Direito Civil Atual

O baiano Eduardo Espínola e sua importância para o Direito

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24 de setembro de 2018, 9h45

ConJur
A Rede de Pesquisa em Direito Civil Contemporâneo, dando seguimento ao projeto de rememorar os clássicos civilistas brasileiros, realiza, na Faculdade de Direito da Universidade Federal da Bahia, seminário em homenagem a Eduardo Espínola. Trata-se de eminente jurista que nasceu em 6 de novembro de 1875, em Salvador, e morreu em 2 de maio de 1967, no Rio de Janeiro, tendo atuado como promotor público, magistrado[1] e docente da antiga Faculdade Livre de Direito[2], atual FDUFBA.

A destacada atuação de Eduardo Espínola no Ministério Público da Bahia, quando contava com apenas 21 anos, ainda que por um lapsus temporis, acarretou também a participação desta instituição na estruturação e organização do aludido evento. É cediço que o papel do jurista, na condição de autor da obra Sistema de Direito Civil, foi fundamental para solidificar as bases do atual microssistema consumerista[3], instituído pela Lei Federal 8.078/90, razão pela qual também o Instituto Brasileiro de Política e Direito do Consumidor (Brasilcon), o Projeto de Extensão Associação Baiana de Defesa do Consumidor (ABDECON/FDUFBA) e a Associação do Ministério Público do Consumidor (MPCON) também contribuíram para a ocorrência e a divulgação da atividade.

A formação humanística de Eduardo Espínola é notada desde o alvorecer da sua trajetória, eis que, em 1898, contando apenas com 23 anos de idade, traduzira a obra, intitulada Filosofia do Direito Privado, de autoria do italiano Pietro Cogliogo[4]. Destacou-se pela produção doutrinária no campo cível e internacional privado[5], vindo a alcançar o ápice da sua carreira como presidente do Supremo Tribunal Federal, onde permaneceu até se aposentar, em 26 de maio de 1945[6]. Não se pode também olvidar da sua incursão na seara constitucional[7], tendo participado da delegação brasileira que compareceu na Sexta Conferência Panamericana, realizada em Havana, onde apresentou relatório sobre o Código Bustamante. Representou o Brasil na Corte Internacional de Haia e defendeu o país em decorrência de aspectos concernentes à dívida externa[8]. Foi também autor do o Projeto de Código de Processo Civil e Penal do Estado da Bahia, a pedido do então chefe do Poder Executivo local[9].

Na obra História da Faculdade de Direito de Recife, local onde Espínola foi discente, Clóvis Bevilaqua verberou que era “uma das nossas mais justamente acatadas autoridades em direito civil”, caracterizando a sua produção como “vasta”, com “largueza de vistas”, “extensa erudição e seguro critério”[10]. Para Orozimbo Nonato, o nome de Eduardo Espínola deveria ser inserido “na mesma chave dos maiores juristas nacionais de todos os tempos”. Hahnemann Guimarães referiu-se a ele como, “sem dúvida, o maior civilista brasileiro”, constituindo juntamente com Bevilaqua e Lacerda de Almeida a “famosa trindade”[11].

Em 1908, publicou o primeiro volume do seu Sistema de Direito Civil, versando sobre noções essenciais acerca do direito objetivo e o direito subjetivo[12]. Filinto Bastos[13], ao prefaciar tal produção, aduziu que apresentava “uma joia de síntese, clareza e profundidade”, encontrando-se fincada “nos pandectistas germânicos e no que se escreveu na Alemanha logo após a promulgação do BGB”. Descrevia o trabalho de Espínola como algo primoroso que mesclava, ao mesmo tempo, erudição e objetividade, ao discorrer assuntos complexos que integravam a parte geral da estrutura normativa cível. Após se deter, de modo profundo e crítico, sobre a concepção alemã atinente às obrigações, em 1912, Eduardo Espínola lançou o segundo volume do Sistema de Direito Civil[14], proferindo observações profícuas sobre os institutos denominados de Haftung e Schuld. Utilizou-se o mestre baiano do pensamento de juristas alemães, destacando-se Von Thur[15], Windscheid[16], Dernburg[17], Kuhlembeck e Warneyer[18], entre outros.

Entre os anos de 1913 a 1915, editou a revista intitulada Jurisprudência, no bojo da qual versava sobre temas instigantes que eram discutidos no período vivenciado pelo Brasil. Ainda em 1913, Eduardo Espínola elaborou a obra Questões Jurídicas e Pareceres e apresentou estudos fundamentados sobre assuntos polêmicos do campo do Direito[19]. Até a década de 1920, o jurista continuou produzindo intensamente na esfera cível, dando continuidade nos anos seguintes[20], contribuindo também com a comissão para a reforma do Código Civil de 1916, instituída na década de 1930[21]. Com Eduardo Espínola Filho, no período de 1939 a 1958, presenteia a sociedade brasileira com Tratado de Direito Civil[22], bem como outras obras de inquebrantável relevância[23]. A contribuição de Eduardo Espínola para o Direito Civil Pátrio é imensurável e deve ser relembrada pelas gerações de operadores da seara jurídica.

*Esta coluna é produzida pelos membros e convidados da Rede de Pesquisa de Direito Civil Contemporâneo (USP, Humboldt-Berlim, Coimbra, Lisboa, Porto, Roma II-Tor Vergata, Girona, UFMG, UFPR, UFRGS, UFSC, UFPE, UFF, UFC, UFMT, UFBA e UFRJ).


[1] ALVES, Marieta. Intelectuais e escritores baianos. Salvador: Fundação Museu da Cidade, 1977.
[2] Em 1902, tornou-se lente daquela faculdade por meio de brilhante desempenho em concurso público. SOUZA, Antônio Loureiro de. Baianos ilustres. 3. ed. São Paulo: IBRASA; Brasília: INl, 1979.
[3] Cf.: IRTI, Natalino. L' età della decodificazione. 4. ed. Milano: Giuffrè, 1999.
[4] ESPÍNOLA, Eduardo. Tradução da obra Filosofia do Direito Privado, de Pietro Cogliolo. Baía, 1898.
[5] ESPÍNOLA, Eduardo. Elementos de Direito Internacional Privado. Rio de Janeiro: Ed. Conquista, 1925. ESPÍNOLA, Eduardo; ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Modificações do direito interno brasileiro decorrentes da adoção do Código Bustamante. Da Condição Jurídica dos Estrangeiros no Bra­sil ______. A codificação do direito internacional: apreciação sob os trabalhos da segunda reunião da Comissão de Jurisconsultos Americanos. Rio de Janeiro: Ed. Conquista, 1927. ______. A Personalidade Humana em Direito Internacional Privado. Rio de Janeiro: Freitas Bastos 1943._____.; ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Da Condição Jurídica dos Estrangeiros no Brasil. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1941.
[6] RODRIGUES, Lêda Boechat. História do Supremo Tribunal Federal (1930- 1963). Vol. 04. Tomo I. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2002. p. 281-282.
[7] ESPÍNOLA, Eduardo; ESPÍNOLA, Oswaldo de Azevedo. A Nova Constituição do Brasil — Direito Político e Constitucional Brasileiro. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1946. dois volumes. ______. O Poder Judiciário na Constituição de 1937. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1941.
[8] ESPÍNOLA, Eduardo. Affaire des emprunts brésiliens contractés en France. Dissertação apresentada em nome do governo brasileiro, 1928.
[9] ESPÍNOLA, Eduardo. Projecto de Codigo de Processo Civil, CommerciaI. Orphanologico e Criminal do Estado da Bahia. Berlim: Hermann Blankes Buchdruckerei, de Berlim, 1914.
[10] BEVILAQUA, Clóvis. História da Faculdade de Direito de Recife. Brasília: INL, Conselho Federal de Cultura, 1927.
[11] RODRIGUES, Lêda Boechat., op. cit., p. 282.
[12] ESPÍNOLA, Eduardo. Sistema do Direito Civil Brasileiro. Rio de Janeiro: Ed. Conquista, 1908, 1º v.
[13] VAMPRÉ, Spencer. Memórias para a Academia de São Paulo. 2. ed. Brasília: INL, Conselho Federal de Cultura, 1977. 2 vols.
[14] ESPÍNOLA, Eduardo. Sistema do Direito Civil Brasileiro. 2º v. Rio de Janeiro: Ed. Conquista, 1912.
[15] Cf.: VON THUR, Andreas. Teoria General del Derecho Civil Alemán. Buenos Aires: Depalma, 1946, 06 volumes.
[16] Cf.: WINDSCHEID, Bernhard; MUTHER, Theodor. Polemica sobre la Actio. Buenos Aires: Ejea, 1974.
[17] Examinar: DERNBURG, Heinrich. Pandekten Obligationrecht. Hansebooks, 1894.
[18] WARNEYER, Otto. Kommentar zum Bürgerlichen Gesetzbuch für das Deutsche Reich, 2 Bände. Mohr Siebeck Verlag, Leipzig 1923.
[19] ESPÍNOLA, Eduardo. Questões Jurídicas e Pareceres. Rio de Janeiro: Ed. Conquista, 1925, 2 volumes.
[20] Nos anos de 1918, 1922, 1928 e 1929, foram editados volumes da obra Breves Anotações ao Código Civil Brasileiro pela Editora Conquista.
[21] Entre 1926 e 1931, publicou 10 volumes das Pandectas brasileiras, que registravam a doutrina, a jurisprudência e a legislação pátrias. Examinar também: ESPÍNOLA, Eduardo. Manual do Código Civil Brasileiro. Rio de Janeiro: Ed. Conquista, 1938.
[22] ESPÍNOLA, Eduardo.; ESPÍNOLA FILHO, Eduardo. Tratado de Direito Civil Brasileiro, 10 volumes. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1939-1941.
[23] Em 1951, foram editadas: A Família no Direito Civil Brasileiro, Fatos jurídicos e Garantia e Extinção das Obrigações. Em 1953, observa-se: Dos Contratos Nominados no Direito Civil Brasileiro e, em 1956, Posse, Propriedade, Compropriedade ou Condomínio, Direitos Autorais, bem como Os Direitos Reais Limitados ou Direitos sobre a Coisa Alheia e os Direitos Reais de Garantia no Direito Civil Brasileiro.

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