Caridade de lado

Deltan tira filantropia de contratos de palestras e arrecada ao menos R$ 580 mil

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23 de agosto de 2019, 16h04

Os contratos das palestras remuneradas do coordenador da força-tarefa da “lava jato”, Deltan Dallagnol, passaram por mudanças para deixar de ter a filantropia como o principal destino dos valores recebidos.

Divulgação/Ascom PR-SP
O coordenador da "lava jato" em Curitiba, procurador federal Deltan Dallagnol
Ascom/PR-SP

Segundo documentos obtidos pelo site The Intercept Brasil e analisados em parceria com a  Folha de S. Paulo, o procurador federal também passou a focar no meio empresarial e arrecadou ao menos R$ 580 mil a partir de 2017.

Conforme as informações apuradas pelos dois veículos, as mensagens, planilhas, recibos e contratos que circularam nas conversas entre procuradores contrastam com os argumentos apresentados por Dallagnol à Corregedoria do Ministério Público em junho de 2017. Na ocasião, a reclamação disciplinar contra ele foi arquivada.

A lista de empresas que contrataram Deltan reúne companhias do mercado financeiro, associações industriais e comerciais e a operadora de planos de saúde Unimed. O procurador recebeu valores entre R$ 10 mil e R$ 35 mil por palestra.

Em nota, Dallagnol afirma que, na soma de 2016 a 2018, destinou a maior parte dos valores para atividade beneficente ou ações anticorrupção, incluindo uma reserva de R$ 184 mil que mantém em aplicação financeira e que ele diz planejar para essa última finalidade.

O procurador, porém, não comenta as mudanças ocorridas especificamente após 2017.

Segundo Deltan, até 2016 a maior parte dos valores recebidos com palestras foi doada ao Hospital Oncopediátrico Erasto Gaertner, de Curitiba. Na época, a instituição confirmou o recebimento de R$ 219 mil. No mesmo ofício, ele revela que a partir daquele ano, os contratos de suas palestras não têm mais repasse automático para entidades filantrópicas.

“Em 2017, após descontado o valor de 10% para despesas pessoais e os tributos, os valores das palestras sobre corrupção e ética em grandes eventos estão sendo destinados, até hoje, a um fundo que será empregado, ao tempo oportuno, em despesas ou custos decorrentes da atuação de servidores públicos em operações de combate à corrupção, tal como a Operação Lava Jato, para o custeio de iniciativas contra a corrupção e a impunidade, ou ainda para iniciativas que objetivam promover, em geral, a cidadania e a ética”, diz a manifestação.

Segundo a Folha, as mensagens e papeis examinados não foi encontrado nenhuma menção ou registro de altos valores de contribuições para caridade por parte de Deltan desde 2017. Um dos documentos analisados faz menção ao fundo citado pelo procurador em sua defesa. Os contratos de 2018 e 2019, por sua vez, não previam esse tipo de destinação.

Uma das contratantes mais frequentes das palestras de Deltan é a Unimed. O procurador palestrou para as Unimeds Central, Santa Catarina, Porto Alegre, Presidente Prudente (SP) e Assis (SP).

Deltan chegou a pedir para ser contratado para fazer uma palestra em Salvador pois deseja ir à capital baiana promover uma campanha. A demanda foi feita a Fernanda Cunha, dona da Star Palestras, em julho de 2018.

“Fernanda, será que a Unimed Salvador não quer me contratar pra uma palestra na semana de 24 de setembro?”, escreveu o procurador. A promotora de eventos perguntou se o procurador tinha alguma viagem marcada para a cidade naquele dia. “É que não tenho nada relevante em Salvador e queria ir pra lá pra espalhar a campanha. Como Vc (sic) sempre tem contatos na Unimed, pensei que podia ser uma boa”, explicou o procurador.

Segundo o jornal, as mensagens verificadas revelam que o procurador receava que detalhes sobre suas palestras pudessem levar à descoberta de situações embaraçosas e consequentemente promover questionamentos legais e críticas.

“Tenho pensado se devo soltar os nomes dos tomadores, mas o pessoal da FT acha que não, pq vão fuçar para dizer que um diretor da entidade tem isso ou aquilo, que o médico vinculado àquela unimed tá procesado por sonegação ou isso ou aquilo… acham que quanto mais ficar dando corda, pior será”, afirmou o procurador em conversa com um assessor do MP.

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