Opinião

Homenagem a Waldir Troncoso Peres, o príncipe dos advogados

Autor

  • Sérgio Rosenthal

    é advogado mestre em direito penal pela Universidade de São Paulo (USP) ex-presidente do Movimento de Defesa da Advocacia (MDA) e ex-presidente da Associação dos Advogados de São Paulo (Aasp).

2 de abril de 2019, 19h49

Na serenidade da noite de um domingo de outono, há exatos dez anos, faleceu Waldir Troncoso Peres, o maior tribuno da advocacia criminal que o Brasil conheceu. Mesmo decorrida uma década, tenho certeza que a lembrança de seu talento fenomenal permanece impregnada na alma de todos aqueles que tiveram o privilégio de vê-lo atuar profissionalmente.

O “Espanhol”, como era carinhosamente tratado pelos amigos, estreou no Tribunal do Júri com apenas vinte e um anos de idade, em Casa Branca, interior de São Paulo, quando ainda cursava o terceiro ano na Faculdade de Direito do Largo de São Francisco, onde se formou em 1946.

No decorrer da carreira estima-se tenha defendido mais de mil acusados perante o tribunal popular, a maior parte gente pobre que recorria à Procuradoria de Assistência Judiciária (PAJ), na qual trabalhou entre 1969 e 1986 como Procurador do Estado.

Homem de uma agilidade mental e de uma perspicácia extraordinárias, sabia traduzir em palavras e frases certeiras aquilo que poucos advogados conseguem sequer projetar com nitidez em seus próprios pensamentos.

Os julgamentos dos quais participava atraiam estudantes, colegas e até mesmo cidadãos comuns, sem qualquer vínculo com o processo ou com o universo do direito, que compareciam aos salões do Tribunal do Júri apenas para apreciar, com indisfarçável encantamento, a arte do velho mestre.

Suas argumentações eram repletas de lições de psicologia, filosofia, literatura e até mesmo de poesias. Mas o que de fato conhecia profundamente e explorava como ninguém, era a alma humana. Era elegante com os adversários e generoso com os colegas menos experientes, sempre tratando todos com simpatia e humildade. Sem dúvida alguma, inspirou muitas carreiras, inclusive a minha.

Atuou até 2004, quando, por ironia do destino, um acidente vascular cerebral lhe cerceou a fala. É realmente uma pena os jovens criminalistas de hoje não terem a oportunidade de conhece-lo e reverencia-lo. Para estes fica, dentre tantas outras pérolas que deixou, a declaração de amor à profissão que prestou em 1989, ao receber da Ordem dos Advogados do Brasil o Prêmio da Espada e da Balança:

“Pedi aos meus filhos, como última vontade, que quando eu morrer me enterrem de beca. Porque se a vida for contingente e eu amanhã tiver apenas que me mineralizar, pelo menos estarei envolto no suor da minha beca, com a qual honradamente ganhei a vida. Mas se o transcendental existe e do outro lado alguma coisa me espera, ainda assim eu quero ser enterrado de beca, porque ela, que me ensinou a abrir a porta da cadeia, haverá de me ensinar a abrir as portas do céu.”

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