Opinião

Como diminuir o valor de condenações trabalhistas quanto a juros e correção

Autor

  • Luiz Calixto Sandes

    é advogado trabalhista sócio regional em São Paulo do escritório Kincaid | Mendes Vianna Advogados mestre em Direito e professor universitário.

22 de dezembro de 2019, 6h02

Mesmo após a edição da Medida Provisória 905/19, que resolveu a discussão que envolvia a aplicação da TR ou do IPCA para a correção dos créditos trabalhistas, permanece o exercício e esforço por parte das empresas, para tornar essa contabilização mais justa.

Num exercício básico de matemática simples, mesmo com a aplicação do IPCA-E, os créditos trabalhistas ficaram um pouco menos agressivos para as empresas, com a utilização dos juros da caderneta de poupança. Mesmo assim, nos parece que os valores que envolvem ações trabalhistas, por vezes, são bastante injustos para o empregador por impingir a ele uma responsabilidade sem que ele tenha dado causa ao dano, aqui, demora. Nasce, assim, a necessidade de revisitar a legislação com o fim de buscar uma solução.

O artigo 240, parágrafo 3º, do Código de Processo Civil, que cuida da regulamentação da comunicação dos atos processuais, afirma que “a parte não será prejudicada pela demora imputável exclusivamente ao serviço judiciário”. Refere-se o referido artigo às hipóteses em que o judiciário excede os prazos a ele destinados nos cumprimentos dos atos processuais. É importante é esclarecer que não há correspondência deste enunciado no código anterior, (1973), o que reforça o compromisso do legislador infraconstitucional com as garantias constitucionais.

Nesta esteira, seguem os compromissos dos tribunais em geral, assim como do Conselho Nacional de Justiça com a entrega célere da prestação jurisdicional, dados que vem sendo compartilhados, constantemente, com a sociedade em geral.

Há muito a doutrina entendia que os prazos a serem cumpridos pelo judiciário eram classificados como impróprios, ou seja, prazos que, se desrespeitados, não gerariam qualquer consequência ao processo.

A Emenda Constitucional 45/2004, que alterou o artigo 5º da Constituição Federal, acrescentou o inciso LXXVIII, que institui que “a todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.” Assim, o referido inciso, integrante do rol dos direitos fundamentais passou a estabelecer, como garantia, a duração razoável do processo.

Tal norma, aliada a já legal posição do juiz como sujeito do processo (artigo 139, II, do CPC), amparada pela teoria publicista, que erige o processo a status de instrumento público da jurisdição, fez cair por terra a ideia de que os prazos a serem cumpridos pelo Judiciário pudessem continuar a ser classificados como impróprios.

Nesta mesma construção ideológica e conceitual, amparado no direito fundamental à duração razoável do processo, o CPC, em seus artigos 4º e 6ª, também assegura às partes a celeridade. Entretanto, como em sede de legislação infraconstitucional, o seu enquadramento se dá como princípio geral do processo. O mesmo artigo 6º traz, ainda, o novel princípio da cooperação, de observância obrigatória pelo juiz, porque sujeito do processo (artigo 139, II, do CPC).

O CPC em seu artigo 8º, que também possui status de princípio informador do processo, justificando ainda mais a sua legalidade, afirma que é dever do juiz, no exercício da judicatura, atender aos fins sociais, a exigência do bem comum; observar a proporcionalidade, razoabilidade, legalidade e a eficiência.

Nos dias atuais, portanto, é impossível admitir a ideia de que o judiciário, possuindo o dever de cumprir prazos estipulados pela lei possa transcendê-los, sem que isso cause prejuízo às partes, ao processo e a própria atividade jurisdicional.

Meramente à guisa de exemplo, o Código de Processo Penal, em seus artigos 801 e 802, ainda penaliza o juiz e o Ministério Público, se responsáveis pelo retardamento da entrega da prestação jurisdicional.

O não cumprimento dos prazos pelo Judiciário, antes classificados como impróprios, além de violar garantias constitucionais e princípios informadores da Teoria Geral do Processo, onera às partes. Em relação ao devedor o prejuízo é ainda maior porque financeiro, já que no período cujos prazos foram ultrapassados, na liquidação de eventual crédito trabalhista, serão contabilizados juros e correção monetária. É a hipótese de responsabilidade sem culpa.

Assim, com vistas a não responsabilizar às partes pela transcendência dos prazos, quando da sentença que resolver o mérito julgando pedidos procedentes, a liquidação deve ser procedida na modalidade de arbitramento, nos termos do artigo 879, caput e parágrafo 6º, da CLT.

A condição para a sua realização, instituída no parágrafo 6º do referido artigo, se justifica com o fim da constitucional, legal e necessária observância do artigo 240, parágrafo 3º, do CPC, de perfeita e harmoniosa aplicação na fase executiva no processo laboral.

Em relação a possibilidade de aplicação do artigo 240, parágrafo 3º, por ausência de normatização própria, as regras inerentes aos princípios do processo comum que não colidem com os princípios do processo laboral são de perfeita assunção, nos termos do artigo 769 da CLT.

Não menos importante é entender que, no processo comum, as normas que regulam o processo cognitivo se aplicam na fase ou no processo executivo, conforme a natureza do título, como se extrai dos artigos 771, parágrafo único; 802; 841, parágrafo 4º; 876, parágrafo 1º, III e parágrafo 2º; 915, caput e parágrafo 3º; 917, parágrafo 7º e 921, I, todos do CPC, ficando ultrapassada eventual discussão sobre aplicação subsidiária das normas processuais em fases diferentes (conhecimento e execução).

Finalmente, ainda em relação a desoneração do crédito trabalhista pela desconsideração desses prazos impróprios não cumpridos pelo judiciário, é infundada a assertiva de que o referido dispositivo legal não se aplicaria, considerando que a aplicação de juros e correções monetárias seguiriam normas próprias (Lei 8.177/91 – artigo 39 e artigo 879, parágrafo 7º, da CLT).

Em relação aos juros, a Lei 8.177/91, em seu artigo 39, parágrafo 1º, estabelece que: “Aos débitos trabalhistas […] serão acrescidos de juros de mora equivalentes ao índice aplicado à caderneta de poupança, a partir da data do ajuizamento da reclamatória e aplicados pro rata die […]”. Portanto, ao contrário do que já vi sustentarem quando do enfrentamento desta tese, o referido dispositivo não afirma que os juros serão contabilizados desde o ajuizamento da ação mas, a partir de. Por isso, o objetivo do dispositivo foi estabelecer o índice e o marco temporal inicial de sua incidência. Não se vê, por isso, nenhuma incongruência na aplicação de ambos os dispositivos, de forma concomitante, excluindo os juros do período processual onde foram extrapolados os prazos impróprios considerando que, em relação a esse período, a empresa não teria dado causa ao dano (demora), ainda que o recurso seja seu, por decorrer de faculdade de manejo estabelecida pela legislação.

Em relação a correção monetária, estabelece a CLT em seu artigo 879, parágrafo 7º: “A atualização dos créditos […] será feita pela variação do IPCA-E, […], que deverá ser aplicado de forma uniforme por todo o prazo decorrido entre a condenação e o cumprimento da sentença.” Alguns desdobramentos são necessários para melhor explicação.

Aqui, estabeleceu a lei, que o início da incidência da correção monetária seria a condenação. Desta forma, o marco inicial para contabilização da correção é quando da condenação. Nesta esteira, por exemplo, nos casos em que a condenação na sentença for parcial, a correção contará da sentença, em relação aos títulos deferidos. Em havendo recurso da parte do empregado, tendo provimento, os títulos inseridos à condenação pelo acórdão terão marco inicial diverso da sentença. Ainda no exemplo, a mesma sorte segue a condenação imposta por acórdão no TST.

Em relação a exclusão da extrapolação dos prazos impróprios, a lei foi bastante imprecisa uma vez que dela consta que a correção será contabilizada desde a condenação até o cumprimento da sentença, não até a satisfação do crédito. O desacerto da redação repousa no fato de que o cumprimento de sentença é uma fase do processo que se desdobra em vários atos processuais que podem chegar, segundo CNJ[1], ao prazo de 33 meses. Assim, o termo “por todo o prazo decorrido entre a condenação e o cumprimento da sentença” teria qual marco temporal final, já que a lei não trata do termo quando da satisfação do crédito (artigo 924, II do CPC)?

A solução repousa na harmonização da norma, que busca um tratamento mais justo e equânime para às partes. Desta forma, não seria desarrazoado que, ante a indefinição do momento processual da fase do cumprimento de sentença, que o termo final da incidência da correção que seja aplicada em todo o seu curso, sem computar os prazos impróprios exorbitados.

Chega-se à conclusão de que, desde o advento do Código de Processo Civil de 2015, houve alteração conceitual da natureza dos prazos até então tidos como impróprios, não mais podendo as partes serem prejudicadas pela demora do judiciário na prática de atos processuais, que ultrapassem os prazos legalmente estipulados.

Assim, todos os prazos impróprios sobrepujados no curso do processo (artigo 226 do CPC), não devem ser considerados para a contabilização de juros e correção monetária pois, cada um com termo inicial de acordo com a sua regulamentação pois, do contrário, teria efeito de causar prejuízo excessivo à parte pela demora imputável exclusivamente ao poder judiciário.

[1] Tribunal Superior do Trabalho: http://www.tst.jus.br/web/estatistica/tst/prazos, acesso em 06/11/2019 às 12:00.

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