"Erosão da democracia"

Deputados dos EUA questionam governo sobre ajuda a "lava jato"

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20 de agosto de 2019, 21h02

Um grupo de deputados norte-americanos do Partido Democrata quer saber a extensão – ou nível de cumplicidade – do envolvimento do Departamento de Justiça dos Estados Unidos na operação “lava jato”. No documento, os parlamentares perguntam ao procurador-geral dos EUA, William Barr, se o governo americano tinha conhecimento das relações ilegais mantidas pelo ex-juiz Sergio Moro e os procuradores da “lava jato” e se teve alguma participação em “procedimentos judiciais ilegais”.

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Deputados democratas querem saber se agentes do DoJ foram cúmplices da "lava jato" no Brasil
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“Embora reconheçamos o trabalho do DoJ com sistemas judiciais internacionais, queremos garantir que as atividades do DoJ no Brasil não encorajaram nenhuma forma de má conduta por parte das autoridades judiciais brasileiras ou apoiado procedimentos judiciais que violem princípios éticos básicos”, diz a carta.

No documento, os deputados formulam uma série de perguntas a William Barr. Entre elas, qual foi o envolvimento de agentes do DoJ com o ex-juiz Sergio Moro, procuradores ou outros servidores do sistema de justiça. Ou como, diante dos bilhões de dólares lavados e enviados para fora do Brasil, nenhum banco foi sequer citado nas investigações — veja abaixo todas as perguntas.

A missiva se reporta a notícias de que agentes do DoJ ajudaram os procuradores da “lava jato” na busca por provas, e registra a preocupação dos deputados com a possibilidade do envolvimento de agentes públicos americanos com os “indícios de irregularidade e parcialidade que corromperam a operação”.

Os deputados se referem às mensagens e Telegram vazadas pelo site The Intercept Brasil que mostram relações próximas entre o ex-juiz Sergio Moro e os procuradores da “lava jato”. E mostram as articulações para pôr de pé um projeto de poder tocado pelos protagonistas da operação.

“Colaborações estratégicas entre juízes e procuradoras em atividades jurisdicionais politicamente motivadas são, no mínimo, flagrantes violações da ética judicial básica. No máximo, a trágica erosão da democracia”, afirma a carta.

Não são palavras vãs. A “lava jato” inaugurou um novo capítulo na relação entre o Ministério Público Federal brasileiro e o DoJ. Antes dela, os procuradores até reclamavam do procedimento burocrático que deve ser seguido para o intercâmbio de provas.

Com a “lava jato”, inaugurou-se a relação informal, em que os procuradores passaram a se conhecer pessoalmente e trocar documentos e provas por mensagens de celular ou por meio de pedidos pessoais.

Essas relações já vinham sendo motivo de preocupação, por causa do potencial de anular ações penais que elas trazem embutidas. Durante as investigações do mensalão, por exemplo, a Procuradoria-Geral da República enviou o então procurador Eugênio Aragão aos EUA para pedir para seus colegas do DoJ pararem de enviar provas a investigadores brasileiros sem passar pelos trâmites legais.

Anos depois, a CPI da Petrobras descobriu que delegados e agentes da Polícia Federal criaram um canal direto de envio de cópias de extratos de contas telefônicas com funcionários da canadense Research in Motion, empresa que fabricava os celulares BlackBerry.

Os deputados americanos também se mostram preocupados com o caso do ex-presidente Lula. As reportagens do Intercept, agora em parceria com outros veículos, confirmam, diz a carta, as ações de Moro e dos procuradores da “lava jato” para condenar o ex-presidente e mantê-lo fora das eleições de 2018. “Deveria ser de grande preocupação do DOJ que o ex-presidente não teve direito a um julgamento justo”, afirma a carta.

O documento é assinado pelos deputados Hank Johnson Jr, Raúl Grijalva, Jared Huffman, Adriano Espaillat, Deb Halland, Ilhan Omar, Emanuel Cleaver II, Susan Wild, Eleanor Holmes Norton, Veronica Escobar, Mark Pocan, Chuy García e Ro Kahna. O procurador-geral Barr tem até 30 de setembro para responder.

Clique aqui para ler a carta, em inglês

Veja as perguntas feitas pelos deputados ao DoJ:

Que critérios tiveram que ser atendidos para que o DoJ apoiasse um grupo específico de agentes judiciais ou investigadores no Brasil e outros países?

Os agentes do DoJ garantem que certos critérios legais são atendidos por agentes judiciais e entidades estrangeiras com os quais trabalham? Se sim, quais?

Descreva o envolvimento do DoJ na operação “lava jato”. O que levou o DoJ a trabalhar nessa investigação em particular?

Que formas de apoio o DoJ ofereceu, ou oferece, a agentes brasileiros envolvidos na operação

O DoJ apoiou a investigação de instituições financeiras brasileiras e estrangeiras envolvidas na “lava jato”? Qual é a explicação para o fato de que poucos, ou nenhum, executivos de instituições financeiras foram processados durante a “lava jato”, apesar das centenas de milhares de dólares de vantagens ilícitas lavadas?

Descreva o todo o alcance do envolvimento do DoJ com o juiz Sergio Moro, incluindo apoio técnico, compartilhamento de informação ou qualquer apoio fornecido por contratados pelo DoJ.

Descreva todo o alcance do envolvimento do DoJ com procuradores ou outros agentes judiciais envolvidos com a força-tarefa da “lava jato”, incluindo apoio técnico, compartilhamento de informação ou qualquer apoio fornecido por contratados pelo DoJ.

Os agentes do DoJ estavam cientes das ações conspiratórias envolvendo Moro e os procuradores da “lava jato” ou de qualquer conduta antiética desses indivíduos?

Os agentes do DoJ continuaram envolvidos com Moro depois de claros sinais de má conduta, como o grampo ilegal da conversa do ex-presidente Lula com a ex-presidente Dilma Roussef no início de 2016?

O DoJ ajudou na coleta ou análise de informações coletadas pela força-tarefa da “lava jato” e pelo juiz Sergio Moro no caso de Lula?

Os agentes do DoJ entraram em contato com Moro, com os procuradores ou com pessoas envolvidas com a força-tarefa da “lava jato” por meio de canais informais?

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