Juiz imparcial

"Pacote anticrime" acaba com decretação de preventiva de ofício

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27 de dezembro de 2019, 13h01

Com a nova Lei 13.926/2019, apelidada pelo governo de “pacote anticrime”, os juízes não podem mais decretar prisões preventivas de ofício. Só poderão fazê-lo a requerimento do Ministério Público, do assistente de acusação ou “por representação da autoridade policial”.

É que a lei, sancionada na quarta-feira (25/12), retirou a expressão “de ofício” do artigo 311 do Código de Processo Penal. Ficou, então, a seguinte redação: “Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial”.

Mudança singela, mas substanciosa, em relação à redação anterior: “Em qualquer fase da investigação policial ou do processo penal, caberá a prisão preventiva decretada pelo juiz, de ofício, se no curso da ação penal, ou a requerimento do Ministério Público, do querelante ou do assistente, ou por representação da autoridade policial”.

A alteração é bem-vinda, comenta o professor da PUC do Rio Grande do Sul Aury Lopes Jr, doutor em Processo Penal. Segundo ele, é uma reforma em direção ao sistema acusatório descrito na Constituição Federal de 1988, em oposição ao sistema inquisitorial da redação original do Código Penal, de 1941.

Isso quer dizer que o processo deve garantir a ampla defesa ao réu e que as provas de culpa têm de ser levadas pela acusação — não é o acusado que tem de provar que é inocente. E ao juiz cabe uma posição equidistante em relação às partes.

“O novo artigo 311 corrige um erro histórico que era permitir que o juiz decretasse a prisão preventiva de ofício, no curso do processo. Agora, prisão de ofício, nem pensar”, afirma Lopes Jr.

O advogado Luís Henrique Machado concorda. Para ele, “foi um avanço importante”. “O juiz não pode agir como se parte fosse. Passa-se, com a alteração, a respeitar o princípio acusatório, fundamental para o equilíbrio do processo”, afirma.

Liberdade de ofício
Aury Lopes Jr se antecipa às críticas de que a “lei anticrime” não mexeu no artigo 316 do CPP, que permite ao juiz revogar a preventiva de ofício. “Incoerência nenhuma”, responde o professor.

“Nesse caso, a lei permite ao juiz, quando se depara com uma ilegalidade ou vê que a situação que motivava a preventiva já não existe mais, mande soltar o réu ou investigado”, explica. “O juiz manter alguém preso além do tempo necessário ou fora da necessidade é uma ilegalidade, até abuso de autoridade.”

Mas Luís Henrique Machado chama atenção para uma alteração importante no 316: o acréscimo de um parágrafo único ao artigo. Pelo novo dispositivo, o juiz deverá avaliar a necessidade da continuação da preventiva a cada 90 dias. Se, numa dessas avaliações, considerar que a prisão não é mais necessária, deve decretar a soltura do preso.

“Extremamente importante essa alteração”, afirma o advogado. “O controle da preventiva passa a ser muito mais rígido, evitando o alongamento desnecessário da prisão.”

Juiz investigador
Embora comemore os avanços, Aury Lopes Jr critica as reformas pontuais no CPP feitas pela “lei anticrime”. “Reformas pontuais resultam em colchas de retalhos”, diz ele.

Um desses retalhos que sobraram foi o artigo 156 do CPP. Ele permite que o juiz, de ofício, determine diligências ou a produção de provas.

“Isso é um absurdo, é um erro. Não condiz com o sistema acusatório.”

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