Eleições 2018

Jair Bolsonaro é eleito presidente do Brasil

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28 de outubro de 2018, 19h00

Jair Bolsonaro (PSL), 63 anos, foi eleito presidente do Brasil. O militar da reserva recebeu 55,54% dos votos válidos (excluídos brancos e nulos). Seu concorrente, Fernando Haddad (PT), foi escolhido por 44,46% dos eleitores, com 94,44% das urnas apuradas. 

Tânia Rêgo/Agência Brasil
Militar Jair Bolsonaro será o 38º presidente da história do Brasil.
Tânia Rêgo/Agência Brasil

Bolsonaro será o 38º presidente do país, o oitavo após o fim da ditadura militar (1964-1985). Ele também será o primeiro presidente do PSL, partido para o qual se transferiu no início do ano. Capitão da reserva do Exército, ele será o 12º presidente militar do Brasil, contando os integrantes da junta provisória que 1969, que assumiu após o marechal Costa e Silva adoecer. O vice dele é o general Hamilton Mourão (PRTB). 

Colocando-se como o catalisador do sentimento antipetista entre os brasileiros, ele agregou os votos da direita e dos desgostosos com o partido mais vitorioso da esquerda. Com um perfil explosivo e propostas vagas, é difícil prever como serão os quatro anos de seu governo.

Deputado federal há 27 anos, fez carreira política no Legislativo, tendo sido vereador no Rio de Janeiro em 1989. Desde que o ex-presidente Lula (PT) deixou de figurar nas pesquisas de intenções de voto, ele despontou como o favorito do pleito. 

Bolsonaro circulou pelos corredores da Câmara dos Deputados durantes anos sem exercer papel de destaque. Depois de quase 30 anos na Câmara, o representante da extrema direita deixou de ser um personagem folclórico para virar um fenômeno a ser levado a sério.

Passou a ganhar evidência quando do surgimento da notícia falsa do "kit gay", a mesma que foi retomada neste ano em sua campanha à Presidência da República. Em 2015, na votação do impeachment da presidente Dilma Rousseff, homenageou o coronel Brilhante Ustra, primeiro militar reconhecido pela Justiça brasileira como torturador.

Campanha eleitoral
Durante a campanha, valeu-se de um discurso de endurecimento penal. O inexistente "kit gay" foi uma arma usada por muito tempo, até que o ministro Carlos Horbach, do Tribunal Superior Eleitoral, determinou a remoção do material que faz referência a ele. Jair Bolsonaro mostrava o livro Aparelho Sexual e Cia e afirmava que seria distribuído em escolas pelo governo do PT, no programa “Escola sem Homofobia”, desenvolvido pelo Ministério da Educação à época em que o presidenciável Fernando Haddad estava à frente da pasta. Só que o livro jamais foi incluído em um programa do governo federal.

Se, antes da campanha começar, viajou todo o país e era recebido em aeroportos e atos, reduziu o ritmo com o início oficial da campanha. Em 7 de setembro ele foi esfaqueado durante um ato em Juiz de Fora, em Minas Gerais. A partir de então, afirmou não ter autorização médica para participar de debates. Mais tarde, admitiu que não iria por estratégia.

Filho do presidente eleito, o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL) chegou a falar em fechar o Supremo e prender ministros. O deputado comentava a hipótese de o STF impugnar a candidatura de seu pai — algo impossível, já que o tribunal não examina esse tipo de matéria — incumbência exclusiva do Tribunal Superior Eleitoral. A declaração foi logo rechaçada por ministros e outras autoridades.

O vice, general Mourão, e seu guru econômico, Paulo Guedes, também já deram declarações controversas. Paulo Guedes falou em igualar o imposto de renda em 20% para todas as faixas, por exemplo, o que foi revisto pelo candidato com a repercussão ruim.

Mourão disse que 13° salário e férias são jabuticabas brasileiras. Quer o fim dos direitos. Disse também que filhos criados por mães e avós “tendem a ingressar no narcotráfico”, e que o neto é o “branqueamento da raça”.

Linha dura
Além de não participar de debates, Bolsonaro também não deu muitas pistas sobre o que pretende fazer com os cargos jurídicos que terá sob sua responsabilidade caso seja eleito. O que tem deixado claro, até em entrevistas, é que gosta da "linha dura" do Judiciário e não dará atenção a quem considere ligado ao "viés ideológico de esquerda".

Miguel Ângelo/CNI
Partido de Bolsonaro, PSL terá a segunda maior bancada da Câmara dos Deputados.
Miguel Ângelo/CNI

Ele terá duas indicações ao Supremo Tribunal Federal, duas ao Superior Tribunal de Justiça e duas ao Tribunal Superior do Trabalho, além de dez desembargadores dos tribunais regionais federais, sem contar as cortes trabalhistas. Do governo, terá de nomear no mínimo o ministro da Justiça, o advogado-Geral da União e o diretor-geral da Polícia Federal, além de indicar um procurador-geral da República.

O juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, o ministro Ives Gandra Martins Filho, ex-presidente do TST, o desembargador João Pedro Gebran Neto, da 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, e Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal Criminal do Rio de Janeiro são exemplos de nomes que estariam no radar do novo presidente.

O nome mais cotado para ser ministro da Justiça de um eventual governo Bolsonaro é o de Gustavo Bebianno. Advogado, ele foi integrante do escritório Sergio Bermudes Advogados e diretor jurídico do Jornal do Brasil por indicação do próprio Bermudes, que o considera "uma pessoa correta", mas "não é nenhum iluminado do Direito". O criminalista Antônio Sérgio de Moraes Pitombo é outro possível ministro da Justiça de Bolsonaro, assim como o desembargador Ivan Sartori, ex-presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo.

Para diminuir uma suposta parcialidade do Supremo Tribunal Federal e teoricamente assegurar maioria em votações de interesse do governo, Bolsonaro propõe elevar o número de ministros de 11 para 21 e nomear 10 do "perfil" de Sergio Moro. Além disso, o capitão da reserva do Exército quer acabar com a progressão de regime, instituir a prisão perpétua e isentar policiais e integrantes das Forças Armadas de responderem por homicídios que cometerem em serviço.

Discursos agressivos
Aos olhos de parte de seus seguidores, o militar é o salvador da pátria, o mito, o único homem capaz de pôr ordem no país. Seus críticos, porém, o veem como um perigo para o Brasil e sua incipiente democracia. Bolsonaro tem como marcas as posições extremadas, a postura de enfrentamento constante e os discursos agressivos, em que reivindica ser o defensor e restaurador de uma suposta ordem perdida.

O discurso dele é recheado de ataques a minorias políticas e sociais e à esquerda. Domingo passado (21/10), ele afirmou, em um telão com transmissão ao vivo na Avenida Paulista, em São Paulo, que seus opositores não teriam vida tranquila. “Essa turma, se quiser ficar aqui, vai ter que se colocar sob a lei de todos nós. Ou vão para fora ou vão para a cadeia”, disse.

Ao longo dos anos, soma declarações questionáveis. Já disse, em 2011, ser preconceituoso com orgulho.Em 2013, afirmou que decidiu ser deputado federal “para não andar de ônibus, fusca, van, e morar bem". Em entrevista sobre homossexualidade à revista Playboy, em dezembro de 2011, afirmou que “seria incapaz de amar um filho homossexual. Prefiro que um filho meu morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí”. Um “couro” seria o tratamento que daria a um filho homossexual. Na rua, também disse que, se visse um casal de homens se beijando, bateria neles

Sobre os filhos se envolverem com mulheres negras, disse que não há possibilidade. “Eu não corro esse risco, meus filhos foram muito bem educados.” Ele também respondeu a uma ação penal, mas foi absolvido na 1ª Turma do STF, depois de dizer, em palestra no Clube da Hebraica, no Rio, em abril de 2017: “Fui num quilombo. O afrodescendente mais leve lá pesava sete arrobas. Nem pra procriador ele serve mais.” Em 2016, disse que “O erro da ditadura foi torturar e não matar.” 

Mais fala que ação
A produção legislativa de Bolsonaro é medíocre. Ele apresentou 171 projetos de lei, mas apenas dois foram aprovados. Nunca ocupou cargo de destaque na Câmara. Sempre integrou o chamado baixo clero, grupo de congressistas com pouca projeção, e é mais conhecido pelas confusões em que se mete do que por sua atuação parlamentar. Um dos seus trunfos é que jamais foi envolvido em qualquer caso de corrupção.

Mas foi alvo de várias acusações criminais. No portal do Supremo, aparece como réu em duas ações penais, nas quais é acusado de injúria e apologia do estupro por ter afirmado, na Câmara, que não estupraria a deputada Maria do Rosário (PT-RS) porque ela “não merece”. Em 2015, foi condenado pela Justiça a indenizar a parlamentar em R$ 10 mil pela mesma razão e também a indenizar em R$ 150 mil o Fundo de Defesa dos Direitos Difusos do Ministério da Justiça, por fazer declarações homofóbicas num programa de TV. A decisão foi confirmada este ano pelo Superior Tribunal de Justiça. É ainda investigado pelo Ministério Público por apologia da tortura, por ter homenageado o coronel Brilhante Ustra.

Embora atue como parlamentar há quase 30 anos, Bolsonaro é um grande desconhecido para diversos setores da economia e da sociedade. O deputado – que chegou a declarar que, se fosse eleito presidente, entregaria metade do ministério aos militares – é uma incógnita. 

Em quase três décadas como deputado, nunca relatou proposições de destaque nem presidiu comissões ou liderou bancada. Na área da segurança pública, sua principal bandeira, não emplacou qualquer sugestão. O deputado já passou por quatro partidos e, atualmente, integra o PSL, que conseguiu inchar de tamanho no Congresso Nacional nessas eleições, passando de oito parlamentares para a segunda maior bancada, com 52 deputados.

Bolsonaro nunca figurou entre “os cabeças do Congresso Nacional”, selecionados anualmente pelo Diap há mais de duas décadas por sua elevada influência. Entre os atributos que caracterizam um protagonista, a entidade lista “a capacidade de conduzir debates, negociações, votações, articulações e formulações”.

O deputado é recordista em representações no Conselho de Ética. Com quatro processos, ele é o único que alcançou esse número desde que o conselho foi instalado, em 2001. O filho Eduardo Bolsonaro, em seu primeiro mandato, foi alvo de outros dois. A lista de acusações contra o o militar Presidência também é extensa na Corregedoria da Câmara, outra instância que apura a conduta dos parlamentares.

O deputado fluminense já foi denunciado, entre outras coisas, por chamar Lula de “homossexual” e Dilma Rousseff de “especialista em assalto e furto”. Já recebeu seis punições por causa de pronunciamentos agressivos e entrevistas polêmicas. Foram três censuras verbais e duas por escrito. Em todos os casos, escapou da abertura de processo de cassação do mandato.

Em 2000, chegou a dizer que o então presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB) deveria ter sido fuzilado durante a ditadura. Bolsonaro é conhecido por moldar discurso e ações ao gosto da plateia que o aplaude. 

Reportagem do jornal Folha de S.Paulo afirmou que empresas estão contratando, por R$ 12 milhões cada contrato, agências para fazer disparos de mensagens pelo WhatsApp contra o PT. A prática é proibida pela legislação eleitoral, pois configura doação feita por pessoa jurídica. O TSE vai investigar o esquema. 

A bomba que fez o político
Dono atualmente de um discurso de ordem e disciplina militar e de críticas ferrenhas a movimentos sociais, o então capitão Jair Bolsonaro apareceu pela primeira vez no noticiário em 1987, nas páginas da revista Veja, após ser acusado de elaborar um plano para explodir bombas em quartéis como forma de protesto por baixos salários.

Acusado por cinco irregularidades, o capitão Bolsonaro teve de responder a um Conselho de Justificação, formado por três coronéis. Ele foi condenado sob a acusação de ter mentido durante o processo.

A avaliação do conselho era de que ele tinha “excessiva ambição em realizar-se financeira e economicamente, revelando com isso conduta contrária à ética militar”. A decisão foi enviada ao Superior Tribunal Militar que, por oito votos a quatro, absolveu o réu. Como duas perícias confirmaram a autoria dos croquis e duas resultaram inconclusivas, acabou beneficiado pela dúvida.

Em 1988, passou para a reserva ao conquistar uma cadeira de vereador no Rio. Dois anos depois desembarcava na Câmara dos Deputados como um sindicalista de caserna. Todos os seus primeiros discursos eram voltados aos militares.

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