

Além do número de seu celular ser público, também há um aplicativo onde o profissional pode enviar mensagens para o presidente ou para todos os outros os diretores. E eu me comprometo a dar continuidade a esse trabalho, até porque já agregamos colegas que anteriormente foram oposição a nossa chapa. A OAB não pode ser administrada apenas para quem apoiou a chapa durante a eleição. É preciso desmontar os palanques e governar em favor da sociedade e, sobretudo, para toda a advocacia alagoana.

ConJur  — O que o senhor espera do superministério da Justiça?
Nivaldo Barbosa —
Espero que o ministro Sérgio Moro faça um excelente trabalho em prol da sociedade brasileira. É um nome que ganhou notoriedade nos últimos anos e a população brasileira deposita muita esperança em sua atuação, agora, no Governo Federal.

ConJur  — Qual o piso ideal para um iniciante?  
Nivaldo Barbosa —
O piso remuneratório da advocacia sofre diversas influências diretas, tais como a capacidade do mercado, a qualificação profissional e o custo operacional. Tudo isso oscila de Estado a Estado, e até mesmo entre as regiões de cada Estado. A nossa ideia, portanto, é fazer um estudo criterioso para, em seguida, propor um piso remuneratório digno em Alagoas.

ConJur  — Recentemente, o presidente Jair Bolsonaro se manifestou contra o Exame de Ordem aplicado aos recém-formados. Na ocasião, ele disse que o exame cria “boys de luxo de escritórios de advocacia”. Em sua opinião, o modelo do exame precisa ser revisto? A quem cabe fiscalizar o curso de Direito?
Nivaldo Barbosa —
O presidente demonstrou total desconhecimento a respeito do Exame da Ordem. A advocacia não se curvará. É preciso respeito para que se possa dialogar. O Exame de Ordem é um importante meio para aferir a qualidade do ensino do Direito, adotado em inúmeros países, como Estados Unidos e Japão e em praticamente toda a Europa. O exame tem como objetivo preservar a sociedade de profissionais que não detenham conhecimento suficiente para garantir o resguardo de direitos fundamentais. O presidente deveria se comprometer em combater o uso político do MEC, que tem patrocinado ao longo dos últimos anos um verdadeiro estelionato educacional ao autorizar o funcionamento de faculdades de direito sem qualificação.

ConJur  — O senhor é a favor de segundo turno nas eleições da OAB? O Conselho Seccional deve ser eleito separadamente da chapa do presidente?
Nivaldo Barbosa —
O número de profissionais não justifica a realização de segundo turno nas nossas eleições. Defender o segundo turno nas eleições da OAB serviria somente para aumentar a rivalidade, o desgaste e, principalmente, os gastos. Também não vejo sentido realizar eleição separada para a escolha do Presidente e para o Conselho Seccional. Isso iria inflacionar sobremaneira o custo da eleição. Na verdade, o voto deve ser no grupo, na chapa e não apenas no presidente. Quando uma chapa é montada, pensamos naqueles que comungam da mesma ideia, que têm um propósito em comum.

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Esta entrevista integra uma série de conversas com os presidentes das seccionais da OAB eleitos para o triênio 2019-2021.

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