Opinião

Debêntures são ferramenta de investimento em companhias fechadas

Autor

  • Brunno Arnone

    é advogado de venture capital fusões e aquisições Direito Societário e contratos comerciais no Machado Nunes bacharel pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e pós-graduado em Direito Empresarial pelo Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper).

26 de dezembro de 2019, 6h33

Em razão das atuais políticas econômico-liberais capitaneadas pelo Ministério da Economia, cujo intuito é promover um ecossistema financeiro mais amistoso aos investidores e mais saudável ao desenvolvimento das empresas brasileiras, faz-se relevante verificar alguns dos mecanismos de investimento existentes na prática empresarial.

Entre estes mecanismos, um dos que mais se destaca é a debênture, sendo este instrumento já amplamente difundido no mercado aberto e cada vez mais usual em investimentos em sociedades de capital fechado.

As debêntures são valores mobiliários, representativos de dívida, emitidos por sociedades anônimas, que asseguram aos seus detentores direito de crédito contra a referida sociedade anônima.

Isso significa que as debêntures são papéis (no jargão do mercado financeiro) que representam um empréstimo que o debenturista (pessoa que adquiriu a debênture) tem contra a sociedade anônima que a emitiu. Em contrapartida a este empréstimo, o debenturista pode fazer jus a remuneração, a conversão destes papéis em participação societária, entre outros.

Quando da emissão das debêntures, a assembleia geral delibera sobre as condições e direitos inerentes a estas, como por exemplo, preço, prazo, remuneração, enfim, qualquer disposição que seja relevante para a sociedade e que ajude na atratividade de investidores, devendo tais direitos constarem na escritura de debêntures, sendo este o documento fundamental que as rege.

Uma vez subscritas as debêntures, os seus detentores passam a fazer jus aos direitos determinados na escritura. Todavia, no que diz respeito a atração de investimentos, há três espécies de direitos que merecem destaque.

A primeira, como é de se esperar, diz respeito à remuneração das debêntures, que por ser um título de dívida, pode assegurar ao debenturista juros, direito de participação nos lucros da sociedade ou até mesmo prêmio de reembolso.

No primeiro caso, a sociedade pode remunerar o debenturista quando da ocorrência do vencimento, amortização ou resgate da debênture, ou, ainda, durante o prazo de vigência da debênture.

Por sua vez, o direito de participação nos lucros concede ao debenturista uma parcela dos lucros da sociedade. Ainda há a possibilidade se instituir prêmio de reembolso, sendo esta uma remuneração paga pela sociedade quando do resgate, vencimento ou amortização da debênture. Ressalte-se que as formas de remuneração podem ser cumuladas entre si, de modo a contribuir para a atratividade das debêntures.

O segundo direito relevante que queremos tratar é sobre a conversibilidade em ações. Esta condição determina que a debênture pode vir a ser convertida em ações da sociedade que a emitiu. Neste caso a escritura de debêntures deve prever as bases de conversão de debêntures em ações, a espécie e classe das ações a serem convertidas, os prazos e formas de conversão.

No caso da escritura de debêntures prever esse tipo de direito, é concedido por lei aos acionistas da sociedade a preferência na integralização destas debêntures. Além disso, é garantido aos debenturistas o direito de veto sobre deliberações que visem alterar o objeto social da sociedade e sobre a criação ou modificação dos direitos referentes a ações preferenciais existentes, caso esta alteração venha a influenciar os direitos das ações decorrentes da conversão das debêntures.

O último direito, que julgamos de maior relevância para a determinação da adoção de debêntures como ferramenta de investimento, diz respeito às garantias as quais as debêntures são sujeitas, quais sejam (i) garantia real; (ii) garantia flutuante; além da (iii) debênture quirografária e da (iv) debênture subordinada.

Nas duas primeiras hipóteses previstas acima, a debênture é garantida por ativos da sociedade, de modo que no primeiro caso o bem dado em garantia é um bem determinado dentre os ativos na sociedade, e no segundo caso a garantia é assegurada de modo genérico entre os ativos da sociedade, de modo que a garantia não recai sobre um ativo específico. Na existência dessas garantias, as escrituras de debêntures podem contar com cláusula de vedação à sociedade em alienar ou onerar os bens dados em garantia.

Nos dois últimos casos, quais sejam debêntures quirografárias e subordinadas, não há propriamente uma garantia, sendo que, no caso das debêntures quirografárias, o “benefício” dado ao debenturista é de que na hipótese de liquidação e/ou falência da sociedade, o pagamento das remunerações referentes às debêntures deve ser realizado em conjunto com os credores quirografários da sociedade ou bens. Por sua vez, as debêntures subordinadas tem como único benefício, receber as remunerações referentes às debêntures apenas antes dos próprios acionistas da sociedade, em eventual liquidação da companhia.

Para fazer valer os direitos dos debenturistas, é assegurado a estes o direito de se organizar em assembleia de debenturistas, que faz as vezes de um órgão cujo o fim é deliberar sobre os direitos e interesses dos debenturistas.

É importante ressaltar que a emissão de debêntures é expressamente autorizada apenas pelas sociedades anônimas, mas ressalta-se que quando da revisão pela Comissão Mista da Medida Provisória 881/2019 (que veio a se tornar a Lei da Liberdade Econômica), houve proposta no sentido de autorizar expressamente a sua emissão por sociedades limitadas, contudo, tal proposta não foi aprovada pela Câmara dos Deputados.

Tal veto, a nosso ver, não acompanhou o espírito da MP 881/19, de modo que o Legislativo perdeu uma oportunidade de regulamentar uma forma de investimento que, na prática, já é utilizada no dia a dia das sociedades sob outras formas.

Diante disso, é evidente o caráter mais formal e rígido das debêntures, em comparação a outros instrumentos utilizados em investimentos particulares, como por exemplo, quando comparadas os contratos de mútuo conversível. Ainda assim, as debêntures se revelam um valioso instrumento para investimentos privados, especialmente em razão da redução de riscos jurídicos que ela proporciona aos debenturistas.

Por fim, cabe enfatizar que a despeito da rigidez referente ao investimento em debêntures, o seu uso tem sido cada vez mais difundido, não apenas em sociedades anônimas de grande porte, mas sobretudo em startups em estágios mais avançados de maturidade, que após receberem rodadas de investimento de seed money, viram a necessidade de buscar maior controle sob seus níveis de endividamento e de seu cap table, de modo que estas vêm encontrando nas debêntures um instrumento prático para recebimento de novos investimentos.

Diante de tais movimentos de mercado podemos concluir que as debêntures podem ser uma valiosa ferramenta para a obtenção de investimentos privados, sendo assim, é sempre fundamental a consulta a um advogado especialista para a determinação do melhor meio de captar investimento para sua empresa.

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    é advogado de venture capital, fusões e aquisições, Direito Societário e contratos comerciais no Machado Nunes, bacharel pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e pós-graduado em Direito Empresarial pelo Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper).

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