Opinião

Veja projetos que pretendem alterar a Lei dos Crimes Hediondos

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2 de agosto de 2019, 16h11

Spacca
Quarta-feira, 25 de julho de 1990. Do Iraque, Saddam Hussein ameaçava invadir o Kuwait — um mês depois, ocorreu o início da Guerra do Golfo. Em terras brasileiras, cantores sertanejos disputavam espaço. Enquanto isso, em Brasília, Fernando Collor, ainda presidente da República, assinava a Lei dos Crimes Hediondos.

A Lei 8.072 foi uma resposta à extorsão mediante sequestro, delito da “moda” nos anos 90. Na justificativa do projeto, o senador Odacir Soares não deixa dúvida de que o delito era o alvo da nova lei. Vale lembrar que, um ano antes, em 1989, ocorreu o sequestro do empresário Abílio Diniz, fato que repercutiu nas eleições presidenciais, quando um dos criminosos foi fotografado com a camiseta de um partido político.

Desde então, a Lei dos Crimes Hediondos permanece como resposta aos crimes de grande repercussão. Em 1994, o homicídio qualificado e o praticado em atividade típica de grupo de extermínio foram incluídos à lei — reflexo do homicídio da atriz Daniella Perez, em 1992, e das chacinas da Candelária e de Vigário Geral, em 1993. Quatro anos depois, em 1998, foi incluído à lei o delito de falsificação de medicamentos, em razão do escândalo das “pílulas de farinha”. Em 2007, novas alterações, após a morte do menino João Hélio.

Sabendo dessa tendência, de uso da Lei dos Crimes Hediondos como resposta às manchetes dos jornais, antes de fazer a pesquisa por novos projetos, tentei imaginar o que encontraria. Pensei em Sobradinho, com centenas de mortos, e nos escândalos de corrupção. Por essa razão, não fui pego de surpresa com o PL 570/19, da deputada federal Joenia Wapichana (Rede-RR), que pretende incluir os danos ambientais que afetem gravemente ecossistemas no rol dos delitos hediondos.

Entretanto, errei em minha análise. Embora, agora, pareça óbvio, não consegui prever a grande quantidade de projetos de lei para a inclusão, no rol dos delitos hediondos, de crimes praticados contra crianças e adolescentes. De fato, com a ascensão da internet, o volume de notícias de delitos contra vítimas com menos de 18 anos — principalmente de natureza sexual — aumentou muito.

No PL 4.161, o deputado federal Otaci Nascimento (Solidariedade-RR) pretende tornar hediondo o homicídio simples, quando praticado contra criança ou adolescente. No PL 2.007, o deputado federal Lincoln Portela (PR-MG) fala expressamente em “pedofilia” ao propor a inclusão de vários delitos do ECA à lista dos crimes hediondos. É o mesmo desejo do deputado federal José Medeiros (Pode-MT), no PL 835.

Algumas propostas, todavia, não passariam em minha cabeça, mesmo após muita reflexão. No PL 2.784, o deputado federal Coronel Chrisóstomo (PSL-RO) quer tornar hedionda a subtração de medicamentos. A conduta é gravíssima, é claro, principalmente quando a coisa furtada é pública. Ninguém discute! Mas não consegui fazer a conexão entre o projeto e um fato específico. Também não sei o que inspirou o PL 3.049, do deputado federal Chiquinho Brazão (Avante-RJ), que busca a hediondez da falsificação de bebidas alcoólicas.

Um projeto (PL 951) interessante é o do deputado federal Célio Studart (PV-CE), que tem por objetivo tornar hedionda a conduta de “assassinato em série” de animais. Haveria um serial killer de bichinhos por aí? Na justificativa do projeto, o deputado fala de um assassino de gatos em Fortaleza. Outro caso que possivelmente serviu de inspiração ao parlamentar ocorreu em São Paulo, quando uma mulher foi condenada por matar 37 animais, entre cães e gatos.

Ademais, para a punição mais rigorosa dos criminosos condenados por crimes hediondos, os parlamentares têm algumas propostas. Uma delas é o PL 1.969, do deputado federal Hélio Lopes (PSL-RJ), que pretende criar o Cadastro Nacional de Condenados por Crimes Hediondos ou Equiparados. O político também busca a submissão obrigatória do condenado à coleta de material genético (PL 3.668).

O deputado e professor Luiz Flávio Gomes (PSB-SP) quer aumentar o tempo de cumprimento para a progressão de regime, que passaria a ser de 4/5, se aprovado seu projeto (PL 1.677). No mesmo sentido, o PL 792, do deputado federal Roberto Pessoa (PSDB-CE), que entende pela mesma fração de cumprimento de pena como condição à progressão de regime. O deputado federal Lucas Redecker (PSDB-RS), no PL 3.779, também quer tornar mais difícil a obtenção de progressão de regime aos condenados por crimes hediondos.

Em resumo, mesmo após três décadas, a Lei dos Crimes Hediondos mantém sua função de “band-aid”. Pouco importa a complexidade de circunstâncias que resultam em um determinado crime. Se virou notícia, merece estar no rol dos crimes mais graves. É assim desde o início, em 1990, e assim será, talvez, para sempre. 

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