Predisposição à violência

Justiça estadual dos EUA vai decidir se teoria do gene guerreiro é aceitável

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29 de novembro de 2018, 9h10

O Tribunal Superior do estado do Novo México, nos EUA, aceitou julgar um caso criminal em que a teoria do “gene guerreiro” foi usada pela defesa, sem sucesso, em primeiro grau: o réu foi condenado. Um tribunal de recursos reconheceu a tese da defesa, mas manteve a pena.

Agora, o tribunal superior vai decidir se testemunhos de especialistas em “genética comportamental”, que inclui a teoria do gene guerreiro, bem como provas genéticas decorrentes dessa ciência devem ser aceitos em julgamentos criminais, segundo o jornal Santa Fe – New Mexican.

A teoria é a de que o chamado gene guerreiro (warrior gene) predispõe as pessoas à violência — e a outros distúrbios neuropsiquiátricos, como fobias, depressão, déficit de atenção e abuso de drogas, segundo a Wikipédia. E levam adolescentes a se tornarem membros de gangues.

A explicação é que o gene guerreiro contém variações particulares no gene do cromossomo X, que produz a monoamina oxidase A (maoa), uma enzima que afeta os neurotransmissores (mensageiros do cérebro), como a dopamina, a norepinefrina e a serotonina. As pessoas com baixos níveis de maoa são, segundo a teoria, impulsivamente agressivas. E a situação se agrava quando uma pessoa foi violentada quando criança.

Os níveis variam de 1 a 5, sendo 5 o nível normal. No caso em tramitação na Justiça de Novo México, o nível de maoa do réu, Anthony Blas Yepez, é 1, o mais baixo possível. Além disso, ele foi violentado quando criança. E essas circunstâncias explicariam por que Yepez matou o pai adotivo de sua namorada, George Ortiz, em uma noite, em 2012, em que os dois estavam bebendo algumas cervejas.

Ortiz teria agredido a namorada de Yepez e os dois começaram uma briga. Ortiz caiu, bateu com a cabeça no chão e morreu. Yepez e a namorada tocaram fogo no corpo. Mais tarde, ele alegou que, a partir de certo ponto, perdeu todo o autocontrole e mal se lembrava do que aconteceu.

A tese da defesa foi a de que o gene guerreiro, nessas circunstâncias, elimina a alegação de que o crime foi premeditado e o dolo. A defesa tentou levar um especialista ao julgamento, para explicar ao júri a teoria, mas a juíza não permitiu.

A juíza Mary Marlowe Sommer considerou inapropriado ouvir um testemunho sobre o gene guerreiro, porque essa era uma teoria ainda em desenvolvimento. “Me sinto incerta se esse testemunho é confiável o suficiente para provar o que se propõe a provar”, disse. No final, o júri condenou o réu, e ela o sentenciou a 22 anos de prisão.

O Tribunal de Recursos decidiu que a juíza errou ao não aceitar o testemunho, que cumpria os padrões de admissão. Mas também decidiu que o erro da juíza não teve consequências danosas para o réu, porque ele não foi condenado por homicídio de primeiro grau. Foi condenado por homicídio de segundo grau, que não requer que a Promotoria prove premeditação. Determinou, finalmente, que nenhuma outra ação seria necessária.

O réu foi representado no julgamento pelo defensor público de Santa Fé Ian Loyd, que introduziu o conceito do gene guerreiro na defesa. Em grau de recurso, a defesa foi assumida pela advogada L. Helen Bennett, sob contrato com a Defensoria Pública.

Ela contestou a decisão da juíza de não aceitar o testemunho, porque avaliar a credibilidade de um especialista no banco das testemunhas é função dos jurados, não do juiz. E citou jurisprudência segundo a qual testemunhos e provas, mesmo que questionáveis, não podem ser rejeitados se cumprem o padrão de admissibilidade.

A advogada também contestou a decisão do tribunal de recursos de manter a condenação, porque foi homicídio de segundo grau, em vez de primeiro grau. Para ela, os jurados, depois de ouvirem o testemunho de um perito sobre fatores genéticos e ambientais, poderiam ter condenado o réu por um delito menor ou considerá-lo não culpado.

Essa foi a segunda vez que a teoria do gene guerreiro foi usada como tese da defesa nos Estados Unidos. Ela foi usada mais sete vezes como circunstância para amenizar a pena. E mais duas vezes na Itália, segundo o relatório, de 2017, do Jornal Internacional de Psiquiatria Jurídica (International Journal of Law Psychiatry).

A teoria do gene guerreiro, associado a comportamento antissocial, foi desenvolvida, em 1993, por um cientista holandês que o identificou em uma grande família de muitos homens, todos violentos, na Nova Zelândia. O cientista descobriu que lhes faltava um gene específico que regulava a raiva e que os tornava tão guerreiros. O apelido de “gene guerreiro” foi uma criação da imprensa, que deu muito espaço para a história na época.

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