Antecipação da pena

Suspeita de corrupção não justifica prisão, como quer Bretas, diz Nilo Batista

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3 de abril de 2019, 13h41

O juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro, entende que deveria haver prisão preventiva obrigatória em casos de suspeita de corrupção. Só que a jurisprudência dos tribunais superiores considera que a gravidade abstrata do crime não é suficiente para justificar a detenção cautelar. Assim, a prisão nesses casos configura antecipação da pena, violando a presunção de inocência.

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Nilo Batista afirmou que fatos apontados por delatores teriam ocorrido em 2014.
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Esses foram os argumentos do criminalista Nilo Batista no pedido de Habeas Corpus que impetrou em favor do ex-secretário da Casa Civil do Rio Régis Fichtner. Nesta terça-feira (2/4), a 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal aceitou o requerimento de Batista e revogou a prisão preventiva de Fichtner.

Régis Fichtner foi preso preventivamente em 2017 e solto pelo Tribunal Regional Federal da 2ª Região, que concedeu HC. Em fevereiro, Bretas ordenou nova prisão preventiva do ex-secretário do Rio. A ordem se baseou em depoimentos de delatores que, segundo o juiz, apresentaram "fatos novos". Entre esses fatos, constava que o ex-secretário recebeu propina de R$ 4,7 milhões.

Nilo Batista – professor da UFRJ e da Uerj – impetrou HC contra a nova prisão no TRF-2 e no Superior Tribunal de Justiça, mas os pedidos foram negados. Em HC ao STF, protocolado em 18 de março, o criminalista afirmou que Marcelo Bretas ordenou a prisão de Fichtner por acreditar que a medida deve ser obrigatória em casos de suspeita de corrupção.

"No âmago do decreto prisional está um equivocado e muito particular entendimento pessoal do magistrado de primeiro grau, no sentido de que deveria haver prisão preventiva obrigatória em casos de suspeita de corrupção, ao arrepio do princípio constitucional da presunção de inocência e da legislação processual penal brasileira."

Ele citou trechos da decisão do juiz federal, nos quais este diz que "casos de corrupção sistêmica ou generalizada, e delitos relacionados, não podem ser tratados como crime ordinários, pois a gravidade dos ilícitos penais não deve ser medida apenas sob o enfoque da violência imediata”. Além disso, Bretas avaliou que “o reconhecimento da gravidade do caso deve dificultar a concessão de liberdade provisória, consideradas sua lesividade extraordinária para a sociedade".

Para Batista, essa é a verdadeira razão que motivou a detenção do ex-secretário do Rio. "Todos os demais argumentos manejados pelo decreto prisional são tentativas mal disfarçadas de esconder esse fato e justificar uma inadmissível prisão preventiva obrigatória. Trata-se, como se vê, de um expediente absolutamente ilegal, pois fundamentar a prisão preventiva do paciente com base na gravidade do crime que lhe é (precariamente) imputado representa em claro pré-julgamento ou, pior ainda, antecipação de pena”, criticou o advogado, destacando que Bretas indica que a condenação do acusado “é uma questão de tempo".

No entanto, a prisão preventiva não serve como antecipação da pena, e sim como "prestação de contas à opinião pública ou à imprensa", ressaltou o professor. Ele também lembrou que os tribunais brasileiros entendem que a gravidade abstrata do crime, por si só, não é suficiente para justificar a prisão preventiva. Então, se não há outros elementos que a motivem, a detenção é ilegal, avaliou Batista.

E, de acordo com ele, a detenção de Fichtner não tem fundamento. Afinal, ela foi baseada em depoimentos de delatores – que buscam obter benefícios penais. Ainda assim, os fatos narrados por eles teriam acontecido em 2014. Logo, não são contemporâneos – requisito para a prisão preventiva, como o STF vem decidindo.

Provas frágeis
A 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal decidiu, ao mandar soltar Régis Fitchner, que provas apresentadas por delatores não podem servir de fundamento para decretar prisões preventivas

"Prender provisoriamente com base em delação é violador da lei e da Constituição. Isso é um erro crasso, um erro crasso. Isso não pode ocorrer. Tem que se ensinar aos meninos que não é isso que se faz", disse Gilmar, em seu voto, na terça-feira (2/4). Ele foi acompanhado pelos ministros Ricardo Lewandowski e Celso de Mello. Os ministros Luiz Edson Fachin e Cármen Lúcia ficaram vencidos.

Segundo Gilmar, a decisão de Bretas apenas repetiu decreto anterior, já cassado pelo Supremo. "Os únicos elementos pretensamente inovadores são declarações de colaboradores, que devem ser analisados com ressalva", disse, durante a leitura do voto.

"Da leitura dos fundamentos expostos [na decisão de Bretas], resta claro que o decreto prisional parte de indevidas presunções, ilegítimas em um processo penal que se pauta pela presunção de inocência. Ou seja, não aponta qualquer elemento consistente e concreto para justificar a restrição", criticou Gilmar.

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