Retrospectiva 2019

Em dezembro, lei cria ‘juiz das garantias’ e aumenta tempo máximo de prisão

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31 de dezembro de 2019, 18h03

Quando já parecia não caber novidades em 2019, o presidente Jair Bolsonaro resolveu surpreender em plena véspera de Natal, sancionando a Lei 13.964/2019, norma apelidada de “pacote anticrime”, que reforma o Código Penal e o Código de Processo Penal. Aprovado pelo Congresso, o texto sofreu 25 vetos. A Casa Civil sugeriu um número maior: 38. 

ConJur
Indigesto, o ministro da Justiça, Sergio Moro, fez uma pausa na ceia e tuitou contra a criação do juiz das garantias, parte do texto que mais contrariou o ex-magistrado. “Apesar do juiz de garantias, há avanços”, disse. Entre outros pontos, a lei também elevou a pena máxima de prisão no Brasil de 30 para 40 anos e trouxe novos limites para a delação premiada. 

O trecho que desagradou Moro é o que cria um juiz apenas para supervisionar e presidir as investigações, como forma de garantir que os direitos dos investigados e dos réus sejam respeitados durante essa fase pré-processual. A parte processual, de recebimento da denúncia e sentença, fica a cargo de outro juiz. 

Entre os pontos vetados, está o que propunha o aumento de pena para homicídios cometidos com armas de uso controlado ou restrito. Para o governo, a medida poderia fazer com que agentes de segurança pública fossem "severamente processados ou condenados criminalmente no exercício de suas funções".

O governo também vetou trecho sobre a audiência de custódia. O artigo obrigava a apresentação dos presos em flagrante a um juiz de garantias em até 24 horas. Para o governo, a medida poderia acarretar em custos para o erário, já que proíbe a audiência de custódia por videoconferência e obrigaria juízes a viajar para receber os presos, "em ofensa à garantia da razoável duração do processo".

Veja as principais notícias do mês na coluna Resumo da Semana:

14/12 – Criminalização do ICMS declarado e não pago foi destaque
21/12 – Fixação de tese sobre criminalização de ICMS não pago foi destaque
28/12Sanção presidencial da lei "anticrime" foi destaque

Indulto
Também foi destaque o decreto que determina a extinção da pena de policiais que tenham sido condenados por crime culposo ou excesso culposo, legítima defesa e estrito cumprimento de dever legal ou exercício regular de direito. 

Fábio Rodrigues Pozzebom / Agência Brasil
Decreto de Bolsonaro que determina indulto para agentes de segurança pública foi destaque
Fábio Rodrigues Pozzebom / Agência Brasil

O indulto vale para agentes de segurança pública que tenham sido condenados por ato cometido, mesmo que fora do serviço, diante de risco decorrente de sua condição funcional ou em razão de seu dever de agir. 

Especialistas ouvidos pela ConJur afirmam, no entanto, que Bolsonaro não pode arbitrariamente selecionar certas categorias profissionais para indultar. Ou ele extingue a pena de todos os condenados por crimes ou excesso culposo ou estará violando a Constituição. 

ICMS
Veio do campo tributário, e no apagar das luzes de 2019, a decisão do Supremo Tribunal Federal que mais chocou a comunidade dos criminalistas. Em dezembro, o tribunal equiparou o não pagamento de ICMS próprio declarado ao crime de apropriação indébita. 

No entendimento da corte, foi um reforço ao combate à sonegação e ao “enriquecimento às custas do Estado”, conforme declarou o ministro Luiz Fux. Mas para especialistas no tema ouvidos pela ConJur, a medida representa uma “distopia jurídica” e um “um retrocesso sem precedentes”.

A decisão foi considerada negativa porque acaba permitindo a prisão por dívida, o que só era possível em casos envolvendo o não pagamento de pensão alimentícia. 

Entrevista do mês
Em entrevista à ConJur, o advogado Cristiano Zanin, responsável pela defesa do ex-presidente Lula, afirmou que o “modelo de processo baseado em delações impede o verdadeiro combate à corrupção”. 

Spacca
“Os acordos são assinados para confirmar as teses acusatórias, e não para revelar o que aconteceu e mostrar o caminho para se chegar aos responsáveis”, diz o advogado. Ainda de acordo com ele, o modelo de força-tarefa alimentado por delações não serve à realização de descobertas genuínas. 

“O MPF ignora o parágrafo 16 do artigo 4, que diz que ninguém pode ser condenado com base exclusivamente em delações. A própria lei estabelece uma presunção de que o delator mente, mas inúmeras sentenças da “lava jato” partem de depoimentos de delatores”, diz.

Veja outras entrevistas de dezembro:

* Rodrigo Maia, presidente da Câmara: Estado não pode existir só para defender interesse de si próprio, diz Rodrigo Maia

* José Eduardo Gussem, procurador-geral de Justiça do Rio de Janeiro: Coaf não violou lei ao enviar dados de Flávio Bolsonaro ao MP-RJ

* Fernando Santiago, advogado e especialista em proteção de dados: Manipular a informação é "elemento essencial" para se manter o poder

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