Opinião

Comentários sobre o projeto do governo para reformas da lei penal

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7 de fevereiro de 2019, 17h34

*Este texto é a introdução a uma versão maior do trabalho sobre o "projeto de lei anticrime" do governo. Clique aqui para ler a versão completa.

O intitulado “Projeto de lei anticrime” pretende uma grande reforma da legislação penal brasileira. Trata-se de uma ofensiva punitivista autoritária que se oculta no rótulo de uma suposta eficiência da justiça criminal. A lógica que informa todas as alterações propostas nesse projeto é suprimir direitos fundamentais e garantias individuais como medida de segurança pública.

O objetivo declarado de “estabelecer medidas contra a corrupção, o crime organizado e os crimes praticados com grave violência à pessoa” não passa de um jogo retórico de aparências que pretende disfarçar a essência do projeto: legitimação da violência policial, intensificação do encarceramento em massa e recrudescimento do poder penal contra as classes populares e contra a resistência democrática.

No documento disponibilizado pelo Ministério da Justiça, as propostas foram agrupadas em dezenove medidas, que serão submetidas ao Congresso Nacional visando à alteração de quatorze leis em temas de direito penal, processo penal, execução penal e improbidade administrativa.

Logo no título, percebe-se o déficit cognitivo, o populismo penal e a falta de comprometimento com o pensamento criminológico e as ciências criminais. Por óbvio, todo crime só existe como violação à lei. Então falar em “lei anticrime” é de uma estupidez tamanha que, além de pressupor a existência de alguma legislação a favor do crime, só se justifica em razão do apelo comercial de mais uma mercadoria destinada ao espetáculo penal.

Talvez por isso o Ministro da Justiça tenha anunciado que “busca efeitos práticos, não para agradar professores de direito, de processo penal”. Naturalmente, é pouco provável que qualquer professor que se dedique às ciências criminais defenda prisão e violência policial como medidas para reduzir a criminalidade. O projeto de lei em questão certamente irá agradar muito pouco aqueles que tenham mínimo conhecimento criminológico e de segurança pública, pois sabemos que tais medidas contribuirão apenas para o fortalecimento da criminalização da pobreza e a intensificação da criminalização da resistência democrática.

Para fins didáticos neste breve estudo, agrupamos as medidas apresentadas no “Projeto de lei anticrime” em oito grupos: (1) violência policial, (2) risco de criminalização dos movimentos sociais, partidos políticos, grupos empresariais e sindicatos, (3) encarceramento em massa, (4) plea bargain, (5) técnicas autoritárias de investigação, (6) confisco e (7) impunidade dos corruptos amigos. Longe da pretensão de exaurir o tema, buscamos apenas compilar as propostas e traçar possíveis consequências a partir de uma primeira leitura do projeto.

Antecipando-se a eventuais críticas, o Ministro Sérgio Fernando Moro fez questão de se defender antes mesmo de qualquer provocação. Na coletiva de imprensa de lançamento do seu projeto, declarou que “isso não é autoritarismo, não é fascismo”. Também afirmou que tinha um álibi: “Vocês vão ouvir críticas de advogados e especialistas, mas temos um bom álibi que é o Código Italiano”. Nessas breves linhas, tentaremos identificar possíveis razões por trás da preocupação confessada pelo ministro na busca de um “bom álibi” para afastar a imagem autoritária e fascista das reformas propostas.

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