Justiça criminal

Em nome da igualdade perante a lei, Califórnia extingue sistema de fiança

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1 de setembro de 2018, 9h01

A Califórnia se tornou, nesta semana, o primeiro estado dos EUA a aprovar uma lei que elimina da justiça criminal o sistema de fiança. Em seu lugar, será implementado um “sistema de avaliação de risco”, operado por um conselho chamado Pretrial Assessment Services, que recomendará ao juiz a prisão provisória ou a libertação do réu até a decisão do julgamento.

A nova lei entrará em vigor em 1º de outubro de 2019 e, até lá, cada condado poderá criar regras para organizar o funcionamento de seu sistema. No geral, o novo sistema da Califórnia lembra o de audiências de custódia do Brasil, embora não haja referência ao fator “prisão em flagrante”.

Em princípio, todas as pessoas presas por pequenos delitos — ou crimes não violentos — que satisfaçam determinadas condições (não vai fugir, oferecer risco à sociedade, obstruir a Justiça ou coagir testemunhas) irão responder o processo em liberdade. Terão de assinar um termo de compromisso de comparecer a todas as audiências marcadas.

Presos acusados de crimes sérios ou violentos irão para a prisão provisória para aguardar julgamento. Mas o juiz ouvirá o advogado do preso (ou defensor público), como também o promotor, segundo a NPR (National Public Radio) e o jornal The Guardian.

A maioria dos suspeitos de pequenos delitos ou de crimes não violentos deve ser libertada em 12 horas. Em alguns casos, o sistema pode ter 24 horas para determinar o destino do preso, com possibilidade de prorrogação do prazo por mais 12 horas, se necessário.

Haverá casos também em que a Justiça, além de garantir o compromisso do réu de comparecer em juízo nas datas marcadas, poderá tomar mais precauções, como apreensão de passaporte, uso de tornozeleira, monitoramento por GPS ou obrigação de se apresentar a uma autoridade regularmente, conforme estabelecido pelo juiz.

O principal objetivo da extinção do sistema de fiança é garantir igualdade perante a lei, no que se refere à decisão de manter uma pessoa em prisão provisória ou mandá-la para casa, para responder ao processo em liberdade.

Para os defensores da nova lei, entre os quais se incluem o conselho judicial do estado, liderado pelo presidente do tribunal superior, a nova lei acaba com a prática injusta de mandar pessoas para a cadeia simplesmente porque não podem pagar a fiança, enquanto os que têm dinheiro ficam livres. Agora, a questão da liberdade ou prisão provisória irá se basear nos riscos que o preso oferece, apenas.

Ao promulgar a lei, o governador da Califórnia, Jerry Brown, disse que, para ele, essa é uma luta antiga: esperou quase 40 anos para assiná-la. Ele foi governador do estado, pela primeira vez, de 1975 a 1983. Em 1979, tentou extinguir o sistema de fiança, que, para ele, favorecia apenas os ricos e penalizava os pobres. “Agora, ricos e pobres serão tratados com igualdade”, afirmou em uma declaração.

Efeito colateral
A partir de 1º de outubro de 2019, porém, cerca de 7 mil pessoas ficarão desempregadas na Califórnia. A nova lei vai acabar, no estado, com a “indústria da fiança”, formada por empresas que pagam as fianças aplicadas aos réus e cobram deles uma taxa, quando o dinheiro é devolvido.

Essa é uma prática generalizada nos EUA. Mas, na Califórnia, todas essas empresas vão fechar as portas, porque sua fonte de renda vai secar. Entre os desempregados estarão centenas de “caçadores de fugitivos” — presos libertados que não comparecem a audiências no fórum criminal.

O presidente da Associação dos Agentes de Fiança do estado, Topo Padilla, disse à NPR que vai mover uma ação para impedir que a lei entre em vigor, porque ela é ruim para o povo da Califórnia. Isso porque, segundo ele, os custos dos procedimentos serão arcados pelos contribuintes, em vez de pelos réus.

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