A cargo do relator

STF torna facultativa transcrição integral de interceptações telefônicas

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6 de fevereiro de 2019, 16h58

A degravação de arquivos de interceptação telefônica só será integral se o relator assim o definir. Assim entendeu o Supremo Tribunal Federal, nesta quarta-feira (6/2), na primeira sessão plenária do ano. O colegiado discutiu se seria preciso estabelecer que todo áudio de grampo tivesse, obrigatoriamente, que ser degravado. Prevaleceu o entendimento de que não há necessidade.

Os ministros decidiram corrigir ementa de acórdão proferido na ação penal na qual o ex-deputado federal Sebastião Bala Rocha (PSDB-AP) conseguiu, em 2013, o direito à degravação integral das interceptações telefônicas. Por maioria de sete votos, os ministros entenderam que o texto anterior não espelhou fielmente o conteúdo do acórdão. Assim, os ministros refizeram o texto para a seguinte redação:

"Não é necessária a degravação integral das conversas oriundas de interceptações telefônicas, bastando a degravação dos excertos que originaram a denúncia e a disponibilização do conteúdo integral das interceptações telefônicas realizadas. Caso o relator entenda necessário, poderá determinar a degravação integral das interceptações telefônicas promovidas".

O ministro Luiz Edson Fachin abriu a divergência ao voto do relator, ministro Marco Aurélio. De acordo com ele, a ementa não representava a síntese dos votos de 2013. “Se se reputar por entender obrigatória sempre a degravação, isso reflete com toda a coerência o entendimento do relator. Mas determinar que é sempre obrigatória pode não refletir os votos vencedores no conjunto”, apontou Fachin.

No caso em questão, em 2013, o STF confirmou, também por maioria, a decisão do ministro Marco Aurélio que garantiu ao parlamentar o direito à transcrição integral das interceptações telefônicas feitas na ação penal que respondia por suposta prática de corrupção e formação de quadrilha. Diante do acórdão, o MPF apresentou agravo regimental pedindo revisão da redação da ementa.

O pedido foi negado por Marco Aurélio. O MPF impetrou, então, novo recurso, levando o caso ao Plenário. De acordo com o MPF, o texto não representava o que fora decidido pela maioria, “omitindo, assim, ao fim e ao cabo, o entendimento do Plenário do Supremo Tribunal Federal' no sentido de que a transcrição integral das escutas telefônicas não é uma providência obrigatória.”

Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski, Celso de Mello e Dias Toffoli votaram pela manutenção da decisão do relator. Para eles, não havia obscuridade na decisão que justificasse um agravo. “Queria manifestar minha perplexidade nesta questão. A decisão da AP 508 não contém erro, obscuridade, contradição. É unívoca. Em nenhum momento o relator disse que seria necessário a gravação integral dos dados da interceptação telefônica”, disse Lewandowski.

O decano, ministro Celso de Mello, ressalvou ainda que tem sustentado reiteradas vezes que se exija a derivação completa das interceptações. “O material bruto deve ser sempre colocado à disposição, notadamente aquele que sofre persecução do Estado. Entendo inaceitável proceder a transcrição seletiva”, afirmou Celso de Mello. O decano afirmou que, para além do entendimento ter o “beneplácito de autores eminentes”, está previsto no Estatuto das Interceptações Telefônicas.

O presidente Dias Toffoli acrescentou que o relator havia determinado a transcrição e o MP se insurgiu contra ela. “A maioria assim o determinou. Passou-se o prazo do embargo, veio petição, nega-se que houve erro material, porque não há incongruência. Acompanho o relator”, afirmou. Marco Aurélio interveio. “A petição foi um gancho para se rediscutir a matéria, já que não havia mais prazo processual”, apontou.

A discussão ficou acalorada no momento em que os ministros definiam a nova redação. O ministro Luís Roberto Barroso afirmou que a ementa tinha, de fato, ambiguidade. O texto dizia que “a degravação consubstancia formalidade essencial a que os dados alvo da interceptação sejam considerados como prova”. “Não estamos inovando em nada, apenas acrescentando à proposição já existente um esclarecimento”, disse.

Lewandowski afirmou que, com a sugestão dada, poderiam criar “uma ambiguidade dentro da ambiguidade”. “Se eu amanhã determinar a degravação integral e vem uma parte, possivelmente o MP, e puxa esse acórdão e diz que o Plenário assim decidiu, de que não haveria necessidade da integralidade, vai estar ambíguo”, disse. O ministro afirmou, ainda, que mesmo os ministros com votos vencidos poderiam participar da definição do novo texto, “senão é a ditadura da maioria, e aqui temos construído teses em consenso”.

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